Primeiras Impressões: Porsche Taycan 4S inverte o polo da diversão
Ele quer mostrar que a eletrificação também pode ser emocionante
Nunca vi tanto Tesla junto quanto em Los Angeles. Estamos na Califórnia, o estado mais eletrificado dos EUA quando o assunto é carro, onde a maioria das pessoas é tão ecofriendly que tinha até um mendigo fazendo campanha para não comerem carne... Foi este cenário, até certo ponto óbvio, que a Porsche escolheu para lançar a versão 4S do Taycan, o primeiro carro 100% elétrico da marca. Sua missão? Engolir Teslas no café da manhã.
Mas se a "Califa" já vive a eletrificação mais intensamente (há pontos de recarga em diversos cantos de L.A.), a Porsche tem no Taycan a sua forma de antecipar ao mundo como serão os carros esportivos no futuro. E isso vale para os EUA, para a Europa e, por que não, para o Brasil. O Taycan já tem lançamento marcado para nosso mercado no segundo semestre de 2020, com a pré-venda começando ainda na primeira metade do ano. E virá em todas as versões, desde esta 4S de "entrada" até a Turbo S de topo. Preços ainda não foram definidos, mas deverão ficar entre R$ 600 mil e R$ 1 milhão.
O que é?
Muito já se falou sobre o Taycan por ele ser o primeiro Porsche elétrico. Então, à essa altura você já deve saber que ele é considerado um "sedã médio" pela marca, com porte um pouco inferior ao do Panamera. Ele mede 4,96 metros de comprimento, mas, ao vivo, parece menor. Suas linhas são definitivamente Porsche, com os inconfundíveis para-lamas dianteiros mais altos que o centro do capô, faróis ligeiramente ovalados e a traseira com a lanterna bem fina que atravessa toda a largura do carro. A baixa altura e o teto curvo ajudam ao Taycan ter o menor coeficiente de arrasto (Cx) da história da Porsche, com excelentes 0,22. As rodas podem ser de 19" ou 20", como no carro avaliado por nós.
O Taycan 4S é, pelo menos até o momento, a versão de acesso do modelo (imagino que haverá um Taycan 4 mais adiante, sem o "S"). Ele tem exatamente o mesmo motor elétrico do Taycan Turbo na dianteira, mas o traseiro é um pouco menos potente. Ainda assim, o 4S entrega 530 cv de potência e 65,3 kgfm de torque na configuração de bateria normal, chegando a 571 cv e 66,3 kgfm com o pacote de bateria Performance Plus. Para efeito de comparação, o Taycan Turbo alcança os 680 cv e o Turbo S vai a incríveis 761 cv.
Mas o 4S não é só um Taycan menos potente. Ele também é mais leve (2.140 kg na versão com bateria normal, contra 2.380 kg do Turbo) e possui porta-malas maior que as versões mais potentes, com 407 litros no compartimento traseiro + 81 litros no dianteiro (no Turbo cai para 366 litros no traseiro). A autonomia pelo método WLTP é de 407 km no carro com a bateria normal e de 463 km com a bateria Performance Plus. O tempo de recarga varia de 22,5 minutos (de 5% a 80% da bateria) num carregador ultrarrápido (que testaríamos mais tarde) a 9 horas (versão com a bateria normal) numa tomada comum de 110 Volts.
Assim como no estilo, a Porsche quis replicar a "experiência 911" também na parte interna do Taycan. Por isso, o painel tem desenho bem semelhante ao do cupê, só que um pouco mais futurista. Não há instrumentos analógicos nem botões. No lugar disso, temos quatro telas (sendo uma opcional para o passageiro) e comandos sensíveis ao toque. O volante é outra peça que remete ao 911, incluindo o seletor giratório dos modos de condução. A tela do cluster é especialmente chamativa por seu formato curvo, com 16,8", e agrupa os comandos de luzes do lado esquerdo e dispositivos (controle de tração, rigidez dos amortecedores e altura da suspensão pneumática) do lado direito. No centro, a multimídia vem com tela de 10,5", enquanto no console central está o monitor de 8,4" com os comandos do ar-condicionado e outras funções. Uma cabine bem digital, mas definitivamente Porsche.
