Há muita discussão em torno do futuro do automóvel, a começar pela sua forma de propulsão. Alguns defendem que o caminho é o híbrido, que usa o motor elétrico acoplado ao motor a combustão para reduzir consumo e emissões sem perder a autonomia. Já os mais ousados investem direto no 100% elétrico, como no caso da Jaguar. A marca inglesa tem no novo I-Pace a sua principal aposta dos últimos anos, um verdadeiro divisor de águas na história da empresa.
Crossover elétrico com dois motores, um em cada eixo, o I-Pace chega ao Brasil com diversos prêmios na bagagem, incluindo de Carro do Ano global, o melhor carro verde e o melhor design. Isso já dá uma boa ideia do que estamos prestes a conhecer, e mostra o comprometimento da JLR (Jaguar Land Rover) com o mercado nacional, já que o I-Pace é o primeiro modelo 100% elétrico de alto luxo à venda no país. O preço, claro, é para poucos, pois estamos falando de um Jaguar que traz as mais recentes tecnologias. Parte de R$ 437.000, mas as primeiras unidades virão com um pacote de opcionais que inclui teto panorâmico eletrocrômico, rodas aro 20" e um sistema que permite rodar alguns aplicativos de celular na multimídia, por R$ 449.150.
Vamos então dar uma volta no futuro? Ou melhor, no novo presente?
Feito a partir de uma folha em branco, o I-Pace nasce sobre uma plataforma exclusiva para ele, e já totalmente pensada para a eletrificação. O assoalho é quase todo dedicado a uma imensa bateria de íon de lítio com capacidade para 90 kWh, formada por 432 células. Ela é a responsável por resolver uma das preocupações principais dos elétricos, ao menos em parte: autonomia. A Jaguar divulga que, pelo método europeu (WLTP), o crossover é capaz de rodar até 470 km com uma carga. Na prática, a filial brasileira fez um teste interessante: saiu da capital paulista até Juquehy, no litoral norte do Estado (destino muito comum de fim de semana dos paulistanos) e voltou com apenas uma carga. Foram 312 km rodados, e ainda chegaram de volta à São Paulo com 19% de carga na bateria.
E olha que o I-Pace é um crossover esportivo, ou seja, não tem como prioridade economizar energia. Prova disso é que seus dois motores elétricos, um posicionado em cada eixo, rendem nada menos que 400 cv de potência e 71 kgfm de torque instantâneos. E não precisa de eixo cardã e nem de um câmbio com diversas marchas. Cada motor toca suas duas rodas, fazendo uma tração integral elétrica controlada eletronicamente.
Mais uma coisa legal: sem necessidade de espaço para motor a combustão, sistema de escape e outros componentes, o I-Pace consegue ter uma carroceria dinâmica, eficiente e, ao mesmo tempo, espaçosa. Para se ter ideia, ele tem o centro de gravidade 13 cm mais baixo que o F-Pace, o SUV tradicional da Jaguar. Assim, consegue um perfil esguio que garante um coeficiente aerodinâmico (Cx) de apenas 0,29, o melhor da classe - embora ele esteja muito mais para um hatch bombado do que para um SUV. Crossover é mesmo a melhor definição para o I-Pace.
A cabine encanta pelo desenho e acabamento refinado, com uma excelente posição de dirigir (mais baixa que em um SUV, mais alta que num sedã), um volante de ótima pegada e um console central vazado com amplo espaço para pertences. O câmbio de 1 marcha é acionado por botões físicos, enquanto a maioria dos comandos é feita por toques em telas, como no primo a combustão Range Rover Velar. São três telas no interior, sendo uma de 12" para o cluster (que muda o estilo conforme o modo de pilotagem), uma de 10" para a multimídia e uma de 5" somente para o sistema de ar-condicionado. Tudo isso se reflete num ambiente clean e refinado, como pede a nova tendência do luxo.
Uma vez lá dentro, é impossível não reparar no enorme teto panorâmico de vidro, que surpreende por não ter forro. Como assim? O vidro é eletrocrômico, ou seja, escurece sozinho conforme a incidência solar. Também promete filtrar o calor, mas não impede que o vidro fique quente - o que certamente vai forçar o ar-condicionado, que vai forçar a bateria... O espaço é muito bom para até quatro ocupantes, com bancos confortáveis, e um grande porta-malas para 656 litros - mais um compartimento de 27 litros na frente.
Interessante também comentar uma sacada de design com objetivo dinâmico. Repare que, apesar de elétrico, o I-Pace tem a tradicional grade dianteira da marca, de grandes dimensões. A parte superior dela é aberta e suga o ar que depois sai por um extrator no capô, melhorando o fluxo de ar sobre a carroceria e ainda criando downforce na dianteira. Bacana, não? Hora de acelerar.
Exceto pelos motores elétricos, o I-Pace tem uma configuração de esportivo tradicional. A divisão de peso é equilibrada entre os eixos (50/50), a suspensão é independente nos dois eixos (double wishbone na dianteira e multibraços na traseira) e os freios a disco ventilados são de grandes dimensões (350 mm na dianteira e 325 mm na traseira). Você ainda pode escolher alguns comportamentos do carro, como o sistema creep (se ele sai andando ao se soltar o freio, como num automático a combustão), o freio motor (na verdade o freio regenerativo) e até o ronco do motor. Como assim ronco? A Jaguar preparou um som bem legal para ecoar na cabine enquanto você acelera, para dar emoção. Mas você também pode optar pelo silêncio total.
