Em 17 de abril de 1960, faltando apenas quatro dias para a inauguração da nova capital do Brasil, os jornais cariocas publicaram um anúncio com apelo tentador (na imagem acima). Era da agência de automóveis Cassio Muniz:
"Troque seu Volkswagen comum por um modelo esporte"
Ali, discretamente, estava nascendo a indústria brasileira dos esportivos fora de série.
Desde as primeiras décadas do século XX, já tínhamos encarroçadores para satisfazer os ricaços que queriam automóveis diferentes de todos os outros. Eram, contudo, modelos "one-off", exclusivos e feitos por encomenda, com chassi geralmente fornecido pelo próprio interessado.
Já o conversível vendido pela Cassio Muniz estava disponível para pronta-entrega e era fabricado em pequenas quantidades, usando o Fusca como base. O curioso é que, ao ser lançado, o carro sequer tinha nome. De início, a loja o anunciava como "Volkswagen carroçaria Sport". Somente alguns meses depois da apresentação é que o modelo foi batizado de Brasília - afinal, a capital recém-construída era o grande assunto do momento. Boa escolha, tanto que dali a 13 anos a VW faria imenso sucesso ao lançar um compacto homônimo!
Uma reportagem publicada no Jornal do Brasil de 21 de agosto de 1960 explicava que o Brasília era montado pela empresa Carroçaria Sport Ltda, localizada na Rua Honório 419, em Todos os Santos, bairro do Méier. A direção industrial ficava a cargo de Varo Manetti, técnico italiano oriundo da Pietro Gemesio - pioneira encarroçadora de carros de passeio em Petrópolis.
Nada no Brasília era de fibra de vidro... A roupa nova desse Volks especial era quase que inteiramente de alumínio e aço. Tal receita já era usada por pequenos encarroçadores da Alemanha, como a Rometsch e a Beutler, que devem ter inspirado Manetti.
O conversível nacional mantinha o entre-eixos original do Fusca (2,40 m). Mais do que isso, suas "formas aerodinâmicas" da carroceria deixavam o esportivo carioca 31 cm mais longo e 6 cm mais largo que o besouro.
Havia versões de dois ou quatro lugares, com capota de lona ou de alumínio (o de quatro lugares vinha unicamente com o teto de alumínio, que era desmontável). O carro era oferecido em cinco cores básicas, com diversas combinações entre elas. A pedida favorita na época era carroceria verde com capota preta. Um destaque era o painel, cujas formas adiantaram em 13 anos o que se veria no VW 1303, o Super Beetle alemão.
Os construtores afirmavam com otimismo que, por sua menor resistência ao ar, o Brasília podia alcançar os 150 km/h "com vento pela cauda". Vale lembrar que o VW 1200 original da época atingia a máxima de modestos 110 km/h com seu motorzinho de 36 cv (SAE).
O preço era alto. Em agosto de 1960, um Brasília zero-quilômetro pronto custava Cr$ 1,19 milhão (com financiamento pela própria Cassio Muniz S.A.) - era o dobro do valor de um Fusquinha novo. O esportivo custava mais até que o Simca Chambord, nosso carro mais caro na época. Havia ainda a opção de o comprador levar um VW doador de chassi e mecânica, o que baixava o custo para R$ 380 mil.
Do início da produção até agosto de 1960, 23 exemplares já haviam sido construídos. Estima-se que, no total, aproximadamente 50 exemplares foram fabricados - destes sabe-se da existência de pelo menos um sobrevivente em bom estado.
Dois anos após o lançamento do fuoriserie Brasília, contudo, a Volkswagen pôs no mercado o Karmann-Ghia nacional. Mais um pouco e a Willys começou a vender o Interlagos, que tinha uma versão conversível. O Brasília deixou de fazer sentido - mas há que se reconhecer seu pioneirismo entre os fora de série brasileiros com motor VW "a ar".
Antes mesmo da abertura do II Salão do Automóvel de SP, em 1961, já se falava na apresentação de um conversível especial, desenhado no Brasil, equipado com chassi e motor DKW-Vemag. Como grande inovação trazia carroceria de fibra de vidro (ou "carroceria de plástico", como se dizia na época). Foi o primeiro carro nacional construído com fiberglass, já que o Willys Interlagos só seria mostrado aqui no ano seguinte.
O protótipo nacional não ficou pronto a tempo da inauguração do Salão de 61 e só apareceu no Ibirapuera no dia do encerramento da exposição. Projetado por Roberto Eugenio Stieler, o modelo fora de série era um produto da Moldex Indústria e Comércio, que já fabricava a lancha Alvorada, também de fibra. Apresentado como "uma bossa da engenharia brasileira", o carro quase foi batizado de Copacabana. No fim, recebeu o singelo nome de MB (sigla de Moldex Brasil ou Mecânica Brasileira, dependendo de quem conta).
As linhas angulosas não guardavam qualquer semelhança com DKW-Vemag nacionais. Com jeitão de esportivo italiano, o modelo tinha quatro lugares e tração dianteira, com alavanca de câmbio no assoalho. Pelos planos iniciais, a Moldex Brasil faria um carro por semana, passando a dois logo em seguida. Em pouco tempo, a produção deveria chegar a quinze unidades mensais.
Tais planos da fábrica foram reiteradamente adiados mas, no III Salão, em 1962 (na época, a mostra era anual), havia dois Moldex expostos. Traziam modificações em relação ao primeiro protótipo. Já se falava até que o carro seria produzido em parceria com a DKW-Vemag, tanto que esteve exposto ao lado dos Belcar, Vemaguet e Candango. A Vemag, contudo, tinha como prioridade produzir o elegante cupê Fissore.
“Os dois Moldex MB apresentados são muito bem acabados e de linhas agradáveis. O carro é um conversível que dispõe de uma capota rígida facilmente acoplável. O motor dois tempos de três cilindros e os elementos mecânicos são do DKW-1000”, descreveu o texto publicado no jornal O Globo de 26 de novembro de 1962.
Apesar de muito elogiado pelo público e pela crítica — e de ter sido chamado de “Thunderbird brasileiro” pelo jornalista automotivo americano Jim Whipple, da “Popular Mechanics” — o MB parou por aí. Após ter feito uns poucos carros artesanalmente, a Moldex preferiu se concentrar na produção de lanchas e catamarãs.
Talvez a empresa tenha se precipitado nessa desistência... Em 1964, Rino Malzoni, um fazendeiro de Matão (SP), lançou o GT Malzoni, esportivo que também usava mecânica DKW e carroceria de fibra de vidro. Em 1967, o Malzoni deu origem ao Puma. A partir daí, por mais de uma década, os fora de série brasileiros tiveram seu período de ouro - enquanto os pioneiros Brasília e Moldex foram quase que completamente esquecidos.
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