O fato de ter o conjunto de baterias (336 células interconectadas em 28 módulos) acomodado abaixo do assoalho permite ao Taycan oferecer um espaço interno bastante aproveitável, de modo que mesmo os lugares traseiros podem receber adultos sem apertos. Ponto negativo, porém, para as saídas de ar sem aletas, que não permitem direcionar o fluxo para onde você quer - elas são fixas porque, diz a Porsche, são controladas eletronicamente.
Como anda?
Impossível não lembrar do 911 ao assumir o comando do Taycan. Mas basta dar a partida (um botão à esquerda do motorista, claro) para ver que as coisas aqui são diferentes. Obviamente que não há o ronco do despertar do "6 cilindros-boxer" e parece que nada acontece. Mas logo vem a patada forte como resposta do acelerador e, opa, isso é bem Porsche.
Nosso test-drive começa pelas largas avenidas de Los Angeles e logo sinto que, apesar das mais de 2,2 toneladas da ficha técnica, o Taycan é surpreendentemente ágil para mudar de faixa e fazer rápidas transições, bem mais que o Panamera, por exemplo. A direção é leve e a suspensão tem uma esperada firmeza, mas está longe de ser dura - embora faltem na Califórnia os pisos remendados do Brasil para uma avaliação mais precisa. O fato é que estamos num Porsche muito confortável, talvez o mais confortável deles, pela soma da leveza de comandos, absorção de impactos do solo e silêncio a bordo.
As placas de limite de velocidade são um tanto exageradas (para baixo), fazendo com que qualquer pressão no acelerador se torne uma (teórica) infração de trânsito. Depois percebo que o fluxo anda num ritmo mais rápido que o dos limites e que, se você não exagerar, não vai chamar a atenção de nenhum "cop" de L.A. Como os motores elétricos não têm ronco (falarei mais adiante sobre isso), o Taycan também não atiça a acelerar, viajando civilizadamente na velocidade que você escolher. Na estrada, cravo em 85 mph (136 km/h) e vamos embora.
Mas estamos aqui para testar um Porsche, e então o caminho do GPS nos guia rumo à região das montanhas em torno de Los Angeles. É um cenário, digamos, digno de filme. O Taycan 4S azul claro (Frozen Blue) se confunde com o tom do céu enquanto mudo o modo de condução de Range (de maior autonomia) para o Sport Plus (o mais esportivo). A mudança de comportamento não é exatamente a que eu esperava (o 911 fica tão raivoso neste modo que é praticamente só para uso em pista), mas a suspensão enrijece um pouco e o silêncio da cabine é quebrado por um som de motor. Nada, porém, que tente lembrar um carro a combustão. É mais um zunido de carro do Jetsons, como no Jaguar I-Pace. Aliás, outra coisa que remeteu ao elétrico inglês foi o teto de vidro (opcional) sem forro, que escurece conforme a incidência do sol.
À esta altura, já estou acostumado com o golpe instantâneo dos 571 cv e, principalmente, dos 66,3 kgfm entregues pelos dois motores, mas então chegam as curvas e é hora de jogar o Porsche elétrico para dentro delas. O Taycan faz valer sua estratégia de peso concentrado na parte inferior (nas baterias) para ter um baixíssimo centro de gravidade, de modo que, com a rigidez dos amortecedores em Sport Plus, a inclinação da carroceria é irrisória. Além disso, a tração integral elétrica (que normalmente envia mais torque para as rodas traseiras) ajuda a equilibrar o carro, enquanto a direção é rápida e sincera o suficiente para gerar confiança. Então basta frear forte, apontar a frente e reacelerar para que o Taycan siga na rota desejada sem dramas - no máximo uma chiada dos pneus. Sentiu falta de alguma coisa? Sim, eu também: as reduções de marcha.
