Até o final de 2022, a Peugeot teria a Landtrek no Brasil. Nascida na China, foi revelada globalmente em 2020 e logo teve seu passaporte carimbado para a nossa região, montada no Uruguai. Chegou a Stellantis e achou melhor que a picape média fosse Fiat, aproveitando a fama e rede da casa italiana para modelos comerciais.
Essa adoção criou a Fiat Titano, a picape média que a marca tanto queria para colocar acima de Strada e Toro e emplacar o cliente que chegava na concessionária atrás de algo mais robusto e maior que a dupla monobloco, mas tinha que ir para a loja da concorrência ou, em alguns casos, procurar algo na área de semi-novos. Será que continuarão a fazer isso?
Da Changan F70 nasceu de Peugeot Landtrek a Ram 1200. A Stellantis arrumou muitas formas de aproveitar o que pegou pronto, ainda da era PSA, para preencher lacunas de mercado em diversos países. Feita no Uruguai para o Brasil, é Fiat Titano, que tem até o escrito Stellantis nos vidros para não desenvolver marcações específicas para cada marca e distribuir esses componentes, assim como outros, em todas as fábricas que fazem essa picape média.
Antes de realmente ser vendida, a Titano foi testada em diversas situações - algumas ainda como Landtrek. Como o uso de uma picape no Brasil vai desde nunca sair do asfalto até não sair da terra, a engenharia de Betim (MG) teve que se preocupar bastante com durabilidade e facilidade de manutenção seja lá onde a Titano estiver.
Primeiro, o motor precisava ser mais robusto do que potente. Conhecido dos furgões comerciais, o BlueHDI 2.2 turbodiesel é de origem PSA e bastante utilizado na Europa, sem muitas complexidades que poderiam dificultar a manutenção. São 180 cv e 40,8 kgfm, bem abaixo do que oferecem praticamente todas as picapes médias - a Ranger 2.0 tem 170 cv e 41,3 kgfm, única abaixo da Titano em números, que também trouxe motor da linha comercial, usado na Transit.
A escolha da transmissão também foi bem conservadora, com câmbio automático de 6 marchas, tração 4x4 e caixa de redução com relação de 1:2,72 e bloqueio mecânico do diferencial traseiro. O seletor de tração é eletrônico, com botão giratório no painel variando de 4x2, 4x4 e reduzida, sem muito o que dar problema no futuro, ao menos aparentemente.
Na época do lançamento, ouvi de algumas pessoas envolvidas no projeto que a Landtrek tinha um problema de resistência de componentes da suspensão. Ou seja, a engenharia teve que trabalhar todo o conjunto, além da calibração de molas e amortecedores, para não dar problema mesmo quando colocada em situações mais extremas, algo que a Fiat sabe projetar para seus carros, sem dúvidas.
O que nasceu como Peugeot não largou as origens. A grade, tampa traseira e volante receberam o logo da marca italiana, mas as linhas não negam que a equipe de design não teve muito tempo para transformar a picape por completo. As luzes diurnas em LEDs remetem ao Dente-de-Sabre dos franceses, assim como os botões no centro do painel inspirados no Peugeot 3008.
Não adianta procurar qualquer coisa da Strada ou Toro na Titano. O sistema multimídia com tela de 10" é bem genérica, com jeito daquelas chinesas que compramos como acessório, que não tem espelhamento sem fios, só com o cabo, para Android Auto e Apple CarPlay - e pensar que a Stellentis tem uma boa central disponível. Nem mesmo o painel de instrumentos remete a qualquer coisa da Stellantis, mas como algo de carro chinês antigo.
Curiosamente, a Changan que deu origem a Landtrek/Titano/1200 já mudou na China e ficou bem (bem mesmo...) mais moderna e alinhada ao que o mundo tem hoje em dia, não em 2019. A Titano Ranch carrega rodas de 18" e bastante cromado e, de fato, chama a atenção nas ruas, principalmente vestida nesse Vermelho Tramonto e com os faróis e lanternas em LEDs exclusivas desta versão topo.
O acabamento é composto basicamente por plásticos, mas ao menos não tem rebarbas ou peças desalinhadas. A identidade Peugeot é forte, não temos exageros de cores e texturas, com o uso de cinza e alguns cromados em pontos específicos. De fato, parece uma picape mais antiga, ainda mais comparada ao que temos hoje depois de atualização de uma boa parte do segmento. Em 2019, era interessante.
A Fiat Titano demorou para chegar em nossas mãos desde que foi apresentada em março. Lá, a picape média não deixou uma boa impressão e, confesso, não acreditava em algo muito diferente agora. A principal crítica, naquele momento, foi a suspensão que não tinha comprometimento nenhum com conforto no asfalto e na terra. Só que algumas coisas mudaram de lá pra cá.
O 2.2 turbodiesel é aspero na fase fria, logo que a Titano é ligada. Com um pouco mais de temperatura, é mais suave, só que o isolamento acústico da picape ainda deixa o motor muito presente, principalmente quando se pede maior rotação e aceleração. Não esconde a origem mais antiga quando comparado aos motores mais novos das picapes médias.
