Apesar do interesse crescente nas picapes, versões preparadas não são tão comuns, principalmente no segmento das caminhonetes médias. É ainda pior no Brasil, onde a única opção era a Toyota Hilux GR-Sport, que contava com um ajuste diferente na suspensão e vários adesivos. O modelo evoluiu com o passar do tempo até chegar na 4ª versão, que pudemos dirigir no asfalto e na terra. A boa notícia? Mudou tanto que podemos chamar de esportiva.
Feita pela Gazoo Racing, a divisão esportiva da Toyota, a Hilux GR-Sport foi o primeiro carro preparado da empresa a chegar ao Brasil. Desde então, a cada nova versão, recebia algo novo. A segunda “geração’ trouxe o motor 4.0 V6 a gasolina de 236 cv (que vendeu muito mal por aqui), a terceira variante adotou o motor 2.8 turbodiesel modificado para entregar 224 cv (além da reestilização que estreou também na linha normal). Assim, a Gazoo Racing precisava de algo novo para atualizar a picape.
A Toyota resolveu apresentar a picape à imprensa na Argentina, em uma viagem até San Juan. Não foi por acaso. A sede da Gazoo Racing na América Latina fica na Argentina, então a equipe responsável pela Hilux GR-Sport estava presente em todos os momentos. Além disso, a região conta com dois bons locais para mostrar os atributos da caminhonete: o autódromo de San Juan Villicum e os quilômetros de vales áridos nos arredores da cidade.
O primeiro contato com a picape foi logo no momento de entrar na Hilux e começar a dirigir. Olhando por fora, é muito claro o quanto a GR-Sport mudou em comparação com as anteriores e não é um exagero que esta deve ser a maior evolução do veículo desde que foi lançado. Tem uma postura bem agressiva por causa das proteções plásticas sobre as caixas de roda, para compensar as bitolas alargadas. O para-choque redesenhado e a grade exclusiva formam uma boa combinação. E nada de adesivos pela carroceria.
Nenhuma dessas alterações foi feita por acaso. Por exemplo, o para-choque tem passagens de ar bem sutis nas laterais, para reduzir a turbulência na caixa de roda e melhorar a estabilidade. A grade otimiza o resfriamento do motor. Até mesmo o spoiler traseiro, onde deveria estar o santantonio, foi desenvolvido para melhorar a dinâmica em alta velocidade (mesmo que não seja lá muito agradável aos olhos).
Do lado de dentro, é a Hilux que conhecemos, até mesmo pelos detalhes da GR-Sport, como as partes em vermelho no painel e nos assentos, ou as costuras escarlates para os bancos e volante. Traz uma novidade: uma tela de 9 polegadas para a central multimídia, com Android Auto e Apple CarPlay sem fio e combinado a um sistema de som da JBL com seis alto-falantes, dois tweeters e um subwoofer.
Os primeiros quilômetros dirigindo mostrou alguns detalhes, por conta da péssima condição da rodovia. Acabou ficando mais desconfortável, principalmente para quem estiver nos bancos traseiros, uma consequência das mudanças na suspensão. Mais firme, acaba filtrando menos as irregularidades do piso e transmitindo muito mais para a cabine. Isto desapareceu ao pegar um trecho melhor da rodovia, com um asfalto em bom estado e seguiu assim até chegar ao autódromo.
No circuito de Villicum, a equipa da Gazoo Racing tratou de explicar tudo o que foi feito na Hilux GR-Sport e a ideia por trás da nova versão. Ao invés de mexer novamente na motorização, a escolha foi melhorar a estabilidade da picape para que ela possa andar mais rápido. As bitolas dianteiras foram aumentadas em 70 milímetros em cada lado (totalizando + 140 mm), enquanto as traseiras cresceram 77 mm de cada lado (+ 155 mm no total). Isto foi feito ao redesenhar o eixo traseiro e com barços de suspensão estendidos. O vão livre do solo está 20 mm maior, chegando a 323 mm.
Pudemos ver isso na foto acima, em uma unidade que estava levantada e sem o pneu traseiro esquerdo. Além dos braços mais longos, os amortecedores foram reposicionados mais à frente, perto das rodas, o que aumenta a sua eficácia. Falando neles, os amortecedores agora são monotubo de alta performance, com um diâmetro maior e que utiliza somente gás (ao invés da tradicional combinação de gás e óleo). A suspensão dianteira ainda recebeu uma nova barra estabilizadora tubular, enquanto as rodas traseiras adotaram freios a disco muito mais pela capacidade de dissipação de calor do que por poder de frenagem.
Era hora do segundo contato com a Hilux GR-Sport e, desta vez, foi na pista de Villicum. Sim, uma picape no circuito não é o ideal e foi por isso mesmo que a Toyota escolheu fazer esta dinâmica, primeiro dirigindo a versão SRX. Em várias das curvas, era nítido que estávamos no ambiente errado, lidando com o balanço da carroceria, principalmente em duas das cruvas mais fechadas do autódromo e, diversas vezes, me vi aliviando bastante no acelerador por não saber se estava chegando perto demais do limite.
