A Volkswagen segue apostando que o futuro no Brasil será com o etanol, especificamente com as soluções híbridas flex. Mas nem por isso deixa de lado o outro caminho, o dos carros 100% elétricos. Depois de mostrar estaticamente o ID.3 e ID.4, agora foi a vez da marca alemã nos deixar degustar um pouco da sua inédita família de elétricos aqui no Brasil. O percurso foi curtíssimo, mas já deu para perceber que o "negócio é sério".
Nesta primeira volta, não vamos nos aprofundar na análise do acabamento, espaço interno e estilo porque já fizemos descrição detalhada no encontro com os dois carros elétricos lá na fábrica da VW. Indo direto ao ponto, nossa experiência prática foi em São Paulo, precisamente num trajeto de poucos mais de 4 quilômetros no entorno do Jockey Club. Isso significa que andamos apenas em vias planas, sem nenhum aclive ou descida, mas encarando parte bem esburacada e com trânsito pesado.
Começamos pelo SUV, modelo que segundo executivos da marca tem mais chances de ser vendido por aqui. Como, neste momento, todos carros elétricos são caros, seria mais justificável o preço do ID.4, modelo que tem 4.584 mm de comprimento, 1.852 mm de largura, 1.640 mm de altura, 2.771 mm de entre-eixos. Para você ter uma ideia, seu rival direto aqui no Brasil (caso realmente venha) será o Volvo XC40 Recharge com seus 4.425 mm de comprimento, 1.863 mm de largura, 1.652 mm de altura e 2.702 mm de entre-eixos.
Ao assumir a posição de dirigir, o ambiente minimalista agrada bastante. Não existem botões físicos espalhados no console central, sendo que todos os ajustes ficam concentrados na grande tela de 10 polegadas com altíssima definição. Ponto que provavelmente vai gerar comentários negativos é o tamanho diminuto do painel de instrumentos. O que digo a seu favor, no entanto, é que ele entrega excelente nível de visibilidade da velocidade e funções ativas, com destaque para seu constraste e a profundidade do preto no visor (não fica aquele acinzentado de telas mais básicas).
Também não há alavanca de câmbio, apenas um botão giratório que fica ali do lado painel para selecionar os modos drive, ré ou parking. Também tem a opção "B" para forçar a regeneração das desacelerações e frenagens. Quase igual ao esquema da Volvo, basta sentar no banco do motorista para o ID.4 "ativar a ignição" completa e ficar pronto para andar.
Indo ao que interessa, o ID.4 é impulsionado por um motor elétrico de 204 cv e 31,6 kgfm de torque instalado no eixo traseiro. Diferente do modelo sueco e até mesmo dos primos da Audi, a proposta do SUV da VW é ter uma convivência mais urbana com desempenho mediano. O objetivo é fazer os 77 kWh do pacote de baterias render mais, atingindo alcance de até 522 km com uma recarga. Obviamente, o rodar é silencioso, como esperado. Mesmo assim chamou a atenção a agilidade necessária para se encontrar os espaços do trânsito com segurança e firmeza - o 0 a 100 km/h declarado é de 8,6 segundos.
Pelo tamanho da carroceria e balanços mais curtos, a VW optou por grandes rodas com aro de 21 polegadas. Elas contribuem para o estilo do carro e, curiosamente, não comprometem no conforto. Vindo direto da Alemanha sem nenhum tipo de ajuste, a suspensão conseguiu ser confortável e segura, mesmo passando por uma rua com péssimo asfalto. Comparado ao Volvo, o Volkswagen é bem mais lento, ficando bem clara a intenção do modelo ser mais familiar e deixando a vocação mais esportiva para os primos nobres da Audi.
Construído sobre a nova plataforma MEB, específica para elétricos do Grupo VW, transmite muita qualidade construtiva. A sensação é a de um carro bem sólido e com peso bem distribuído, mesmo chegando aos 2.049 quilos. Conclusão: faz toda a diferença o fato de ter sido pensado desde zero para ser um elétrico.
O ID.3 também chama a atenção pelo visual. É mais interessante que um Chevrolet Bolt e Nissan Leaf, por exemplo, mas se fossemos colocar em termos práticos, atenderia aos anseios de donos de Golf. O hatch elétrico tem comprimento de 4.261 mm (15 mm menor que o Golf), largura de 1809 mm (+10 mm) e altura de 1.568 mm (+1 mm). Até agora, bem parecidos. A coisa muda quando olhamos o entre-eixos de 2.770 mm, exatos 139 mm maior, reflexo das possibilidades que os motores elétricos menores e posicionados diretamente no eixo permitem para se ganhar espaço.
