Nunca se vendeu tanto carro automático no Brasil quanto em 2018. De acordo com um estudo da Bright Consulting, no ano passado os modelos automáticos representaram 49% das vendas de carros novos no país, sendo que em 2019 esse número deverá superar o de carros manuais pela primeira vez na história. Além da óbvia busca do consumidor por maior conforto, também colaborou para este crescimento o lançamento de carros automáticos mais acessíveis, como o VW Gol e o Ford Ka.
Diante desta demanda crescente, nós do Motor1.com decidimos fazer uma reportagem dedicada aos tipos de transmissão automática oferecidos nos carros compactos - ainda o segmento mais importante do mercado nacional. Para isso escalamos o carro mais vendido do Brasil, o Chevrolet Onix, com a transmissão GF6 de 6 marchas, e o Toyota Yaris hatch, que trouxe para o segmento de compactos o câmbio CVT do Corolla, com simulação de 7 marchas.
Nossa ideia inicial era ter também o Fiat Argo GSR como representante dos automatizados de embreagem simples, mas a montadora alegou não ter mais o modelo disponível em sua frota de imprensa - o que reforça os rumores de que ele será substituído pelo automático convencional na linha 2020. Consideramos substituí-lo por um dos modelos I-Motion da Volkswagen, como Fox ou Up!, mas a fabricante também não tem mais estes modelos na frota. Por fim, o único compacto de dupla embreagem oferecido no Brasil, o Ford Fiesta, deixou de ser fabricado há alguns meses em decorrência de problemas justamente no câmbio automatizado Powershift.
O que você vê agora, portanto, não é um comparativo entre o Onix e o Yaris. Até porque estamos falando de carros de categorias distintas, sendo o Toyota significativamente maior, mais equipado e mais caro. A questão aqui é analisar os dois diferentes tipos de transmissões automáticas, suas vantagens e desvantagens, quando aplicadas em carros urbanos com motores aspirados de baixa cilindrada em termos de conforto, desempenho, consumo e manutenção.
Antes de falar das transmissões, é preciso dizer que os motores da Chevrolet e Toyota também são distintos na construção e recursos. O 1.3 do Yaris é mais moderno, com bloco de alumínio, duplo comando variável e 16 válvulas, enquanto o do Onix ainda emprega bloco de ferro, comando simples e 8 válvulas. No entanto, o GM faz valer sua maior litragem (1.389 contra 1.329 cm3) e as últimas modificações feitas pela engenharia da marca norte-americana para ter rendimento até superior em potência e torque: 106 cv e 13,9 kgfm contra 101 cv e 12,9 kgfm do Toyota, ambos abastecidos com etanol. Além de ter um pouco mais de força, o hatch da Chevrolet também é mais leve, pesando 1.042 kg ante 1.125 kg do japonês.
O Onix ganhou câmbio automático na linha 2014 com a caixa GF6 vinda dos modelos Cruze, Cobalt e Spin, porém já em sua segunda geração. Com relações específicas para o hatch, de modo a aproveitar melhor a força do motor 1.4, a transmissão trazia como novidade as trocas mais ágeis - 0,5 s nas ascendentes e 0,7 s nas reduções.
Equipada com o sistema adaptativo de trocas de marcha, que "aprende" com o jeito de dirigir do motorista, ela tem ainda o recurso do freio-motor, que mantém a marcha engatada mesmo quando se alivia o acelerador, para melhor controle do veículo. Também é possível fazer trocas manuais colocando a alavanca na posição M e passando a efetuar as mudanças pelos botões + e - na lateral da própria alavanca.
O Yaris usa a plataforma do Etios, mas representa um grande avanço na transmissão. Em vez de aproveitar a antiga caixa de 4 marchas do irmão mais barato, o novato emprega o CVT do Corolla. É um câmbio que já elogiamos diversas vezes no Corolla, por ser mais rápido e menos entendiante do que, por exemplo, o CVT da arquirrival Honda. Por não ter marchas definidas, esta transmissão extrai sempre o melhor do motor de acordo com a situação, tanto para desempenho quanto para consumo.
