Dirigir do Alasca (EUA) a Ushuaia (Argentina) atualmente é moleza e todo dia há algum viajante pegando a estrada... Mas ir de carro do Polo Norte magnético, no Ártico, ao Polo Sul, na Antártida, é algo que jamais foi feito. Eis que o casal britânico Chris e Julie Ramsey não só está em vias de concluir essa aventura inédita, como escolheu um automóvel elétrico para vencer os 27 mil quilômetros de um percurso que passa por 14 países.
Sim: um carro elétrico, daqueles que te deixariam tenso ao planejar um fim de semana na casa de praia, é o primeiro veículo da história a encarar uma viagem rodoviária de um Polo ao outro do planeta.
- Fazer uma viagem tão longa com um carro elétrico exige muito planejamento. Por outro lado, esses carros não têm muito o que quebrar e dispensam cuidados especiais para enfrentar o gelo. Além disso, podem ser recarregados em qualquer casa que tenha luz elétrica - diz Julie que, juntamente com o marido, já fez um rali entre a Escócia (onde mora o casal) e a Mongólia dirigindo um Nissan Leaf (no vídeo no final deste texto). Foram 16 mil quilômetros em 56 dias ao volante do hatch elétrico, em 2017.
A versão usada na viagem é a mais potente, com 394 cv, e tem a maior bateria da linha, de 87 kWh
O modelo usado na épica viagem "Pole to Pole" é um Nissan Ariya, um crossover japonês 100% elétrico (como referência, esse Nissan tem o porte aproximado de um Honda CR-V). O Ariya dos aventureiros chama um bocado de atenção por seus enormes pneus tipo tundra, feitos para vencer gelo fofo ou lagos gelados, além dos arcos dos para-lamas aumentados e alargados. Fora isso, não houve modificações técnicas sequer na bateria, de 87 kWh. Encontramos o simpático casal de viajantes numa parada em Santiago, no Chile.
- É uma viagem que exige muita concentração para dirigir o carro elétrico de forma a render o máximo de autonomia, especialmente nas regiões onde há poucos pontos de recarga. É usar as descidas para regenerar energia e atuar muito no câmbio, sempre aproveitando as características do relevo. O cérebro não para! - explica Chris, que trabalhava na indústria de óleo e gás e hoje se dedica a aventuras com veículos elétricos.
O Ariya parece um brinquedão com seus enormes pneus e a barraca no teto
Antes de tudo, é preciso paciência. Até agora, seu recorde de distância entre recargas foi de 328 km, no Equador. Em países com fartura de pontos para reabastecimento, como Canadá, EUA, Guatemala, Costa Rica e Chile, não há tanta preocupação com autonomia e é possível "descer o pé" no acelerador. Já em regiões mais remotas, a velocidade de cruzeiro fica em torno de 70 a 80 km/h.
Tampouco há tanta pressa: a partida foi em março (verão no Hemisfério Norte) e a expedição deve durar 9 meses. Se tudo correr conforme o previsto, eles devem chegar ao Polo Sul em meados de dezembro - será verão no Hemisfério Sul, a melhor época do ano para seres humanos sobreviverem aos rigores da Antártida.
O mapa com o percurso vai pintado nas laterais
Até agora, o único momento em que Chris e Julie necessitaram de uma equipe de apoio foi para chegar ao Polo Norte magnético (ponto de convergência das linhas do campo magnético que envolvem o planeta). Tal ponto é variável, chegando a mover-se 41 quilômetros por ano.
Não se pode ir até lá sozinho - é preciso contratar uma equipe de apoio formada por especialistas em expedições no Ártico, com picapes e caminhões a diesel. Eles levam o assunto muito a sério e usam satélites não apenas para localização como também para calcular a espessura do gelo.
Havia uma pedra no meio do caminho
A distância do Polo Norte magnético até Cambridge Bay, o povoado mais próximo, no Canadá, é de cerca de 400 km para ir e outros tantos para voltar. Para economizar energia, nossos aventureiros sequer ligaram a calefação. Foi como dirigir em um freezer.
