A cena é comum a quase todos os domingos ensolarados nas estradas paulistas: uma legião de motos de grande porte sai da capital em direção a alguns destinos que ficam de duas a três horas do ponto de partida. Em termos gerais são big trails ou estradeiras, apesar de o primeiro grupo estar se sobressaindo sobre o outro nos últimos anos.
Motos aventureiras passaram quase imunes aos tempos de pandemia, com vendas praticamente estáveis - e estamos falando de modelos que costumam sair por mais R$ 70 mil. Uma olhada mais atenta no grupo de aventureiros de final de semana mostra o que os números de vendas já sugerem: a BMW R 1250 GS é a preferida do bando, seja na configuração de entrada ou na Adventure, mais completa.
Nos destinos, que variam de shoppings pitorescos instalados sobre as rodovias a postos de gasolina com uma estrutura um pouco melhor, as baias de estacionamento para motocicletas parecem um pátio de concessionária da BMW, com modelos da linha GS de várias cores e anos contrastando com uma ou outra Triumph Tiger e um ocasional grupo de esportivas. Mas nada de lama nos pneus, no máximo as marcas de uma chuva pelo caminho.
Algo tem que justificar tamanha preferência. A R 1250 GS é a big trail mais vendida do Brasil, tendo acumulado mais de 3.621 unidades comercializadas em 2021 até agora. Isso representa mais de 22% do segmento inteiro das big trails. O preço, que varia entre R$ 103.500 e R$ 122.500, não é o atrativo, nem a capacidade de cruzar continentes exóticos. Então qual é o segredo?
Para desvendar esse segredo, escolhemos a BMW R 1250 GS Adventure Premium 40 Years. Assim, é possível ter uma ideia de tudo o que essa icônica aventureira nascida para as areias do rali Paris-Dakar pode oferecer no uso mais recreativo. Equipada como a das fotos, a moto está saindo por R$ 122.500, já incluso o valor de frete.
Começando do começo: o que ela traz?
Com mais de 40 anos de história, a linha GS da BMW tem um legado a honrar. Esse é um dos motivos de R 1250 GS atual ainda manter a "especialidade da casa" bávara: o motor de dois cilindros contrapostos. Hoje, ele tem 1.254 cm³ de capacidade, arrefecimento líquido e comando de válvulas variável. Com isso, é capaz de entregar 136 cv de potência a 7.750 rpm e 14,6 kgfm de torque a 6.250 rpm. Além do ronco encorpado que é quase uma assinatura da moto, a entrega de torque é bastante linear e pode ser modulada por meio dos modos de condução.
Outra característica pela qual a linha GS é conhecida é a transmissão final por eixo cardã. Além da manutenção menor do que uma de corrente, sua carcaça ainda serve como componente estrutural para o quadro elástico traseiro. Por isso que de um lado da moto você enxerga um braço, enquanto o outro tem apenas a roda exposta. O câmbio é mecânico de seis velocidades e a embreagem tem acionamento hidráulico. Na versão testada, o quickshifter é de série.
O chassi também é único na BMW. O motor centraliza as fixações tanto das suspensões quanto do subchassi traseiro. Os amortecedores possuem ajuste eletrônico, mas o mais interessante e a configuração dianteira. Há um garfo dianteiro, mas ele serve apenas de guia para o curso da roda. O trabalho de amortecimento é feito por uma peça central, apoiada em um braço triangular de alumínio fundido, sistema que a marca batizou de Paralever.
As rodas da versão Adventure testada têm raios que se apoiam em lábios externos, permitindo a instalação de pneus sem câmara. Possuem 19 polegadas de diâmetro na dianteira e 17 polegadas na traseira, calçadas por pneus de medidas 120/70 e 170/60, respectivamente. O sistema de freios possui discos duplos na dianteira com 305 mm de diâmetro e único na traseira de 276 mm.
Nas medidas, a moto tem 2,27 metros de comprimento, 0,98 m de largura e a altura é de 1,46 m sem contar os espelhos e o para-brisa ajustável. O entre-eixos tem 1,50 m e o assento está a 890 mm de altura em relação ao solo. O tanque é de 30 litros na versão Adventure, contra 20 litros na convencional. Isso contribui para os 268 kg de peso em ordem de marcha da moto.
Além do tanque menor, a versão de entrada da R 1250 GS também conta com rodas de liga leve, mais apropriadas para o asfalto. A Adventure também agrega protetores de mão, motor e tanque, além de pedaleiras maiores. O esquema de pintura mesclando preto e amarelo é encontrado apenas em conjunto com o pacote Premium.