De acordo com Maurício Carreiro, especialista em transmissões automáticas da TTR Treinamentos, de São Bernardo do Campo (SP), o câmbio 6T30 (GF6) da Chevrolet pertence a uma família que começou a ser usada em 2008 pela GM no mundo. "Trata-se de uma caixa de médio torque, compacta e com soluções que propiciam trocas de marcha suaves, além de suportar com bastante segurança veículos com motorização até 1.8 litro. Uma das vantagens dela é ser bastante compacta, ideal para o uso em carros pequenos como o Onix, uma vez que possui conversor de torque hiperelíptico, que melhora o aproveitamento de espaço no cofre do motor, e o conjunto eletrônico ser incorporado ao cárter frontal da transmissão, também reduzindo seu tamanho".
Ainda segundo Carreiro, "é uma caixa bastante conhecida dos reparadores, mas tinha algumas falhas prematuras: era comum a quebra do disco mola do tambor de embreagem da 3/5/Ré, bem como dos defletores internos de plástico, que não suportam a temperatura e acabam fragmentados em pequenos pedaços, entupindo o filtro e causando falha na alimentação/lubrificação da caixa, imobilizando o veículo", explica. No entanto, de acordo com o especialista, a partir de 2016 a GM fez mudanças no projeto e minimizou o risco destas falhas.
Passando à caixa da Toyota, o especialista conta que seu conceito é bem diferente por se tratar de uma transmissão continuamente variável (CVT). Também considerada de médio torque, ela tem como vantagem a capacidade de transmitir ao eixo de saída a mesma condição do motor, sem escalonamentos que geram perda de potência. "Uma transmissão CVT tem relação de desmultiplicação que gera diversas possibilidades de atuação. Sua construção é baseada em dois cones e uma correia metálica onde acontece a transmissão de torque. Esses cones são variáveis de forma proporcional e harmônica, ou seja, enquanto um se fecha levando a correia mais ao topo, o outro se abre deixando a correia deslizar até a parte mais baixa do cone, fazendo assim a desmultiplicação", detalha Carreiro.
A transmissão K112 que equipa o Yaris vem com sistema de mudanças manuais que proporciona 7 "marchas", isto é, sete posições pré-determinadas para os cones. Diferentemente do modelo da GM, o módulo de controle não está incorporado à transmissão.
"Também conhecida dos reparadores, esta caixa tem como principal motivo de manutenção os rolamentos de apoio dos cones. A falha ocorre por acúmulo de micropartículas de aço do desgaste da correia e dos cones. Casos de travamentos de solenoides de controle também já foram reportados. O fluido da transmissão deve ser trocado a cada 40 mil km para minimizar os efeitos destas micropartículas", recomenda o instrutor.
Embora tenha um conjunto mecânico mais antigo, o Onix consegue bom equilíbrio entre desempenho, conforto e consumo. Isso porque o motor 1.4 entrega 90% de seu torque a partir de 2.300 rpm, fazendo que a transmissão possa realizar mudanças com o motor em baixo giro. Isso reduz o gasto de combustível e faz com que as trocas de marcha sejam mais suaves. Já a sexta marcha garante que o propulsor precise girar menos em velocidades de viagem, resultando num ótimo consumo rodoviário: 12,5 km/l com etanol.
Mesmo sendo mais leve e potente, porém, o hatch da GM andou menos que o da Toyota. Isso porque, em virtude das mudanças de marcha (que não são das mais rápidas, diga-se de passagem), o carro perde um pouco de pique se comparado ao Yaris. Enquanto o Onix precisa encher o motor algumas vezes (em cada marcha), o rival "trava" o giro do motor lá em cima e acelera com a potência máxima, numa condição ideal (porém barulhenta). O resultado foi de 12 segundos cravados para o Yaris na prova de 0 a 100 km/h, contra 12,6 s do Onix.
Nas retomadas, tivemos situação semelhante. Ao passo que o GM precisa reduzir uma marcha, esticá-la e fazer a troca, o Toyota simplesmente reduz a relação, sobe o giro e fica lá em cima até a velocidade desejada. De 80 a 120 km/h, por exemplo, o Yaris levou 8,8 segundos, ou 1 segundo a menos que o Onix. Parece pouco em tempo, mas pode significar a diferença entre uma ultrapassagem tranquila e uma mais arriscada. Lembrando, novamente, que o Toyota é mais fraco e mais pesado - ou seja, mérito da transmissão.
