Ele criou uma categoria de esportivos chamada Pony Cars em 1964. O Ford Mustang chega aos 60 anos em sua melhor forma e vive uma situação bem contrária aos seus principais oponentes, Chevrolet Camaro e Dodge Challenger, que se despediram desse mundo em novas estratégias eletrificadas de suas marcas.
Muito dessa história segue contada nesta sétima geração. Basta procurar que há detalhes de diversas gerações como uma homenagem, mas não esqueceu de um moderno V8 aspirado e as doses de tecnologia que muitos clientes procuram nos carros, mesmo que em um esportivo. Ele tem muito a agradecer ao Mustang Mach-E, mas vamos falar sobre isso ao final. Você também vai agradecer.
Como o Porsche 911, o Ford Mustang é um daqueles que não mudam sua silhueta tradicional. Aqui, mantém o estilo cupê, com capô longo e teto baixo o suficiente para o piloto não bater a cabeça ao entrar, mesmo que de capacete. Independente da geração, um Mustang precisa ser reconhecido por qualquer pessoa.
Na sétima geração, percebemos mais cortes e linhas retas, apesar de remeter principalmente ao primeiro Mustang, da década de 1960, com a grade em três partes e, na traseira, as lanternas em três barras, algo que chamam de design evolutivo. As portas sem as molduras dos vidros e as quatro saídas de escape são charmes que, no GT Performance, acompanham as rodas de 19" com talas diferentes entre os eixos.
Em dimensões, o Mustang não é mais tão compacto quanto a primeira geração, mas a sétima cresceu pouco na comparação com a anterior, com apenas 22 mm a mais no comprimento (4.811 mm) por para-choques pouco maiores. Pouco muda em largura e altura, mostrando que o antecessor já era um carro bem equilibrado e que atendia o que se procurava de seu segmento - onde ficou sozinho.
Por dentro, ele acabou se rendendo aos desejos das novas gerações, com duas telas interligadas. No painel de instrumentos, são 12,4" personalizáveis inclusive com dois temas curiosos: o painel do primeiro Mustang e o do Mustang Fox Body, inclusive com a iluminação verde quando liga o farol. Com componentes de video-games, tem alta resolução e rápida resposta a qualquer personalização e troca de modos de condução.
No sistema multimídia, 13,2" no SYNC com espelhamentos sem fios e que, como todo carro mais moderno, integra funções e ajustes do carro e do ar-condicionado, por exemplo. Para desespero dos mais velhos, como eu, poucos botões físicos estão presentes no interior do Mustang, assim como uma certa dose de LEDs para decoração. Mesmo aos 60 anos, é preciso atender alguns desejos dos mais jovens, Mustang.
O Mustang Mach E permitiu que a Ford continuasse com o V8. Como compensação de emissões, o elétrico trouxe os números da Ford como marca para um número que permitiu que o Mustang mantivesse o 8-cilindros no catálogo, que foi melhorado em busca, além de melhores emissões, mais potência e torque.
O 5.0 Coyote recebeu admissão dupla, com duas borboletas, melhorando a entrada de ar e a mistura ar-combustível para uma queima mais exata. São 488 cv e 57,5 kgfm, 5 cv e 0,8 kgfm a mais que o Mustang Mach 1 que era vendido no Brasil antes da chegada desta nova geração, que já tinha uma dose de preparação na comparação com o antigo GT. É um V8 moderno, com dupla injeção e variadores nas duas bancadas de comandos, que estão no cabeçote de um conjunto todo em alumínio.
Para nosso mercado, o Mustang GT tem apenas o câmbio automático de 10 marchas, aquele desenvolvido em parceria com a GM - que não significa que é o mesmo câmbio de um Camaro. Ele também foi reprogramado para trocas e respostas mais rápidas, mas ainda é um ponto que o Mustang poderia melhorar na parte de sensações.
A Ford corrigiu uma coisa do Mustang anterior: a posição de dirigir. O banco do motorista está claramente mais baixo, já que o antecessor era alto demais para um esportivo e remetia mais a um sedã normal. Com isso, a posição ficou muito melhor e mais fácil achar uma boa relação com o volante, em couro com as aletas para as trocas de marchas, e ainda ter uma boa dose se conforto pelas espumas e apoios.
O botão vermelho te convida a dar a partida, mas você pode fazer isso do lado de fora e até acelerar o Mustang pela chave, algo feito para agradar a galera nos encontros. Dentro do carro, dá para escolher o quão o V8 vai falar em um seletor de modos de escape, desde o silêncio até um mais aberto que a Ford indica para as pistas, mas vai tão bem nas ruas que, bom, usei quase o tempo todo assim.
Ao lado, uma alavanca de freio de mão que aciona o freio eletrônico, mas também tem um modo drift, justamente para travar as rodas traseiras na dose certa para andar de lado - mais uma vez, um feature para agradar a galerinha mais nova. Isso não estraga a experiência com o Mustang, mas se não existisse, não ia fazer falta.
Mas isso fica restrito aos sisteminhas que a Ford criou para agradar os jovens que tem dinheiro. Aos que gostam do carro em si, o Mustang ainda entrega o que tanto gostamos: ser um carro. Um carro com um V8 aspirado, duas portas, ronco e tração traseira, uma peça em extinção.
