Olhando para as quatorze marcas de veículos do quarto maior fabricante global, o Grupo Stellantis, levando-se em conta que na lista estão incluídas gigantes dos Estados Unidos como Jeep e Ram, que integram as chamadas “big three” de Detroit dominantes do segundo maior mercado mundial, você apostaria que a Fiat é a marca mais vendida da empresa no mundo?
Pois é exatamente o que aconteceu nos dois primeiros anos de existência da companhia formada pela fusão dos grupos FCA e PSA, formalizada em janeiro de 2021.
Com pouco mais de 1,2 milhão de carros vendidos em 2021 e 2022, a Fiat foi a marca mais vendida da Stellantis em todos os mercados onde a fabricante atua, poucos milhares de veículos à frente de Jeep e Peugeot, as três únicas do grupo que vendem acima de 1 milhão de unidades/ano.
A centenária Fabbrica Italiana Automobili Torino, fundada em 1899, foi responsável por quase 21% dos 5,8 milhões de veículos vendidos pela Stellantis em 2022 – e isto sem sequer frequentar três dos maiores mercados do mundo, China, Estados Unidos e Japão, e ter participação apenas marginal nos principais países europeus como Alemanha, França e Reino Unido.
Fora dos maiores mercados, a marca italiana – incluindo Fiat, Abarth e Fiat Professional – garantiu a liderança de vendas do grupo pelo bom desempenho nos três países onde sempre foi melhor no mundo: pela ordem, Brasil, Turquia e Itália, com participações de mercado de 22%, 19% e 15%, respectivamente. Na América do Sul a Fiat também lidera com market share de 13,6%.
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Graças ao Brasil
Isoladamente o mercado brasileiro é o maior da Fiat no mundo, sozinho garantiu mais de um terço, 36%, das vendas da marca no mundo, com 430 mil carros vendidos em 2022.
Para ajudar, a renovação do portfólio brasileiro de modelos iniciada em 2020 com a nova Strada e sucedida pelo lançamento dos primeiros SUVs da fabricante, Pulse e Fastback, garantiram o melhor desempenho da década e recolocaram a Fiat e a picape Strada no topo do ranking brasileiro nos dois últimos anos – posição que havia perdido para a GM e seu Onix desde 2016.
A Fiat renovou e reposicionou o valor de seus carros no Brasil justamente no momento em que a faixa de consumidores de maior renda passou a sustentar as vendas. Com esta estratégia, em 2022, dominou 24,7% das vendas no segmento de hatches e vendeu quase 50% das picapes somando os emplacamentos de Strada e Toro.
Foram fatores fundamentais para garantir à Fiat o posto de marca mais vendida do grupo os resultados robustos de vendas na América do Sul – a divisão regional da Stellantis reportou lucro operacional recorde de € 2 bilhões e margem de ganho sobre faturamento de 13% – e a habilidade de produzir na região mais do que os concorrentes em um ambiente de falta de microchips eletrônicos.
Virada pós-fusão
Mesmo se não conseguir manter o mesmo ritmo daqui para frente, trata-se de uma importante virada protagonizada pela marca italiana no pós-fusão. Poucos anos antes da consolidação do negócio, ainda sob o controle da FCA, em 2018, o plano estratégico global do grupo previa que a Fiat continuaria a ser uma marca popular de grandes volumes apenas no Brasil e países vizinhos, e iria encolher na Europa, onde se converteu em marca de nicho focada em pequenos carros elétricos, caso do 500e.
O festejado chefão da FCA na época, Sergio Marchionne, falecido logo depois, justificava o plano: “Não vou investir em uma marca e modelos que o consumidor europeu não quer mais. Na Europa a Fiat será uma marca de nicho de elétricos e seguirá com volumes maiores somente na América do Sul”.
Este plano, de fato, foi colocado em prática. A América do Sul tem linha de produtos própria, dissociada da Europa. Nos mercados da União Europeia a Fiat só vende carros compactos dos segmentos A e B, todos híbridos leves e elétricos – como o 500e que teve 66 mil unidades comercializadas no ano passado, foi o elétrico mais vendido na Itália, segundo na Espanha e terceiro na Alemanha.
Para manter o ritmo a Stellantis prevê lançar quatro novos Fiat eletrificados em 2023, aproveitando-se de sinergias tecnológicas desenvolvidas por outras marcas do grupo.
Com a volta à normalidade do fornecimento de chips – especialmente para as fábricas nos Estados Unidos – e uma já visível retração do mercado brasileiro, será mais difícil para a Fiat sustentar a atual posição de marca mais vendida da Stellantis neste e nos próximos anos. Ainda assim a Fiat seguirá como uma das marcas de maior volume do grupo e a que melhor se beneficiou da fusão, ao menos até agora.