O Onix não estava nem no papel quando a Kia revelou pela primeira vez as intenções de trazer o compacto Rio ao Brasil. Isso aconteceu no começo dos anos 2000, época em que a Chevrolet se preparava para lançar por aqui a segunda geração do Corsa (terceira em termos globais). De lá para cá muita água passou embaixo desta ponte, com tempo de a GM matar o Corsa (o nome hoje é da PSA, que comprou a Opel), lançar o Agile, enterrar o Agile, lançar o Onix e então, no ano passado, apresentar a segunda geração do hatch que se tornou o líder de vendas no país.
O Rio também evoluiu, mas do outro lado do mundo. Ao contrário do GM, que foi trocando de nome e projeto, o compacto da Kia seguiu com a nomenclatura que faz homenagem à Cidade Maravilhosa. Mais perto do Brasil (passou a ser fabricado no México em 2017), o hatch enfim chegou ao nosso mercado no começo deste ano, determinado a buscar seu lugar ao sol num segmento cheio de (bons) pretendentes - incluindo seu primo de projeto, o Hyundai HB20.
Para sabermos com qual força o Rio desemboca no Brasil (eu não podia perder esse trocadilho), escalamos o Onix como rival para a estreia. Reunimos as versões topo de linha, Rio EX (R$ 78.990) e Onix Premier (R$ 74.790), para um comparativo completo e destrinchamos o duelo a seguir.
Rio e Onix acompanharam a tendência de crescimento dos hatches compactos, de modo que o Kia tem entre-eixos de 2,58 m (maior da categoria) e o Chevrolet mede 4,16 m (mais longo do segmento). São medidas que até alguns anos atrás correspondiam a modelos médios, como o Golf MK4.
Isso deu aos novos compactos a possibilidade de ser o único carro casa e não fazer feio ao levar a família ou fazer as compras do mês. Tanto o modelo nacional quanto o mexicano levam quatro adultos de 1,80 m sem grandes restrições, sendo o Rio um pouco melhor no espaço para as pernas e o Onix um pouco melhor nos ombros. Já no porta-malas o Kia vence com certa facilidade: 325 litros (novo campeão da categoria, batendo o Sandero e seus 320 litros) contra 275 litros do Chevrolet, embora visualmente o compartimento do Onix pareça maior do que sugere sua ficha técnica.
A superioridade do Rio também se dá no conforto, com bancos mais aconchegantes e de espuma mais espessa, além do revestimento mais agradável ao toque (o "couro" do Kia engana bem melhor como pele, enquanto o Chevrolet deixa claro ser sintético). Ambos contam com bom ângulo de abertura das portas e práticas alavancas para o ajuste de altura do banco do motorista, mas só o Onix ajusta o volante em altura e profundidade (só altura no Rio). O mexicano é melhor no espaço para pertences, com um porta-objetos maior à frente da alavanca de câmbio (onde fica o carregador de celular por indução no GM) e porta-copos mais bem-definidos ao lado do freio de mão.
Os principais comandos estão bem localizados nos dois carros, tendo o Kia como ponto forte o tamanho e a clareza dos botões, além das portas USB e 12V bem destacadas abaixo da ventilação. No Chevrolet, os comandos do ar-condicionado poderiam ficar um pouco mais acima, mas nada que desabone o bom projeto de cabine do Onix.
Vantagem: Rio
Um item deixa bem clara a proposta de cada carro nos quesitos acima: porta USB traseira. Enquanto o Onix traz duas, o Rio tem uma só, mas a do Kia tem tampinha e é iluminada. Ou seja, o hatch nacional oferece mais coisas, mas o coreano é mais refinado. Isso pode ser observado em diversos aspectos da cabine, como a qualidade dos materiais utilizados no acabamento e arremates. Embora empregue plástico rígido no painel e portas, o Rio não aparenta ser simples ou barato, de modo que não encontramos rebarbas ou peças desalinhadas. O mesmo não pode ser dito do Onix, que basicamente manteve o nível de acabamento do modelo anterior. Seus plásticos são mais simples e suscetíveis a riscos, enquanto o tato de componentes como comandos dos vidros elétricos, botões do ar-condicionado e mesmo o revestimento do volante e do pomo do câmbio são menos agradáveis que os do Kia.
O bem estar a bordo do Rio, porém, poderia ser completo caso ele trouxesse alguns dos mimos que a Chevrolet oferece no Onix, tais como internet a bordo (via chip 4G com mensalidade), carregador de celular sem fio, sensores de estacionamento dianteiro e traseiro, sistema de estacionamento automático e partida por botão, além da chave presencial. Só o Chevrolet também vem com o útil alerta de ponto cego na capa dos retrovisores externos.