As voltas seguintes foram com a Hilux GR-Sport e isto mudou totalmente. Não é um exagero dizer que a picape se comportava muito mais com um carro de corrida e que a sensação ruim de que poderia capotar desapareceu por completo. Logo estava fazendo algumas curvas com muito mais confiança, aproveitando a estabilidade e aderência.
Esta situação me lembrou de algo que um membro da equipe da Gazoo Racing comentou. O motor 2.8 turbodiesel poderia ter sido modificado? Sim, poderia. Mas os 224 cv a 3.000 rpm e o torque máximo de 55 kgfm a 2.800 rpm são suficientes na maioria das situações, mesmo que usando um câmbio automático de 6 marchas. Tanto é que, segundo a marca, o veículo chega a 100 km/h em 9 segundos. O que a Hilux precisava para ter um desempenho de esportivo é ser mais estável em alta velocidade. Alcançaram este objetivo com louvor.
Depois do circuito, veio o segundo momento para dirigir, desta vez na “pista” improvisada criada no terreno ao lado do autódromo. A região, chamada Cuyo, é formada por diversos vales de vegetação escassa e um clima desértico (estava fazendo um calor de 37 graus naquele dia). Ao final do verão, muitos dos locais onde deveriam estar rios e pequenos lagos eram apenas terra seca e pedras. E foi ali que a Toyota criou um pequeno traçado off-road, com a ajuda de Gabriel Raies, ex-piloto que foi campeão 16 vezes do Rally Argentino.
A dinâmica foi igual à da pista, começando com algumas voltas com a Hilux SRX. Como disse uma pessoa da Gazoo Racing, este é o território da picape. Mesmo com a pista sendo bem estreita em alguns trechos, foi muito mais divertido do que no asfalto. Não havia a preocupação se a Hilux iria capotar por conta da inclinação da carroceria, e sim se teria tração e aderência das curvas para seguir o ritmo. Como andei depois de outros jornalistas, havia um problema em alguns trechos com o trilho (o caminho criado após a picape passar ali diversas vezes), que começou a ficar fundo demais e as pedras batiam constantemente no assoalho.
Se eu já não estivesse convencido de que a Hilux GR-Sport havia ficado melhor, seria neste situação que a Toyota iria me convencer de vez. A caminhonete estava sempre na mão, sempre sobre controle, mesmo que estivesse forçando muito mais ao fazer as curvas mais rapidamente. Nunca chegou a sair de controle e respondia aos comandos com precisão.
A altura maior em relação ao solo solucionou os problemas das pedras, o que também me deu mais confiança de passar por estes caminhos pisando fundo. E, para que ninguém saísse de lá achando que era um piloto de rally, a Toyota preparou mais uma situação: uma volta com Raies no volante, que logo desligou os controles de estabilidade e tração e mostrou que está em outro nível, até mesmo fazer um pequeno drift em uma das curvas.
A terceira e última parte da viagem foi a mais tranquila, desta vez passando por trilhas nos arredores de San Juan em um caminho até o Dique de Ullum. Ultrapassamos diversos trechos de rios secos, lidando com degraus consideravelmente altos, mas que não representaram nenhum problema para a Hilux. Foi aqui que aproveitei para olhar mais para os equipamentos da picape. A nova multimídia não é nada demais, mas funciona bem e conectou rapidamente ao Android Auto sem qualquer problema. Além da câmera de ré, tem um sistema de visão 360°, ajudando nas manobras, além dos tradicionais sensores de estacionamento dianteiro e traseiro.
Como é a versão topo de linha, traz tudo o que já vimos nas outras configurações. Faróis full-LED com iluminação diurna, controle de cruzeiro adaptativo, alerta de saída de faixa, chave presencial, sete airbags, monitoramente de pressão dos pneus, alerta de saída de faixa, bloqueio do diferencial traseiro e mais. Poderia ter um painel melhor, ou pelo menos uma tela maior para o computador de bordo.
É inegável como a Gazoo Racing fez um belo trabalho com a Hilux GR-Sport, a ponto de que nem me atrevo mais a chamá-la de esportivada. Tem as credenciais necessárias para chamar de esportiva, feita para encarar qualquer situação no asfalto ou na terra com bravura e velocidade. O problema é que cobra bastante por isso, custando R$ 367.390. É, disparado, a picape média mais cara do Brasil, em média R$ 40 mil mais cara do que as versões topo de linha das rivais. Custa até mais do que a Ram Classic, uma caminhonete de um segmento acima e que chega a R$ 359.990.
O preço mostra que a Toyota Hilux GR-Sport será uma picape para um público bem específico, que quer uma caminhonete média mais capaz em todas as situações e que não pode partir para um modelo maior. Esta sozinha no segmento, sem que exista uma outra picape esportiva de verdade no país. Até que alguma outra marca decida apostar na categoria (cadê a Ranger Raptor, Ford?), irá se aproveitar deste momento para vender o máximo que puder e renovar a imagem da Hilux.
Fotos: Divulgação, Motor1.com (Nicolas Tavares) e Renato Maia