Uma das coisas que mais agrada no Mustang é a usabilidade. Sim, é um esportivo de duas portas, mas é possível conviver com ele nos grandes centros com certos cuidados. A suspensão adaptativa tem uma dose de ajuda nisso, já que pode ser um carro confortável para a sua proposta ou um esportivo bem calibrado.
No dia a dia, o câmbio de 10 marchas faz as trocas suaves e em rotações baixas, aproveitando o que o 5.0 entrega em baixas mesmo sendo um motor aspirado. Com 5,5 km/litro em ciclo urbano, não é um consumo exemplar, mas é o preço de ter um V8 aspirado sem eletrificação em um cupê esportivo. E sem exageros, é mais confortável que o Mach E, o SUV elétrico que testamos há alguns meses.
Isso vem muito da proposta do Mustang em sua terra natal, onde é um carro relativamente acessível e que precisa atender diversos públicos em suas diversas versões. O sistema de som Bang&Olufsen, de série por aqui, entra no pacote para curtir no dia a dia com o escape quieto e o carro mais manso que te fará esquecer para o que você o comprou.
Escolha um dos modos esportivos (Esportivo, Pista e Pista Drag) e entenda como o Mustang realmente se sente feliz. O Esportivo entrega a força, mas ainda com uma dose de conforto e usabilidade, como em como atua o controle de estabilidade e tração e as respostas do acelerador - o peso da direção varia entre Conforto, Esportivo e Normal, selecionável de forma independente. É recomendável se você quiser uma entrega de força maior, com marchas mais esticadas, em uma estrada, por exemplo.
O Pista já vai além. A suspensão fica mais rígida e acompanha melhor a parte física da estrutura, como as barras de amarração superiores e as barras estabilizadoras mais grossas, vindas do Mach 1. O acelerador está sensível e os controles de estabilidade mais permissivos, o suficiente para explorar mais como ele escorrega a traseira e não é complicado de voltar - sim, ele melhorou isso. O foco são circuitos, onde dá para escorregar em busca do melhor tempo, algo que ele aprendeu para agradar o público também na Europa. Só a direção que, mesmo no modo Esportivo, que ainda poderia ser mais comunicativa, como em modelos da BMW e Audi.
Se o levar para as pistas, o Mustang GT tem diversas informações no painel de instrumentos, como temperaturas, pressões e até mistura ar/combustível, e também na central multimídia, além de habilitar o freio de mão para drift. Vai andar em arrancadas? Modo Drag, que habilita o linelock para o burnout e ajusta a suspensão e os controles de estabilidade e tração para jogar a força no eixo traseiro sem desperdiçar tempo.
No nosso teste, o melhor número do Mustang GT foi de 5,2 segundos sem o controle de tração. Ele destraciona bem, marcando o chão sem dó, mas o tempo com o controle ligado foi pior - o número inferior ao Mach 1 anterior (4,8 segundos) pode ser creditado por um carro mais pesado que o antecessor, apesar de mais potente, além da programação de entrega de força mais conservadora para atender novas normas de emissões.
Mas o melhor é curtir curvas com ele. Ele aponta onde você procurar e, com a dose certa de acelerador, não vai te assustar com uma traseira viva e, caso vá sair, dá para perceber os alertas e corrigir a tempo. Ele aprendeu a ser equilibrado com os esportivos europeus, mas tem a brutalidade dos norte-americanos na força do V8. O câmbio de 10 marchas é um pouco exagerado, fazendo muitas trocas seguidas e se perdendo em alguns momentos.
Em situações de pista, o câmbio deixa a rotação muito alta e com muitas trocas e reduções seguidas, o que tira um pouco do brilho do V8. Neste momento, vale as trocas manuais pelas aletas, mas parece até um pouco artificial demais, quase uma sensação de CVT, algo que o Camaro com essa caixa era mais resolvido. A experiência do Mustang com o câmbio manual deve ser mais pura para curtir o que o V8 realmente entrega.
Para não seguir o mesmo caminho de Camaro e Challenger, o Mustang se reinventou. Olhou para as novas gerações e trouxe soluções para esse público, inclusive com o pacote de assistentes de condução bem completo. Telas, LEDs, acelerar o carro fora dele, tudo isso é feito para esse público que pode gostar também de um V8 aspirado.
Para nós, os mais tradicionalistas, ele ainda é um deleite. É um esportivo usável, mas que entrega bastante se pedir na estrada ou nas pistas, apesar de um câmbio que estraga um pouco essa experiência com alguns exageros. Cheguei a ouvir que os R$ 529 mil é justo pelo o que ele é, ainda mais com a usabilidade que permite e seus 488 cv acompanhados de um belo ronco que se espalha no mundo eletrificado pelas ponteiras de escape, peças em extinção. Aos 60 anos, o Ford Mustang não esqueceu o passado. Foi salvo da extinção justamente por um carro elétrico e não tem vergonha de nada do que fez, do que faz e do que fará.
Agradecimentos: Dream Car Museum (Estrada do Vinho, 7.901, São Roque)
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
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