Uma empresa de dedetização já apregoava nas rádios e TVs: “É um pouco mais caro, mas é muito melhor!”. E, durante uma semana de convivência com o HR-V Touring, esse slogan dos anos 80 ecoou em minha mente. Eis a lógica dos fiéis compradores de Honda que, podendo, pagam mais para evitar dores de cabeça. Em busca de carros com eficiência comprovada, dispensam novas emoções ou aventurar-se por marcas que não conhecem.
Isso explica porque vemos nas ruas tantos HR-V da geração atual, quase dois anos após seu lançamento no Brasil. Mesmo com preços bem mais altos que os outros SUVs compactos, o modelo da Honda vende, em média, 3.500 unidades por mês. Não satisfeita, a companhia contratou em abril 450 trabalhadores para abrir um segundo turno e aumentar a produção de suas duas fábricas no interior de São Paulo.
Hoje, os HR-V mais simples, com motor 1.5 aspirado de 126 cv, já estão custando R$ 152.700 (EX) e R$ 162.300 (EXL). Já as versões com motor 1.5 turbo são duas: a intermediária Advance, de R$ 188.500, e a topo de linha Touring. Esta tem preço de R$ 199.800 informado no site da Honda - mas nas concessionárias, a pedida é ainda maior, chegando a R$ 204.800.
O HR-V que chegou para esta avaliação foi o Touring, simplesmente o mais caro dos SUVs compactos nacionais - e com muita distância para os concorrentes de porte semelhante. Para comparação, eis os preços de outros três topos de linha: o Jeep Renegade Trailhawk com motor 1.3 turbo e tração 4x4 está por R$ 188 mil na tabela, enquanto o VW T-Cross Highline 250 TSI sai por R$ 176 mil e o Caoa Chery Tiggo 5x Pro Hybrid Max Drive custa R$ 145 mil.
Assim, o HR-V Touring acaba concorrendo com modelos maiores como o Jeep Compass na versão intermediária Longitude T270 (R$ 197 mil), o VW Taos na configuração básica Comfortline 250 TSI (R$ 187 mil), o Caoa Chery Tiggo 7 mais caro (Pro Hybrid Max Drive, de R$ 170 mil) e o Toyota Corolla Cross híbrido XRV (R$ 202.690).
Esta é a terceira geração do HR-V fabricada no mundo - e a segunda no Brasil. Com o nome código RV, é o modelo atualmente produzido (ou montado) não só aqui como também no Japão, na China, em Taiwan, na Tailândia, na Indonésia, na Malásia, no Paquistão e em Gana. A versão vendida em países como Alemanha, França e Inglaterra, por exemplo, tem visual idêntico ao do carro fabricado no Brasil, mas seu conjunto mecânico é híbrido.
No Japão, onde foi lançado há três anos, esse HR-V acaba de passar por uma discreta plástica de meia vida, com mudanças na grade, nos para-choques e nas lanternas traseiras. E a Honda já registrou essas mudanças no nosso Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Ou seja: não demora e o HR-V nacional receberá alguns retoques no visual.
Mesmo já bem conhecido, o estilo do modelo fabricado em Itirapina (SP) ainda impressiona. Quer saber se o HR-V do seu vizinho é aspirado ou turbo? Basta olhar para a grade: se tiver frisos horizontais, o carro traz motor aspirado; se for do tipo colmeia, com pequenos quadradinhos em preto brilhante, o motor é turbo. Na traseira, a diferença mais óbvia são as duas saídas de escape nos turbo, contra uma só nos aspirados. A parte inferior dos para-choques tem um acabamento “mais esportivo” nos turbo.
A versão Touring tem ainda lentes translúcidas fumês nas lanternas traseiras, além de rodas de 17” com desenho exclusivo e acabamento diamantado. Já os pneus são iguais para todas as versões: os ótimos Michelin Primacy 215/60 R17. Um detalhe curioso: quando se dá carona no HR-V, muita gente ainda fica procurando as maçanetas das portas traseiras - que, desde a geração anterior, são embutidas na moldura das janelas. A solução estética de dez anos atrás ainda causa certo espanto e admiração por aqui.
O HR-V Touring tem bancos muito bem forrados com couro sintético clarinho, mas fácil de limpar. As laterais das quatro portas trazem uma parte acolchoada, também clara. O ponto fraco é o plástico duro cobrindo todo o painel. Uma barra central em tom mais claro tenta aliviar o visual, mas o aspecto geral do tablier não está à altura de um carro de R$ 200 mil.
Por outro lado, gostamos muito dos instrumentos de bom tamanho. As escalas têm desenho limpo e sem certas criatividades que só atrapalhariam a leitura. É o mesmo quadro do City, com dois mostradores redondos: um analógico à direita, para o velocímetro, e um digital no lado esquerdo, que serve como conta-giros (com ponteiro) e também abriga o computador de bordo.
O sistema multimídia tem tela de 8" com péssima resolução - é um ponto a ser melhorado com urgência. Outra: toda vez que se dá seta para a direita, a tela central mostra imagens captadas por uma câmera instalada no retrovisor direito, uma ótima solução contra pontos cegos, já utilizada em outros Honda. O problema é que, ao ser acionado, esse recurso “tira do ar” todas as outras informações da multimídia (o mapa do GPS, por exemplo).
