A Ford sabe que o primeiro Territory não foi um sucesso de vendas. Primeiro, chegou em um momento turbulento da marca por aqui, quando ela mudava seu papel de montadora para importadora. Segundo, o próprio Territory não tinha o DNA que se esperava da marca e, justamente neste momento, não era o carro ideal para colocar nas ruas. O resultado é que ele durou pouco mais de três anos nas lojas e pouco visto pelas ruas.
Chega a ser estranho chamar este novo SUV de Territory, de tanto que mudou. Não só visualmente, mas esse novo Territory tem bem mais o DNA da marca, inclusive a participação da engenharia brasileira neste projeto, mesmo que ainda produzido na China e em parceria com uma empresa de lá. Mas o maior acerto está em seu posicionamento de preço por um pacote de equipamentos bem completo. Vale os R$ 209.990 nesta versão única?
Lembro do saudoso Daniel Messeder falando do antigo Territory. Pouco remetia a qualquer modelo da marca em design e em elementos do acabamento ou do sistema multimídia, mas não era um SUV para se ignorar, já que tinha um bom espaço interno e um acabamento até melhor que os outros Ford tradicionais naquele ponto. Por outro lado, devia em desempenho com seu 1.5 turbo de 150 cv e 22,9 kgfm de torque ligado ao câmbio CVT, focado em consumo.
Este novo mudou tanto que, na China, chama Equator Sport. É outro carro, literalmente, este sim feito em um conjunto global de engenharia da Ford, inclusive do Brasil, em conjunto com a Jiangling Motors, a mesma empresa chinesa responsável pelo Territory anterior e que ainda existe por lá. Por isso que este novo Territory tem mais elementos que nos levam a outros SUVs da Ford globalmente, como o Kuga, apesar de ainda ver algumas linhas genéricas principalmente nas laterais.
Além do visual, que não sobrou nada do anterior, as dimensões do novo Ford Territory também estão diferentes. O SUV cresceu, indo de 4.580 mm para 4.630 mm de comprimento (+50 mm), sendo 10 mm a mais no entreeixos (2.726 mm), além dos 1.935 mm de largura e 1.706 mm de altura. Como referência, o Jeep Compass tem 4.404 mm de comprimento e 2.636 mm de entre-eixos.
Outra mudança foi o conjunto de motor e câmbio. O novo Ford Territory ainda tem um motor 1.5 turbo que não é o mesmo 1.5 turbo que a Ford usa nos Estados Unidos no Bronco Sport, por exemplo, mas sim uma boa evolução do seu motor anterior. Apesar de usar o mesmo bloco, ele troca o conjunto de comandos variáveis e vai do ciclo Miller, mais focado em eficiência, para o Otto, mais desempenho. O resultado é que ele vai aos 169 cv (19 cv a mais) e 25,5 kgfm de torque, 2,6 kgfm a mais, e trocou o câmbio CVT por um automatizado de dupla embreagem (banhado a óleo) com 7 marchas.
Fato que as marcas chinesas ganharam muito ao ter essa parceria com as montadoras mais experientes. Em montagem e qualidade de materiais e acabamentos, o Territory passa despercebido do grande público, que só vai descobrir a origem do produto se alguém contar. Chega a ser bem melhor do que a Ford fazia aqui no Brasil com EcoSport quando ainda nascia em Camaçari (BA), tanto em montagem quanto em materiais.
O acabamento do interior é muito bom. Material suave ao toque está nas portas e no painel, que nesse tom azul, pode não combinar com algumas cores da carroceria - e não há outra opção, ao menos por enquanto. Há uma imitação de madeira, algum cromado e preto brilhante, tudo em boa quantidade para não passar a sensação de exageros. Porém...
Entendo que as marcas gostaram de algo que a Mercedes-Benz criou, com a peça única que abriga as duas telas do painel e multimídia (cada uma com 12,3"), mas vamos com calma, meu amigos designers. No caso do Territory, até o conjunto de chave de seta e seletor do limpadores lembram os da Mercedes-Benz, não as peças que encontramos nos Ford, como o Bronco Sport.