Assim, a BMW R 1250 GS Adventure Premium 40 Years traz de série manetes ajustáveis, assistente de partida em rampa, cavalete central, tomada USB, controle de tração, iluminação completa de LED, 3 modos de condução, para-brisa ajustável, painel digital com tela TFT, chave presencial, suporte para bagageiros (laterais e superior), acendimento automático do farol e do farol alto, faróis auxiliares de LED, monitoramento da pressão dos pneus, aquecimento de manoplas e assentos, modos de condução PRO e piloto automático. Com a pintura especial de 40 anos, a moto também traz tampas de cabeçote especiais, as Option 719, serviço de customização da marca.
Selvagem em cativeiro
Para quem nunca esteve perto de uma big trail de mais de 1.000 cm³, o tamanho e o peso da BMW R 1250 GS Adventure assustam. A moto ocupa praticamente uma vaga de carro no estacionamento e exige planejamento para subir e tirá-la do pedal de descanso lateral. Usei a moto dois dias seguidos na cidade, indo e voltando da redação. Definitivamente não é a praia dela. A moto é larga e corredores são quase proibitivos por conta dos cabeçotes deitados para fora do chassi.
Se você está olhando a GS como um veículo de uso diário, vai se estressar. E também receber umas multas de velocidade. A moto só passa qualquer impressão de velocidade acima de 100 km/h. Crédito da boa proteção que as carenagens fornecem e da suavidade de operação do bicilíndrico da BMW.
Outro elogio vai para os engenheiros da marca. Uma vez posta em movimento, a moto aparenta perder uns 100 kg e começa a dançar entre os carros com facilidade. Para a cidade, recomendo o modo Rain de condução, que deixa as respostas mais amenizadas e a moto mais na mão. A parte de boa de andar com uma moto pensada para ralis em nossas ruas é que a suspensão é extremamente confortável.
Se alguém perguntasse, a minha rua tinha acabado de ser recapeada com perfeição, apesar de os buracos ainda estarem lá. Uma vantagem do sistema Paralever é que a moto não apresenta mergulho (compressão da suspensão dianteira) mesmo em frenagens fortes, aumentando a sensação de segurança.
Entendendo que a cidade realmente não é o lugar de uma R 1250 GS, precisei refazer o roteiro que os proprietários fazem. Saindo em um domingo de manhã chuvoso em direção a Santa Bárbara d'Oeste cruzei com diversos grupo de 4 a 5 motos, sempre com ao menos uma GS 1250 no meio. Estava no caminho certo.
É na estrada que a moto abre as asas. Finalmente pude usar o modo Road, que nem é o mais agressivo, em paz. Engatei a sexta, liguei o piloto automático e comecei a entender o charme que a maior das GS exerce sobre os motociclistas. Ao contrário dos carros, uma moto que mantém 120 km/h facilmente não é tão comum, muito menos de maneira confortável.
Exceto pelo ruído de vento no capacete, eu parecia estar pilotando numa bolha, onde nada poderia me atazanar. A proteção que a GS Adventure oferece é tão grande que, mesmo embaixo de chuva, cheguei apenas com os antebraços molhados e o resto do corpo seco ao meu destino. Mesmo contando ida e volta - e depois de quatro horas, nada de dores ou incômodos no corpo de ficar parado na mesma posição. Se você quiser, é possível rodar mais de 400 km sem abastecer, graças ao tanque maior.
O grande estalo veio na parada em Santa Bárbara. Lá notei que mesmo donos de outras GS olhavam para essa unidade, pintada de preto e amarelo, como algo especial. E ela é mesmo, a combinação de cores ornou bem com a moto. Lá também vi diversos grupos de amigos que somente gostam de andar de moto, possuem a grana para bancar um passeio confortável, mas ainda com a emoção de estar sobre duas rodas.
Quem embarca nessa ideia, aprecia uma boa engenharia e as soluções únicas de motor, chassi e suspensão que só a BMW oferece - e não a usará como um meio de transporte somente. Além disso, mesmo que não seu use a R 1250 GS em plena capacidade 100% do tempo, é sempre bom saber do que ela é capaz. Não é todo dia que se vai ao Atacama, mas é bom contar com uma moto que pode fazer isso com as mãos nas costas, mesmo que seja só para ir tomar um café mais longe.
Fotos: Thiago Moreno (para o Motor1.com)
Ficha técnica: BMW R 1250 GS Adventure 40 Years
Comprimento | 2270 mm |
Largura | 980 mm |
Altura | 1460 mm |
Altura do assento | 890mm |
Peso em ordem de marcha | 268 kg |
Suspensão dianteira | Sistema Paralever, amortecedor único, ajuste eletrônico, 210 mm e curso |
Suspensão traseira | Único, regulagem de pré-carga, ajuste eletrônico, 220 mm de curso |
Freio dianteiro | Dois discos, 305 mm de diâmetro, ABS |
Freio traseiro | Disco, 276 mm de diâmetro, ABS |
Roda dianteira | Raiada, 19 polegadas |
Roda traseira | Raiada, 17 polegadas |
Pneu dianteiro | 120/70 - 19 |
Pneu traseiro | 170/60 - 17 |
Preço | R$ 122.500 |