Comecei minhas voltas pelo autódromo Velo Città no modo normal para sentir a resposta do motor elétrico. E ela é forte, amplificada pelo torque instantâneo. Então a tocada acaba sendo diferente de um carro a combustão. Não há marcha para reduzir e ajudar a entrar mais confiante nas curvas, apenas o "freio motor" que ajuda a conter a velocidade junto com os freios. Na verdade esse recurso é mais útil na cidade, uma vez que permite que você quase não use o pedal do freio. É só desacelerar que o carro já vai parando.
Logo nas primeiras curvas deu para notar como o I-Pace é equilibrado. Embora ele seja pesado (2.208 kg), a frente é bastante precisa e não arrasta mesmo em velocidades acima da ideal. Graças ao conjunto de baterias no assoalho, o peso do carro fica lá em baixo, e isso contribui para uma rolagem mínima da carroceria. A direção também é precisa e, embora não seja das mais comunicativas, permite perceber o quanto os pneus estão desgarrando.
Nas voltas seguintes abusei mais. Coloquei no modo Dynamic de condução e a resposta do acelerador ficou ainda mais séria - pancada na nuca mesmo. A Jaguar fala numa aceleração de 0 a 100 km/h em apenas 4,8 segundos, com máxima de 200 km/h, e não tenho porque duvidar desses números. Entrando nas curvas com mais vontade, percebi que o I-Pace escorrega de lado, até com alguma saidinha da traseira para apimentar a condução. Também curti os freios, que ao menos na pista não se mostraram do tipo "liga-desliga" como na maioria dos carros eletrificados, além de terem uma pegada forte para conter as 2,2 toneladas vindo embaladas.
Ah, e o ronco... É algo simulado, claro, mas parece uma versão supersônica do carrinho do Jetsons. Eu gostei, e imagino que pegar uma estrada passando os outros carros com esse barulho deve realmente dar a ideia de que o futuro chegou. E ele é divertido, felizmente.
Falei o preço lá no começo para não empolgar com o carro e desanimar com os valores. Mas o fato é que a tecnologia custa caro, e mais ainda quando ela vem embalada pela Jaguar. O I-Pace de R$ 450 mil não custaria muito menos que isso se tivesse motor a combustão, por conta de seu acabamento, potência e equipamentos. O pacote de itens de série inclui piloto automático adaptativo, assistente de ponto cego e auxílio de estacionamento 360 graus, além da multimídia com Apple Car Play e Android Auto. Uma funcionalidade bacana do sistema é o GPS que mostra o raio de alcance da bateria, ou seja, indica até onde dá para ir antes de carregar.
E por falar em carregar, o I-Pace vem de fábrica com um carregador padrão de 7 kW, pensado para deixar o carro carregando à noite: ele é capaz de 100% de carga em 12,9 horas numa tomada 220V. Como acessório, no entanto, a Jaguar vai oferecer um carregador rápido para residências, além de um carregador de corrente contínua em suas concessionárias e pontos de recarga específicos. Com capacidade de 100 kWh, retoma 80% da bateria em apenas 40 minutos.
Em termos de pós-venda, o I-Pace tem garantia de 5 anos e todas as revisões desse período já incluídas no preço do carro, além da assistência 24h da marca. Para a bateria, a garantia é de 8 anos ou 160 mil km, sendo que ao final do período a marca garante no mínimo 70% de capacidade de recarga.
Em resumo, o futuro está aí batendo à nossa porta. Pena que no começo seja apenas para poucos abonados.
Fotos: divulgação
MOTOR | dois motores elétricos permanentes, um por eixo; bateria de 90 kWh |
POTÊNCIA/TORQUE |
400 cv combinados; 71 kgfm combinados |
TRANSMISSÃO | Transmissão de marcha única, tração integral elétrica |
SUSPENSÃO | independente Double Wishbone na dianteira e multilink na traseira |
RODAS E PNEUS | liga-leve aro 20" com pneus 245/50 R20 |
FREIOS | discos ventilados nas quatro rodas (350 mm e 325 mm respectivamente), com ABS e ESP |
PESO | 2.208 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 4.682 mm, largura 2.011 mm, altura 1.565 mm, entre-eixos 2.990 mm |
CAPACIDADES | porta-malas 656 litros (+ 27 litros na dianteira) |
PREÇO | R$ 437.000 |
RECOMENDADO PARA VOCÊ
Jaguar vai tirar quase todos os seus carros de linha este ano
Projeto de Lei propõe regularização do mototáxi
Teste: Jaguar I-Pace e o processo de eletrificação no Brasil
Marca britânica Jaguar deixa de vender carros no Reino Unido
Jaguar I-Pace SVR é confirmado como SUV esportivo elétrico
Brasil quer equipar 33% dos eletrificados com baterias nacionais até 2033
Comparativo Jaguar I-Pace Vs. Tesla Model X: O futuro é agora