No sistema multimídia, um bom software. É rápido, com espelhamentos sem fios para Apple CarPlay e Android Auto, mas é um software diferente do que encontramos na Ranger e Bronco Sport, mostrando mais uma vez alguns pontos que são bons, mas não totalmente Ford, e talvez um pouco genérico. Para mudar o modo de condução, arraste a tela da esquerda para a direita, mas não se o espelhamento estiver ativo. Como já reclamei em GWM Haval H6 e BYD Song Plus, a insistência de deixar os comandos na tela atrapalha o uso. A temperatura do ar-condicionado, por exemplo, você precisa sair do espelhamento e trocar a temperatura na tela inicial.
Há os botões físicos abaixo para a velocidade da ventilação e o acionamento do modo automático, mas poderia ter o de temperatura para facilitar mudar algo tão comum de ajustar no dia a dia. O seletor do câmbio é semelhante aos demais Ford, rotativo, e mais abaixo há um conjunto de botões para o freio de estacionamento, autohold, sistema de estacionamento automático e start-stop. Mais abaixo, alguns controles para o sistema multimídia, como volume e home. Teria espaço para o seletor do modo de condução físico ali.
Um dia, esse título foi o Ka. Essa mudança de posicionamento da marca precisava trazer, desde o começo, um produto como esse Territory para justificar isso. Sim, é bem melhor que o seu antecessor com o mesmo nome, mas não um Bronco Sport. Como ele cresceu, o espaço interno é um ponto em que este Territory pode ganhar compradores com famílias. Os bancos são confortáveis na medida certa, mas o grande destaque fica para o espaço no banco traseiro, que também recebe saídas de ar-condicionado e uma porta de recarga USB. E cabem 448 litros no porta-malas, que tem abertura elétrica, que só não é maior pela presença do estepe logo abaixo.
Mas não adiantaria nada fazer um carro bom bom acabamento e amplo espaço interno se fosse ruim ao dirigir, principalmente um modelo de marca tradicional. Este novo motor 1.5 turbo, mais potente, é competente para levar os 1.705 kg do Territory mesmo carregado. Percebemos o comportamento característico de um câmbio de dupla embreagem nas arrancadas e manobras, que é diferente de uma caixa automática com conversor de torque, mas as trocas são suaves, colaborando para o conforto do SUV.
Fez bem a engenharia brasileira colocar as mãos neste projeto. É perceptível um cuidado com a suspensão, ajustada para suportar nosso asfalto com as rodas de 19", bastante focada no conforto. A direção elétrica poderia ter mais peso, ou ser menos artificial, algo que ainda vem da origem chinesa, mas é algo melhor do que encontramos em um Caoa Chery, por exemplo. A parte de buchas e componentes não reclamam do trabalho e estão bem dimensionados para o Territory e sua proposta urbana.
O consumo está dentro do esperado para um carro deste peso. Foram 8,8 km/litro na cidade e 12 km/litro na estrada, preço que se paga por 169 cv em mais de 2 toneladas de um SUV com rodas de 19". O seletor de modos de condução varia entre o Normal, Eco, Esportivo e um Serra/Colina, que trabalha o câmbio e respostas do motor para esse tipo de estrada, em subida e com curvas. O desempenho, aliás, é bom: 10,6 segundos no 0 a 100 km/h e na faixa dos 7 segundos nas retomadas.
Mas o grande destaque deste Territory, além de como ele evoluiu do anterior, é seu posicionamento de preço: por R$ 209.990, tem os assistentes de condução (que não são os mais recentes do mercado, mas fazem seu serviço), teto-solar panorâmico, chave presencial, faróis em LEDs, dupla tela no painel, porta-malas elétrico e um bom espaço interno e acabamento cobrando menos que um Jeep Compass Limited, menos equipado que isso, e que pode colocar uma dúvida na cabeça do comprador do GWM Haval H6 HEV.
Se o Territory ainda é um SUV chinês, há bem mais do DNA Ford nessa geração. Tem competitividade no segmento, amplo espaço interno, bom acabamento e um bom conjunto de motor e câmbio para ajudar a Ford a ganhar terreno nesta faixa. Ao mesmo tempo, não ameaça o Bronco Sport, um projeto ainda mais moderno, mas mais caro e não tão espaçoso.
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
Ford Territory 1.5T
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