- Levamos um painel solar e uma pequena turbina eólica para recarga das baterias mas, justamente naqueles dias, o vento parou completamente. Foi desapontador depender de um gerador a combustão para fazer essa parte do percurso - lamenta Julie.
Esse e4OFRCE indica a tração integral
A tração integral e-4ORCE do Nissan Ariya, que tem um motor em cada eixo e potência combinada de 394 cv (com torque de 61 kgfm), deu conta de vencer a neve fofa, algumas vezes com gelo até a metade das rodas. Para eventuais dificuldades, foram instalados na dianteira três robustos pontos para reboque.
Quem também cumpriu um papel fundamental nessa missão foram os pneus de tundra BF Goodrich All Terrain T/A 39x13.50 R17, muito largos e de baixíssima pressão. Seu desempenho foi tão bom que a dupla de viajantes decidiu mantê-los pela viagem inteira.
Os largos pneus de tundra estão sendo usados também no asfalto
- Ia dar muita mão de obra, além de ser caro demais, arranjar um jogo de pneus para asfalto e despachar os de tundra para a Antártida. Viemos com esses mesmos - justifica Julie.
- Eles fazem ruído e dobram mais nas curvas, mas é só ter isso em mente. Até agora, só tivemos um furo. Foi no Equador - relata Chris.
A viagem é feita sem pressa e o casal normalmente percorre entre 200 e 260 km por dia
Fora a situação radical no Ártico, eles nunca mais dependeram de um motor a combustão para chegar onde queriam.
- É ótimo. Vamos conhecendo pessoas pelo caminho. Às vezes, além da tomada, nos oferecem pernoite e até máquina de lavar - diz Julie.
Em um dia típico, o casal percorre algo entre 200 e 260 quilômetros, vai cuidar dos afazeres e, durante a noite, deixa o carro recarregando a bateria.
- Não há muito tempo para descanso. Quando paramos de dirigir, temos que responder e-mails, dar entrevistas e cuidar das próximas etapas da viagem. Só em lugares com boa estrutura pra recarga é que conseguimos relaxar mais um pouco, passeando - diz Chris. - Temos uma barraca no teto e algumas vezes dormimos no carro, mas é muito mais agradável dormir em um hotel.
A ideia é chegar ao Polo Sul em meados de dezembro, já no verão
Até agora as temperaturas já foram de -30ºC a +30ºC, e o Ariya não apresentou qualquer defeito. Seu interior, aliás, é surpreendente limpo para um carro que está metido em tamanha viagem.
De Puerto Montt, no extremo Sul do Chile, o carro será transportado de avião até a Antártida. A Nissan tem ajudado na logística dos transportes.
Daí serão mais uns mil quilômetros de gelo para chegar ao Polo Sul - com o devido apoio de um grupo especializado nesse tipo de turismo. Depois, é só voltar...
- Rimos, choramos, discutimos... Sobreviver a tudo isso e continuarmos casados é o desafio - brinca Chris. - Em 120 anos de expedições polares, ninguém tentou uma viagem Polo a Polo dessas, mas nós estamos fazendo com um carro elétrico, vendo o que funciona e o que não funciona.
Parada no Chile para uma coletiva de imprensa
- O que tentamos demonstrar é maior do que nossa vida de casal. Mostramos ao mundo que, havendo pontos de recarga, é possível chegar a qualquer parte do mundo com um carro elétrico, do frio polar às florestas úmidas das florestas sul-americanas - resume Julie.
Os resultados já começam a aparecer. Emil Grimsson, diretor da Arctic Trucks, empresa que vem dando suporte ao casal Ramsey nos Polos, já pensa em eletrificar parte de sua frota, reduzindo as emissões e as preocupações com lubrificação do motor em baixíssimas temperaturas.
E, assim, nossos aventureiros vão abrindo caminhos e refazendo rotas do explorador polar norueguês Roald Amundsen (1872-1928) - agora sem tantos percalços e no silêncio de um carro elétrico.
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