Mais uma vantagem do Yaris aparece no uso do modo manual do câmbio. Além das trocas feitas pela própria alavanca (para frente + e para trás -), método bem mais prático que os botõezinhos do Onix, as mudanças são muito mais rápidas. Isso porque basta ao CVT "escorregar" para a posição desejada, enquanto o automático do GM precisa reduzir ou aumentar uma relação. Para completar, a transmissão continuamente variável proporciona uma condução lisa, sem qualquer solavanco, como a aceleração de um metrô.
Decepção no Toyota ficou por conta do consumo na estrada, situação que na teoria seria favorável ao CVT por deixar o motor trabalhando em giro menor. Acontece que o Yaris tem menos torque e, para manter a velocidade, ele acaba exigindo mais do propulsor quando pinta um aclive, por exemplo. Fez média de 10,7 km/litro com etanol. Já na cidade houve praticamente um empate, com 7,9 km/litro para o Onix e 8 km/litro para o Yaris.
Mais moderna e eficiente, a transmissão CVT do Yaris mostrou superioridade em relação à GF6 do Onix, principalmente por fazer o Toyota andar mais que o Chevrolet mesmo sendo menos potente e mais pesado, além de ser inigualável no conforto. O antigo problema da monotonia dos CVTs foi em grande parte resolvido pela simulação de marchas, no caso, as 7 posições do Yaris. O modo manual do Toyota também é mais rápido e efetivo que o da Chevrolet.
A questão é que o Onix e seu câmbio automático tradicional são bem mais acessíveis. Ou seja, na relação custo-benefício, o conjunto da Chevrolet acaba levando a melhor, pois além de mais barato para comprar ainda foi superior no consumo. Enquanto que o AT convencional da GM pode ser adquirido a partir de R$ 54.990 no Onix Advantage, o CVT mais em conta da Toyota, no Yaris XL 1.3, não sai por menos de R$ 67.090.
Fotos: Paulo Henrique Trindade
Chevrolet Onix 1.4 AT | Toyota Yaris 1.3 CVT | |
MOTOR | dianteiro, transversal, 4 cilindros, 8 válvulas, 1.389 cm3, comando simples, flex | dianteiro, transversal, 4 cilindros em linha, 1.329 cc, 16 válvulas, duplo comando variável, flex |
POTÊNCIA/TORQUE | 98/106 cv a 6.000 rpm / 13/13,9 kgfm a 4.800 rpm | 94/101 cv a 5.600 rpm; 12,5/12,9 kgfm a 4.000 rpm |
TRANSMISSÃO | automática de 6 marchas; tração dianteira | CVT com simulação de 7 marchas, tração dianteira |
SUSPENSÃO |
independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
RODAS E PNEUS | liga-leve aro 15" com pneus 185/65 R15 | alumínio aro 15" com pneus 185/60 R15 |
FREIOS | discos ventilados na dianteira e tambor na traseira com ABS e EBD | discos ventilados na dianteira e tambores na traseira, com ABS |
PESO | 1.042 kg em ordem de marcha | 1.125 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 3.933 mm, largura 1.705 mm, altura 1.476 mm, entre-eixos 2.528 mm | comprimento 4.145 mm, largura 1.730 mm, altura 1.490 mm, entre-eixos 2.550 mm |
CAPACIDADES | tanque 54 litros; porta-malas 280 litros | tanque 45 litros, porta-malas 310 litros |
PREÇO |
R$ 64.390 (versão LTZ avaliada) |
R$ 71.790 (versão XL Plus Tech avaliada) |
MEDIÇÕES MOTOR1 BR | |||
---|---|---|---|
Onix 1.4 AT | Yaris 1.3 CVT | ||
Aceleração | |||
0 a 60 km/h | 5,3 s | 5,7 s | |
0 a 80 km/h | 8,5 s |
8,4 s |
|
0 a 100 km/h | 12,6 s | 12,0 s | |
Retomada | |||
40 a 100 km/h em D | 9,3 s | 9,0 s | |
80 a 120 km/h em D | 9,8 s | 8,8 s | |
Frenagem | |||
100 km/h a 0 | 43,8 m | 42,6 m | |
80 km/h a 0 | 27,1 m | 27,4 m | |
60 km/h a 0 |
15,0 m |
15,5 m | |
Consumo | |||
Ciclo cidade | 7,9 km/l | 8,0 km/l | |
Ciclo estrada | 12,5 km/l |
10,7 km/l |
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