Já andei em carros muito bonitos, mas que eram difíceis de usar justamente pelas linhas ousadas. Da mesma forma, já testei outros carros com visual que não agradou a todos, mas eram uma delícia de dirigir. Encontrar um equilíbrio entre os dois ou, mais difícil ainda, ser muito bom em ambos os campos, ainda é uma tarefa árdua para as montadoras.
Quando a Volvo apresentou o C40, parecia estar apenas se aproveitando da onda dos SUVs cupês. Mas os suecos não brincam em serviço e, ao dar uma nova cara para a plataforma compartilhada com o XC40 elétrico, acabaram também acertando o quase mítico equilíbrio entre forma e função.
Apesar de ter a mesma plataforma CMA do XC40, o Volvo C40 foi o primeiro carro da marca pensado primariamente para ser um veículo 100% elétrico. O XC40 teve versões a combustão e híbridas no Brasil até a marca anunciar no final do ano passado que o SUV seria oferecido apenas como elétrico por aqui.
XC40 e C40 guardam algumas similaridades. O entre-eixos de 2.702 mm é o mesmo, mas o caimento mais agressivo do teto no C40 faz com que ele seja 56 mm mais baixo, tendo 1.591 mm de altura. O cupê também é 15 mm mais comprido, totalizando 4.440 mm, por uma questão de design do parachoque traseiro. O bagageiro mantém os 413 litros atrás e, somado aos 31 litros extras na dianteira no lugar de um motor a combustão, totaliza 444 litros.
Considerando que ainda se trata de um modelo da categoria compacta, os 2.207 kg só podem ser justificados pelo grande conjunto de baterias instalado no assoalho. São 78 kWh de capacidade, sendo 75 kWh úteis. Com isso, a Volvo divulga uma autonomia pelo ciclo WLTP de até 440 km.
As baterias alimentam dois motores elétricos, um em cada eixo e totalizando 408 cv de potência e 67,3 kgfm de torque. É o mesmo conjunto que está no XC40 Recharge, sendo que qualquer melhoria em autonomia é por aerodinâmica. Ambos devem receber a versão com apenas um motor elétrico, dianteiro, entre 2022 e 2023, a depender da produção no exterior.
Como é de se esperar de um Volvo, o C40 Recharge vendido por aqui traz todos os equipamentos de segurança e auxílio à condução que a marca oferece globalmente. Entre eles está o Pilot Assist, conjunto que combina controle de cruzeiro adaptativo, frenagem autônoma de emergência, assistente de permanência em faixa, monitor de ponto cego, alerta de tráfego cruzado traseiro com frenagem e assistente de condução semi-autônomo. Controle de estabilidade e uma profusão de airbags, claro, estão inclusos no pacote.
O Volvo C40 Recharge também é bem completo em termos de conforto e conveniência. Ele já conta com bancos elétricos com memória na dianteira, câmeras com visão de 360 graus, ar-condicionado automático de duas zonas com saída para banco traseiro, iluminação completa por LEDs, farol-alto automático, teto-solar panorâmico em vidro que protege do calor, chave presencial e rodas de 20". O acabamento interno inclui até porções retroiluminadas do painel e das portas com efeito tridimensional que remetem ao Parque Nacional de Abisko, e a opção de carpete azul, ausente no nosso carro.
Vale um espaço separado para a central multimídia. A tela parece a mesma vertical que já estamos acostumados a ver nos Volvo mais recentes. Tem conectividade sem fio via Android Auto e carregador de celular sem fio, mas o Apple CarPlay deve chegar depois. O que importa mesmo é que ela conta com sistema operacional Android desenvolvido para uso em automóveis e tem Google Maps nativo e o painel de instrumentos digital pode mostrar a navegação. Conectada à internet, a central pode receber atualizações remotas e aplicativos, como Spotify, como um tablet.
User Experience é uma área dentro da Tecnologia da Informação que se dedica a deixar a experiência de uso de um aplicativo ou software mais amigável para o usuário final. E a Volvo sempre mandou bem nesse quesito. No C40, assim como no XC40, você tem uma ergonomia bem resolvida e soluções inteligentes.
São pequenos detalhes que fazem a diferença, como a lixeirinha no console central, bolsos das portas feitos para levar um notebook (os alto-falantes estão dentro do painel, com o som saindo pelas saídas de ar) ou assoalho do porta-malas, que vira uma divisória com ganchos para levar sacolas. Mas o C40 adiciona uma camada extra de facilidade no uso diário.
Começa com a chave presencial. Ela é de fato presencial. Basta encostar nas maçanetas para abrir o carro. Como não há um motor para dar partida, também não há ignição ou botão para ligar. Basta entrar, colocar o cinto de segurança e selecionar uma "marcha" na alavanca para sair andando com o Volvo C40.
Como a multimídia do SUV cupê já usa Android, o Google Maps nativo traz algumas peculiaridades exclusivas do carro. O aplicativo traz opção para procurar pontos de recarga próximos ou ao longo trajeto escolhido, trazendo dados de quanto tempo o desvio adicionará e quanto tempo de recarga será necessário para chegar ao destino. Além disso, ao se colocar uma rota, ele já passa uma estimativa de quanta bateria você ainda terá ao chegar e após retornar ao ponto inicial da jornada. Dentro de um contexto onde as pessoas ainda estão se acostumando a ter um carro elétrico, é uma grade sacada.