O câmbio automático é um árduo trabalhador. Faz as trocas de forma suave, mas não esconde a vontade de esticar cada uma delas para aproveitar o que o 2.2 turbodiesel oferece, mesmo no modo Eco, e faz reduções com certa frequencia, algumas vezes desnecessárias, tudo para fazer a Titano desenvolver bem com seus 180 cv e 40,8 kgfm de torque. Para sair do zero, ela até se desespera um pouco e dá para perceber uma relação mais curta.
O esforço é para quem está ao volante achar que tem mais que esses números. No 0 a 100 km/h, já no modo Sport, marcou 11,9 segundos, número inferior até ao registrado pela Ranger 2.0TD (11,5 segundos), que mostra como o motor mais antigo pode ter mais potência, mas a forma com que coloca isso no chão é também ponto importante. Na hora da retomada, está em uma faixa condizente com sua potência (8,5 s no 40 a 100 km/h e 8,9 s no 80 a 120 km/h), só que esse número piora bem quando carregada.
O consumo urbano ficou em 9 km/litro, um número não tão exemplar. Na estrada, os 10,7 km/litro também ficam acima do que temos em picapes até mais potentes, muito pela relação e funcionamento do câmbio de 6 marchas e em como você precisa acelerar para a Titano manter uma velocidade constante - a aerodinâmica não é seu ponto alto e, ao mesmo tempo, o barulho de vento é bem alto.
Mas a grande questão da Titano não está no motor, por incrível que pareça. Por ser da mesma casa da Strada e Toro, era esperado um ajuste de suspensão que equilibrasse conforto, dirigibilidade e robustez, algo que a dupla é reconhecida, mas a Titano não é bem assim e, na verdade, vai demais para o lado comercial e menos para quem a procura para usar como carro de lazer.
Se você está procurando uma picape média para o lazer, talvez seja melhor ir na área de semi-novos da concessionária. Na caçamba, capacidade de 1.020 kg ou 1.220 litros considerando a altura do compartimento. A tampa é pesada, como as picapes antigas, com um amortecedor vendido como acessório, se você quiser, e não trava pelo sistema elétrico da picape.
No evento de lançamento, chamou a atenção como a Titano pulava tanto no asfalto quanto na terra. Era desconfortável e, nas duas situações, chegava a prejudicar a estabilidade. Nem só comparando com as picapes de projeto mais novo, mas até a gerações anteriores, era um ponto muito ruim. Só que algo mudou desde lá.
A Stellantis não abre, mas a engenharia pode desde ter melhorado desde a calibragem de pneus (que numa picape é ainda mais sensível) até feito algo em molas e amortecedores. A direção hidráulica ainda é pesada para manobras - e há câmeras 360 para ajudar -, mas o comportamento da suspensão é mais suave, apesar de ainda ser bem característico das picapes com eixo rígido e feixe de molas na traseira. A engenharia focou na picape ainda estável mesmo carregada e prejudicou o comportamento sem carga, mas nesse jogo é difícil achar um ponto que não perca um dos lados.
Não tem o conforto de Ranger e S10, por exemplo. A direção passa bastante ao motorista o que vem do chão e, na chuva, tem uma tendência de sair de traseira um pouco exagerada antes do controle de estabilidade intervir. Por outro lado, a Titano nem parece a mesma quando no chão de terra batida. Mesmo com mais buracos, é melhor que no asfalto. É equilibrada e não bate seco ou balança demais mesmo se você a provocar. Não sei o que fizeram, mas a Titano melhorou daquele primeiro contato, de fato.
A Fiat Titano é mais rústica, mais simples, menos potente e parece até mais antiga que suas concorrentes. Só que a versão Ranch custa, na tabela, R$ 259.990, além do que a Fiat faz de descontos e promoções. Considerando tabelas, só Ford Ranger XLS, Nissan Frontier SE e Mitsubishi L200 Triton Sport Outdoor se aproximam desse valor com transmissão automática, mas são versões de entrada com esse tipo de câmbio e tração 4x4.
A Titano Ranch também não tem muito o que oferecer. De luxo, faróis em LEDs, chave presencial com partida por botão, alerta de saída de faixas, ar-condicionado de duas zonas, câmeras 360, 6 airbags e o sistema multimídia com tela de 10". Para quem quiser gastar menos, a Volcano por R$ 239.990 e já tem um pacote bem próximo da Ranch.
Não é a melhor picape do mercado, longe disso, e muito é pela idade do projeto original. Tem um foco em preço e trabalho, algo que vai espantar o comprador atual de Toro e Strada que busca uma evolução por lazer - que vai acabar indo para a Rampage -, mas é mais barata que as médias novas para quem só quer ter uma picape chassi-carroceria com caçamba grande, 1 tonelada de capacidade e alguns equipamentos, como câmbio automático. Será que ser filha adotiva fez bem para a Titano?
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
Fiat Titano 2.2TD AT6
1.220
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