Controles de tração e estabilidade, sistema de monitoramento da pressão dos pneus e câmera de ré são itens de série nos dois, mas o GM vem com 6 airbags (frontais, laterais e de cortina) e o Kia se limita aos frontais obrigatórios. Um item interessante do Rio é o farol com luz de assistência de manobra, que acende mais uma lâmpada correspondente ao lado para o qual o o volante está girando. Os dois trazem LEDs para iluminação diurna, sendo que no Kia no recurso fica dentro do próprio farol e no GM é uma faixa na parte inferior do para-choque - que, aliás, elimina os faróis de neblina, uma falta sentida em viagens noturnas.
As centrais multimídia são equivalentes em tamanho (tela de 7") e facilidade de uso, ambas com uma interface rápida e conexões Apple CarPlay e Android Auto. A do Kia tem grafismo mais refinado, que combina com os do quadro de instrumentos, mas a da GM inverte o jogo ao oferecer a internet a bordo. Já a telinha de LCD no centro do quadro de instrumentos é simples nos dois carros, deixando a desejar para rivais que trazem telas maiores e coloridas. Falha boba no Rio e em todos os Kia com motor flex é a ausência do consumo médio e instantâneo no computador de bordo.
Com o Rio melhor no acabamento e o Onix nos equipamentos, aqui temos um empate.
Vantagem: empate
Se o Onix resistiu aos motores de 3-cilindros até esta segunda geração, agora ele só vem equipado com propulsores do tipo - nesta caso, um 1.0 turbo. Já a Kia bem que quis trazer o Rio com o 1.0 turbo de 3 cilindros e injeção direta do HB20, mas a Hyundai barrou. Restou ao hatch aproveitar o 1.6 já conhecido de outros modelos do grupo, como o próprio HB20 e o Creta em suas versões intermediárias. Tem quatro cilindros e é aspirado, mas é um dos melhores da classe, com duplo comando variável (admissão e escape) e saudáveis 130 cv de potência no etanol - mais que os 116 cv. Só que o torque de 16,5 kgfm demora para aparecer (4.500 rpm), enquanto o turbinado tricilíndrico da GM entrega 16,8 kgfm logo cedo (2.000 rpm). Essa diferença fica clara ao volante.
O Rio acelera de modo uniforme e sem "vazios", mas sua inércia é um pouco maior que a do HB20, parecendo um pouco pesado até embalar. Já o Onix tem um claro "lag" abaixo de 2 mil giros, mas depois disso ganha fôlego superior ao do rival, deixando o Rio para trás sem dificuldades tanto nas acelerações quanto nas retomadas - 0 a 100 km/h em 10,9 contra 11,9 segundos e 80 a 120 km/h em 7,0 contra 7,9 segundos. Melhor para o coreano no câmbio, que tem trocas sempre suaves (o do GM é bom, mas suas mudanças são mais perceptíveis) e modo esportivo, além de aceitar mudanças pela própria alavanca. No GM, as trocas manuais só são habilitadas quando a alavanca está em L (Low, para reduções) e, feitas por botões na alavanca, desestimulam o uso do recurso.
A dinâmica do Onix casa melhor com o motor turbo, tendo uma direção mais direta e uma suspensão firme, além de rodas maiores (16 x 15") e pneus mais largos (195/55 contra 185/65), que deixam o hatch da GM "animadinho" em trechos sinuosos. No Rio é notório o acerto mais voltado ao conforto, com uma suspensão bem calibrada entre suavidade e estabilidade, passando mais macio sobre lombadas e defeitos da pista em geral - sem abrir mão de um bom controle nas curvas, no entanto. O mesmo vale para a direção, um pouco menos comunicativa, e para o ruído interno, bastante reduzido. Também é melhor nas vibrações, ajudado pelo motor de 4 cilindros - os blocos de 3 cilindros são naturalmente mais "vibrantes", embora o da GM não seja dos piores neste sentido.
O cilindro a menos e a litragem menor fazem diferença no consumo a favor do Chevrolet, e por margem superior a 1 km/litro tanto na cidade quanto na estrada, com etanol. No trânsito urbano, o Rio estica um pouco mais as marchas para embalar, mas, na rodovia, ambos rodam com giro baixo a maior parte do tempo. Em sexta marcha, cravam 2.500 rpm a 120 km/h.