A Porsche optou por um curioso sistema de freios em que as pinças só mordem os discos em frenagens fortes. Antes disso, é apenas o sistema de regeneração de energia atuando, mesmo com o pedal de freio pressionado. Sabe o que é mais impressionante? Como o Taycan consegue ter um pedal firme e orgânico, (quase) como se fosse um Porsche a combustão. E freia "muuuuito", lembrando que toda a missão de conter as mais de duas toneladas do carro está no sistema de freios, pois não há freio-motor.
Isso me leva à questão da falta das reduções, que na verdade senti mais falta do que o ronco do motor. A ideia de criar atrito ao se aliviar o acelerador (como no BMW i3 e no Nissan Leaf, por exemplo) para recuperar energia talvez fosse mais interessante do que só criar esse efeito ao pisarmos no freio. De todo modo, temos um novo jeito de dirigir esportivamente. Menos emocionante, sim, mas não menos rápido. O Taycan 4S zune até os 100 km/h em 4 segundos e faz curvas com três dígitos de velocidade sem se abalar, como um legítimo Porsche.
Rápido até para recarregar
O belo pôr do sol de Los Angeles indica que nosso test-drive está chegando ao fim. Antes, porém, a Porsche programou uma parada de recarga dos carros. Foi a deixa para testarmos as estações ultrarrápidas que já existem aos montes na Califórnia. Com seu sistema elétrico de 800 Volts, o Taycan aproveita todo o potencial dessas redes. De fato, bastaram 20 minutos de pit-stop para que a bateria saltasse de 46 para 92%. E cada minuto desses custou US$ 0,99 (R$ 4,20), o que deu cerca de US$ 20 (R$ 84) para "meio tanque". Barato mesmo para os padrões dos EUA.
No Brasil a rede de recarga ainda está dando seus primeiros passos, mas já haverá algumas estações ultrarrápidas quando o Taycan chegar por aqui, no segundo semestre do ano que vem. Virá para fazer imagem e fisgar os adeptos da tecnologia, como fez a Tesla nos EUA. Tem gente que vai torcer o nariz e preferir eternamente os Porsches a combustão - talvez eu seja um deles. Mas, assim como o 911 foi trocando o motor a ar pelo a água, os motores aspirados pelos turbos e o câmbio manual pelo PDK de dupla embreagem, o Taycan adianta um futuro que pode se tornar realidade mais rápido que o acender de uma luz.
Por Daniel Messeder, de Los Angeles (EUA)
Viagem a convite da Porsche
Ficha técnica: Porsche Taycan 4S Performance Battery Plus
MOTOR | dois motores elétricos (um em cada eixo) |
POTÊNCIA/TORQUE | 571 cv; 66,3 kgfm |
TRANSMISSÃO | automática de 1 velocidade no eixo dianteiro; automática de 2 velocidades no eixo traseiro, com tração integral elétrica |
SUSPENSÃO | independente double wishbone na dianteira e multilink na traseira |
RODAS E PNEUS | alumínio aro 20" com pneus 245/45 R20 (frente) e 285/40 R20 (atrás) |
FREIOS | discos ventilados na dianteira (360 mm) e traseira (358 mm), com ABS e ESP |
PESO | 2.220 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 4.963 mm, largura 1.966 mm, altura 1.379 mm, entre-eixos 2.900 mm |
CAPACIDADES | porta-malas: 407 + 81 litros |
PREÇO | R$ 600.000 (estimado versão com bateria normal) |
Galeria: Avaliação: Porsche Taycan 4S
RECOMENDADO PARA VOCÊ
Carro da Xiaomi acaba de destruir um recorde da Porsche
Motorhome elétrico: já fizeram uma Kombi home a bateria
A Porsche levou um ano para desenvolver essa cor
Reino Unido: Mini Cooper foi o mais vendido em novembro
Porsche Taycan Turbo GT foi feito "às escondidas"; entenda
Ferrari 250 GTO (1962-1964), a mais perfeita tradução da casa de Maranello
Porsche confirma que já começou a desenvolver próxima geração do Taycan