Mais baixo e mais leve que o ID.4, o ID.3 também tem um pacote de baterias menor, com 58 kWh, o que resulta no peso total de 1.720 kg. Isso também garante mais agilidade, fato que é notado logo de cara. Tem o mesmo motor elétrico que o irmão maior, também instalado no eixo traseiro, que garante potência de 150 kW, o equivalente a 204 cv e torque de 31,6 kgfm. De acordo com a Volkswagen, faz de 0 a 100 km/h em 7,3 segundos, números que já fazem um entusiasta de hatch se empolgar.
A boa ergonomia aliada à mesma boa qualidade construtiva, faz com que o hatch se movimente rapidamente. Ainda não é como dirigir um Golf, mas eu diria que agrada quem já foi dono de um. O centro de gravidade baixo, as grandes rodas de 20 polegadas e o bom acerto da suspensão (McPherson na frente e Multilink atrás) garantem uma pegada bem mais esportiva do que o irmão SUV, como esperado. Mesmo passando naquele asfalto lunar, chamou a atenção o conforto entregue. Faltou, no entanto, explorar a sua dinâmica em curvas e velocidades mais altas.
Piloto automático adaptativo não é novidade nenhuma, mas a Volkswagen conseguiu evoluir essa experiência. A ativação é feita como em qualquer modelo da marca, mas traz junto indicações exatas em um head-up display (presente em ambos). Nele, o carro consegue identificar se as faixas são contínuas ou tracejadas. Distância para o carro da frente e a velocidade configurada também são bem nítidas ali.
Outra novidade interessante é que este head-up display trabalham com uma espécie de realidade aumentada, indicando com gráficos, até então inéditos por aqui, as conversões a serem feitas e outros alertas. À medida que se aproxima da curva a ser feita, os gráficos vão aumentando e ficando mais fortes, praticamente dizendo "é aqui que você tem que virar". O mesmo também vale para segurança quando identifica que está saindo involuntariamente da faixa mostrando um alerta laranja no head-up junto com outro alerta virtual e sonoro, além da intervenção sutil automática do volante. Até o nome disso tudo a VW mudou: agora é Travel Assist.
A Marginal Pinheiros em São Paulo é o local ideal para testar o Travel Assist, mas seria melhor se o trajeto fosse maior, não é dona Volks? Para quem não conhece, é uma via expressa, mas que quase sempre funciona no esquema anda e para. Ou que está andando bem e para de repente. Isso é bom para testar o funcionamento do piloto automático, mesmo com os motociclistas passando no corredor entre os carros, ou para receber o alerta da frenagem de emergência quando trânsito para. Por falar nisso, o legal é que o head-up display consegue mostrar até mesmo as motos passando ao lado.
Mesmo sem a variação de marchas, tanto o ID.3 como o ID.4 trazem os modos de condução que podem ser alterados rapidamente por um botão touch ou direto na tela multimídia. Neles, as mudanças são bem perceptíveis e alteram bem os parâmetros de aceleração, direção e, consequentemente, o consumo.
Tudo depende do preço, mas se até os carros normais já estão caros, podemos imaginar como serão os preços destes elétricos. De longe, o ID.3 e ID.4 são os carros mais sofisticados e tecnológicos, não apenas da VW, mas de todo o mercado. A diferença está na "configuração" mais pacata, para prolongar o alcance das baterias, em relação aos principais rivais.
O ID.4 é o que passa a impressão de que encontraria mais pessoas dispostas a investir um bom dinheiro nele (neste momento chutamos algo a partir de R$ 350 mil). É um SUV, é chamativo, é espaçoso, tecnológico e tem uma proposta mais familiar. É o tipo de carro que o mercado quer.
Já o ID.3 é o que o entusiasta quer, pede, mas quando chega na concessionária, olha para o lado e compra o SUV. Mesmo assim, na nossa opinião, é um modelo que deve ser vendido no Brasil mesmo que seja como uma opção de volume ainda mais limitada. Com todo o pacote tecnológico que oferece, nosso chute é algo em torno entre R$ 290 mil e R$ 300 mil.
Neste momento, com os preços de carros de entrada passando dos R$ 100 mil, você pode até torcer o nariz, mas os dois carros passam a impressão de que valem a compra.
A Volkswagen ainda não sabe (ou ao menos prefere não dizer) qual dos modelos venderá por aqui e quando. O máximo que conseguimos obter é que o melhor cenário seria o lançamento apenas em 2023, o que já colocaria os nossos chutes de preços defasados.
No fim das contas, o recado da Volkswagen é esse: "apostamos no etanol, mas se o mundo todo virar elétrico, estamos preparados". Em termos de carro elétrico, estão sim.
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