Vantagem: Onix
Embora não pague Imposto de Importação por vir do México (que tem acordo comercial com o Brasil), a Kia ainda tem a barreira do dólar alto (acima dos R$ 4,4) para conseguir precificar o Rio de forma competitiva no Brasil. Para chegar a uma equação positiva, a marca coreana cortou alguns equipamentos (difícil bater o Onix em recheio) e ainda assim ficou mais caro que o rival: R$ 78.990 na versão EX, tendo ainda mais R$ 1.600 de pintura metálica ou R$ 2.300 de perolizada. Em compensação, a garantia é de 5 anos, contra 3 da Chevrolet.
Também com pacote de itens fechado, a versão Premier do Onix começa em R$ 74.790, tendo acréscimo de R$ 700 na cor branca (sólida) ou R$ 1.590 nas metálicas - menos preto e laranja, sem cobrança adicional. Com uma rede maior, a Chevrolet também cobra menos na hora das revisões, com uma vantagem de cerca de R$ 400 nas três primeiras manutenções, conforme mostra o quadro abaixo.
1ª REVISÃO | 2ª REVISÃO | 3ª REVISÃO | TOTAL | |
Kia Rio 1.6 | R$ 512,77 | R$ 687,68 | R$ 512,77 | R$ 1.713,22 |
Chevrolet Onix 1.0 T | R$ 280,00 | R$ 564,00 | R$ 468,00 | R$ 1.312,00 |
Vantagem: Onix
Fosse no começo dos anos 2000 ou agora, a Kia não tem pretensões de entrar na briga dos hatches mais vendidos do país. Pelo contrário, com volume pequeno, a ideia é ser uma opção diferenciada em relação a Onix, HB20, Ka e cia. Neste comparativo, o Rio mostrou exatamente isso: é uma alternativa válida ao Onix, principalmente para quem prioriza conforto e acabamento em vez de desempenho ou equipamentos. E deve conquistar alguns fãs, especialmente entre aqueles que não curtiram o novo visual do HB20 ou os que desejam não ter o mesmo carro do vizinho.
No cômputo geral, porém, é difícil bater o Onix. O hatch compacto da GM oferece bom espaço, boa relação entre desempenho e consumo, dinâmica interessante e um pacote de equipamentos sem igual na categoria a um preço, digamos, justo. Segue como o carro a ser batido no segmento.
Fotos: autor/Motor1.com
Chevrolet Onix Premier | Kia Rio EX | |
MOTOR | dianteiro, transversal, três cilindros, 12 válvulas, 999 cm3, comando duplo variável, turbo, flex |
dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, 1.591 cm3, duplo comando variável, flex |
POTÊNCIA/TORQUE | 116 cv a 5.500 rpm; 16,3/16,8 kgfm a 2.000 rpm | 123/130 cv a 6.000 rpm; 16,0/16,5 kgfm a 4.500 rpm |
TRANSMISSÃO | câmbio automático de 6 marchas; tração dianteira | câmbio automático de 6 marchas; tração dianteira |
SUSPENSÃO |
independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
RODAS E PNEUS | liga-leve aro 16" com pneus 195/55 R16 | liga leve aro 15" com pneus 185/65 R15 |
FREIOS | discos ventilados na dianteira e tambores na traseira, com ABS e ESP | discos ventilados na dianteira e tambores na traseira, com ABS e ESP |
PESO | 1.113 kg em ordem de marcha | 1.141 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 4.163 mm, largura 1.731 mm, altura 1.476 mm, entre-eixos 2.551 mm | comprimento 4.065 mm, largura 1.725 mm, altura 1.450 mm, entre-eixos 2.580 mm |
CAPACIDADES | tanque 44 litros, porta-malas 275 litros | tanque 45 litros, porta-malas 325 litros |
PREÇO |
R$ 74.790 (como testado R$ 76.380) |
R$ 78.990 (como testado R$ 81.290) |
MEDIÇÕES MOTOR1 BR | |||
---|---|---|---|
Onix 1.0T AT | RIO AT | ||
Aceleração | |||
0 a 60 km/h |
5,1 s |
5,3 s | |
0 a 80 km/h | 7,8 s |
8,1 s |
|
0 a 100 km/h | 10,9 s | 11,9 s | |
Retomada | |||
40 a 100 km/h em D | 7,4 s | 8,8 s | |
80 a 120 km/h em D | 7,0 s | 7,9 s | |
Frenagem | |||
100 km/h a 0 | 36,2 m | 40,6 m | |
80 km/h a 0 | 22,6 m | 24,7 m | |
60 km/h a 0 |
12,9 m |
13,7 m | |
Consumo | |||
Ciclo cidade | 8,2 km/l | 7,2 km/l | |
Ciclo estrada | 12,3 km/l |
11,0 km/l |
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