Ver carros de passeio com motores movidos a diesel é um sonho antigo de alguns brasileiros. O rendimento superior deste combustível sempre foi um forte argumento para pedir uma revisão da proibição no Brasil, feita há 46 anos. E, mais uma vez, alguém tenta reverter esta decisão, com um projeto de lei protocolado pelo deputado federal Heitor Freire (União), pedindo que o país libere a produção e venda de carros a diesel.

A proposta quer que carros populares possam ser equipados com motores diesel, ao contrário da resolução atual, que permite somente veículos comerciais como ônibus, furgões, caminhões e picapes. Os únicos carros de passeio que escapam da norma são os SUVs, mas precisam ter um sistema de tração 4x4 com reduzida (ou uma tração integral que tenha uma simulação da marcha reduzida, como no caso dos Jeep Renegade e Compass).

A Portaria MIC 346, feita pelo Ministério da Indústria e Comércio e publicada em 1976, foi feita considerando o momento histórico. O diesel emitia muito enxofre, o que mudou com o desenvolvimento de outros tipos como o S10; e por conta da crise mundial de combustível. O diesel era muito caro e não era possível usar o petróleo brasileiro para produzí-lo, assim era necessário importar o combustível. Só que, na época, o Brasil já importava 78% do petróleo consumido.

“Ela fez muito sentido nessa época, mas hoje está desfasada, uma simples portaria ministerial cujos efeitos já perduram por quase 25 anos, mesmo com o cenário da tecnologia automotiva e da eficiência energética havendo mudado profundamente”, explica Freire. O deputado argumenta que, com o custo alto do etanol e da gasolina, “continuar proibindo a fabricação de carros leves movidos a óleo diesel é um capricho do mercado automotivo que prejudica unicamente o acesso do cidadão comum a um combustível mais barato.”

Discurso eleitoral na contra-mão do mundo

Só que esta proposta pode não dar muito certo, pois outras tentativas não foram para frente. Em 2016, um projeto de lei do senador Benedito Lira (PP) tentou, sem sucesso, liberar a venda de carros a diesel. No ano passado, foi a vez do deputado federal Kim Kaguiri (DEM-SP) apresentar uma emenda parlamentar pedindo a mesma coisa, novamente sem resultado. Na ocasião, a Anfavea, associação das fabricantes automotivas no Brasil, se posicionou contra, citando o processo de descontinuação dos motores diesel na Europa:

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"A Anfavea entende que esta discussão sobre a liberação de automóveis a diesel no Brasil está totalmente fora da realidade dos tempos atuais. Enquanto o mundo discute a descarbonização dos transportes, através da aplicação de biocombustíveis, hidrogênio ou eletrificação, qualquer proposta de aumentar a participação de combustíveis fósseis na matriz energética brasileira é um enorme retrocesso", afirma diretor técnico da associação, Henry Joseph Jr.

De fato, as fabricantes se afastaram do diesel com rapidez após o conhecido Dieselgate, o escândalo de fraudes de emissões cometido pela Volkswagen e que levou a mais de um bilhão de euros em multas tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Desde então, muitas já anunciaram que não produzirão mais carros com motores a diesel: Audi, Citroën, Honda, Hyundai, Nissan, Peugeot, Renault e Volvo são algumas que já colocaram uma data para não ter mais veículos a diesel no mercado europeu.

O próprio mercado já mostra a razão desta mudança. Carros diesel tinha mais de 50% de participação nas vendas na Europa e, após 2015, começou uma queda vertiginosa. De acordo com a ACEA, associação das fabricantes de carros no Velho Continente, os motores disel tinham 27,9% de participação em todos os carros vendidos em 2020. Em 2021, este número caiu para 19,6%, ultrapassado pelos híbridos (19,6%).

O projeto de lei tem outros problemas. Mesmo que o carro a diesel seja liberado, ainda há outros pontos a serem discutido, como o IPI mais alto (12,2%, contra os até 14,6% cobrados sobre os carros flex). E levaria um tempo para fazer efeito, já que a estratégia atual das fabricantes não prevê a venda de veículos menores a diesel. Os motores teriam que vir importados, já que não são produzidos aqui e ainda precisaria fazer todo o longo e custoso processo de homologação.

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