O volante tem bom diâmetro e é forrado no capricho com dois tipos de couro: liso e suave na parte onde se põem as mãos, e mais rugoso e resistente no topo. Também é de se elogiar o ar-condicionado digital de duas zonas, facilmente ajustado por meio de três grandes botões. Difusores nas extremidades do painel permitem direcionar o fluxo de ar para os vidros laterais, evitando o vento direto no rosto. Há ainda duas saídas voltadas para a parte de trás da cabine.
Os bancos dianteiros são firmes mas poderiam ser mais largos. O do motorista tem ajustes elétricos apenas na versão Touring. Um destaque é o amplo espaço da cabine, especialmente para quem vai no banco de trás. Sobra espaço para os joelhos e o assoalho é plano.
Pena que existe um ressalto duro, e da largura do apóia-braço, bem no meio do assento traseiro. Fica claro que o banco de trás só é bom para dois passageiros - um terceiro viajará sem conforto algum. Em um carro voltado para uso familiar, isso é um inconveniente.
Por outro lado, o banco traseiro é versátil e pode ter seu encosto rebatido em duas partes, ficando perfeitamente rente ao piso do porta-malas. Outra: sob o assento de trás há um espaço vazio onde é possível levar bolsas e sacolas.
O que se ganhou em espaço na cabine, contudo, perdeu-se na área do porta-malas. São apenas 354 litros. A parte boa é que, na versão Touring, pode-se abrir a tampa passando o pé sob o para-choque traseiro.
Uma das vantagens do modelo frente à concorrência é o Honda Sensing, um sistema de assistência autônoma nível 2 que equipa os HR-V desde sua versão mais simples. Uma câmera na base do retrovisor interno faz as vezes de radar. Com isso, temos piloto automático adaptativo (ACC), assistente de permanência na faixa, alerta de colisão com frenagem de emergência e até comutador automático de facho dos faróis.
De tudo isso, o melhor é o ACC que pode ser usado no trânsito urbano. Em pistas de tráfego intenso, mas sem retenções constantes, a gente relaxa e deixa o piloto automático acelerar e frear sozinho. Funciona muito bem e parece bastante seguro. Mesmo depois de uma parada total, damos um toquezinho no acelerador e o sistema retoma sua programação. Já o dispositivo de centralização na pista desarma o tempo todo caso as faixas não estejam muito bem pintadas no asfalto.
Abra o capô e o que se vê dentro do cofre sem pintura (só primer) é o motor L15B7, que vem prestando excelentes serviços nos Honda. Estreou no Brasil em 2017, no saudoso Civic Touring (173cv), equipou os CR-V Touring (190cv) e Civic Coupe Si (208cv) e chegou a ser usado na geração anterior do HR-V Touring (173cv).
Com injeção direta, comandos acionados por corrente e variação de abertura e levantamento das válvulas de admissão e escape, o 1.5 turbo i-VTEC tem fama de robusto, esperto e econômico. No HR-V turbo atual, sai em versão flex de 177 cv e 24,5 kgfm. São nada menos que 51 cv a mais que as versões aspiradas, de 126 cv.
Como de costume, o motor vai atrelado ao câmbio CVT com sete marchas simuladas e acionamento por aletas atrás do volante. Na prática, esse conjunto faz do HR-V Touring um dos SUVs mais rápidos do pedaço, sempre pronto para ultrapassagens e retomadas, especialmente com o modo sport acionado. Isso melhora as respostas do acelerador, faz as “trocas de marchas” virtuais em rotações mais altas e até deixa a direção mais pesadinha.
Qualquer que seja o modo de condução escolhido, quase não se nota turbolag e, tampouco, há aquela sensação de “enceradeira” tão típica dos carros com caixa CVT. Tudo é feito com muito silêncio, passando a impressão de que há força de sobra para levar o utilitário de 1,4 tonelada.
Para melhorar as coisas, os HR-V turbo têm molas mais rígidas, amortecedores com mais carga e barra dianteira mais grossa que nas versões aspiradas. É um carro firme e, ao mesmo tempo, está longe de ser desconfortável. Assim que vimos o para-choque dianteiro imaginamos que iríamos arrastar em rampas ou quebra-molas assassinos, mas isso não aconteceu. Além disso, o vão livre de 18 cm é compatível com essas armadilhas tão típicas do Brasil. No geral, o HR-V Touring é bem gostoso de guiar. Sua direção é bem direta mesmo em modo normal. A plataforma, vale lembrar, é a do City, com apenas 1 centímetro a mais de entre-eixos.
Após uma semana de uso, registramos o excelente consumo de 11,4 km/l na cidade (andando em modos eco e normal) e 13,9 km/l na estrada (mesmo usando esporadicamente o modo sport), sempre com gasolina. Já as medições para o PBEV do Inmetro indicam os mesmos 11,4 km/l em uso urbano e 13,1 km/l em uso rodoviário. Por mais que gastem dinheiro ao comprar carros 0km, os donos de Honda certamente gostam de economizar no posto.
Honda HR-V Touring 1.5T
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