Com o conjunto movido por baterias, o Volvo C40 também traz as vantagens conhecidas deste tipo de propulsão. É um carro muito silencioso ao rodar e isso gera mais desafios. Sem um motor a combustão, todos os outros ruídos se tornam aparente. Mas o isolamento da cabine permanece primoroso. Lembro do primeiro buraco que peguei com o carro: fiquei caçando o que era aquele pequeno ruído, pois não o senti nem consegui perceber de onde ele veio.
E claro que há também a forte aceleração do motor, ou motores nesse caso, elétrico. Instantânea e sempre disponível, faz um C40 de mais de 2 toneladas ser ágil no trânsito e na estrada. E aí a forma de cupê também ajuda. O arrasto aerodinâmico é menor e isso ajuda não só na velocidade, como também no isolamento de ruídos gerados pelo vento e uma autonomia um pouco maior.
Sobre a suspensão, ficou a impressão de ser mais puxada para o firme. Não incomoda porque os bancos do Volvo C40 são muito bem pensados, mas o contraponto é que é muito difícil perceber o SUV cupê rolando nas mudanças de direção. Como a caixa de direção é elétrica e rápida, o peso declarado do carro e aquele que você sente nas mãos são bem diferentes. Claro que não se vence uma briga com a física: se você entrar rápido numa curva e acelerar, os pneus vão cantar ao lidar com tanta massa e torque chegando às rodas.
Em termos de autonomia, apesar de a Volvo declarar 440 km com uma carga, meu uso mesclando cidade e rodovia apontou uma autonomia de 350 km, grande parte dessa energia perdida para manter velocidades de 120 km/h e para o ar-condicionado sempre ligado - e quem me disse isso foi o próprio carro, pelo aplicativo de monitoramento do uso de energia. Nos testes do Motor1.com, a média de consumo foi de 4,9 km/kWh na cidade, chegando a 4,7 km/kWh na estrada. Multiplicando pelos 75 kWh úteis da bateria, poderia rodar teoricamente cerca de 367 km e 352 km, respectivamente.
Mesmo sendo muito bom em combinar uma carroceria bonita e funcional, o Volvo C40 tem sim alguns percalços. Bem pequenos, mas tem. Enquanto a dianteira da cabine é praticamente a mesma do XC40, a traseira tem o mesmo espaço para as pernas e ombros, mas o teto começa ficar bem próximo da cabeça, com um ambiente mais fechado para quem está de carona. A visibilidade pela janela traseira também fica reduzida.
Pessoalmente, acredito que o visual "acupezado" do C40 combina bem mais com as dimensões da plataforma CMA do que o próprio XC40, além de ser totalmente funcional. As linhas retas das laterais, complementadas pelas rodas de aparência sólida, dão volume a parte de baixo do carro, enquanto o teto de cupê dá uma aparência mais dinâmica. Em conjunto, fazem o C40 parecer mais baixo e largo. Destaco também a lanterna traseira, mesmo com formato diferente para acompanhar a curvatura da coluna C, ainda é inconfundivelmente Volvo.
Outro ponto que fiquei sem saber se eu que estava muito para trás na tecnologia ou a Volvo que estava à frente foram as tomadas USB, todas do tipo C, usadas por aparelhos mais modernos. Meu celular, com USB normal e que não faz nada com a central multimídia sem um cabo, ficou inútil. O Google Maps nativo supriu quase todas as necessidades, mas fiquei "a ver navios" com a conectividade e tive que recorrer à tomada 12V (lembram dela?) para carregar o aparelho. Talvez seja realmente um problema mais meu que do carro.
Enquanto o Volvo C40 é um carro quase perfeito, mesmo custando quase R$ 420 mil, ainda enfrenta um dos maiores defeitos do mercado brasileiro: a falta de estrutura para o carregamento. Fora de grandes centros, a quantidade de carregadores é pequena ou inexistente, limitando suas viagens e exigindo um planejamento maior na hora de cair na estrada. Os truques do Google Maps nativo ajudam até certo ponto apenas.
Mas também precisamos levar em consideração que a falta de pontos de recarga pode ser um problema que atinge somente nós, meros mortais. Quem está gastando mais de R$ 400 mil em um veículo elétrico provavelmente tem outro carro mais apto a viagens e uma casa com um ponto de carregamento próprio. A própria Volvo irá aumentar a quantidade de pontos de recarga pelo país ainda este ano, o que vai ajudar e muito a relação com um 100% elétrico.
Tendo onde carregar e um plano de contenção caso a autonomia das baterias não seja o suficiente, o Volvo C40 é um "teaser" do futuro elétrico mostrando todos as suas vantagens, além de ter uma experiência de uso fácil e tranquila numa plataforma que soube mesclar forma e função como poucos. É o Brasil que ainda torna seu uso mais difícil.
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
Volvo C40 P8 Recharge
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