Iniciamos um novo ano. Depois de forte ressaca no mercado automotivo brasileiro, a esperança é de que as coisas definitivamente melhorem. A indústria voltou a crescer, e as vendas também. Mas 2018 deve entrar para a história por conta de uma evolução mais profunda: a chegada do Chevrolet Bolt, o primeiro carro elétrico de uma das quatro grandes montadoras a ser vendido no Brasil. Eleito o Carro do Ano nos EUA, ele foi prometido para o nosso mercado pelo presidente da GM do Brasil. Quer saber como anda? Então confira com a gente como foi dirigi-lo por mais de 200 km nos arredores de Detroit.
Falamos em futuro, mas o carro elétrico já é uma realidade. Gosto de lembrar que algumas revoluções chegam, impactam e depois conquistam o mercado de tal maneira que é impossível regredir. Quer ver? Vamos tomar como exemplo o lançamento da primeira geração do iPhone pela Apple lá em 2007. O mercado era dominado pelos inquebráveis Nokias, pela sofisticação do celular de flip da Motorola, o StarTac, ou pelos funcionais Palms e Blackberrys. Mas Steve Jobs foi preciso: lançou o primeiro smartphone com tela multi-toque que dispensava botões físicos. Era caríssimo. Um ano depois chegava o primeiro smartphone com o sistema do Google, o Android, com a promessa de popularizar a tecnologia. Basta olhar para trás e ver a história. Hoje, dificilmente alguém compra celular sem uma bela tela. E há opções em todas as faixas de preços. Vejo o carro elétrico desta mesma forma.
Totalmente elétrico, o Bolt é impulsionado por um motor que gera 203 cv e um generoso torque 36,7 kgfm. Sabe o que significa? Que ele é capaz de acelerar como um Golf GTI, partindo da imobilidade a até 100 km/h em cerca de 7 segundos. Com uma carga completa, a autonomia chega a 383 km, garantida pelo conjunto de baterias de 60 kW fornecido pela sul-coreana LG.
O visual é bacana. A identidade da Chevrolet está presente em todos os lados e não nega semelhanças com modelos conhecidos dos brasileiros, como o Cruze e o Equinox. Isso quer dizer que o Bolt é como um carro normal, ele não tem exageros de estilo só porque é elétrico. A única coisa diferente são as grades dianteiras fechadas, restando apenas uma entrada de ar na parte inferior do para-choque. Partindo dos faróis, um friso em preto brilhante se abre, acomodando as janelas, e fecha na coluna C. A traseira se inspira o Volt e usa vidro em boa parte da tampa do porta-malas, dando assim o estilo de carro elétrico ao hatch.
Por dentro o espaço é muito generoso e o ambiente, apesar de comum, tem ambiente sofisticado por conta do painel totalmente digital e bem colorido, junto com a tela de 10,2 polegadas na parte central. Nela, há o sistema de gerenciamento do carro e a nova geração do MyLink. O restante é o que já conhecemos. Ajuste de altura do banco do motorista, regulagem de profundidade e altura do volante, acionamento dos vidros elétricos e ar-condicionado nas posições onde já estamos acostumados. Mesmo ajustando os bancos dianteiros para pessoas com mais de 1,80 m, há bom espaço para as pernas no banco traseiro.
Acho que vocês já perceberam que até aqui, tudo normal, então, vamos ao que interessa. Hora de girar a chave, ou melhor, apertar o botão. Quem nunca dirigiu um carro com propulsão elétrica vai achar estranho não ouvir ruído de motor. Para saber se está ligado, tem que dar uma espiada no painel. Um bom indicador da carga da bateria é perfeitamente visível, assim com a autonomia disponível em quilômetros. Você também pode acessar mais informações sobre o uso do conjunto elétrico na tela do sistema multimídia. Outro item que nem precisava existir num carro elétrico, mas está lá, é a alavanca do câmbio com as tradicionais posições D, N, P e R. Basta acionar a posição D e desativar o freio de estacionamento elétrico. Pronto, vamos rodar.
Partindo da sede mundial da General Motors, começo a guiar pelas largas avenidas do centro moderno de Detroit. Uma área bem cuidada, com asfalto liso e trânsito moderado. O Bolt começa a se movimentar silenciosamente, ficando presente apenas o ruído dos pneus verdes da Michelin. A primeira sensação é de muita agilidade. A segunda é de boa estabilidade. Semáforos e reduções de velocidade ajudam na tentativa de simular um trânsito parecido com o do Brasil. O que mais me chamou a atenção é que o Bolt não passa aquela impressão de um carro que se arrasta. O posicionamento das baterias no assoalho, fruto de sua plataforma completamente pensada para um carro elétrico, mostra os resultados. O Bolt é ágil, equilibrado e muito bom de guiar na cidade.
Ao se afastar do centro, entramos em vias de velocidades mais elevadas e com algumas imperfeições no asfalto. Sim, lá também tem isso. Bom que deu para notar que a suspensão consegue filtrar bem as irregularidades, sem dar aquelas batidas secas. Nas rodovias, conduzindo na velocidade máxima permitida, o Bolt se mostrou estável. Retomadas de 80 km/h a 110 km/h são extremamente rápidas. A agilidade para trocar de faixa também impressiona e, se não fosse pelo seu tamanho que mais parece o de uma minivan, poderia dizer que estava em um carro esportivo. O segredo está na entrega do torque a zero, ou seja, o motor elétrico não precisa elevar a rotação para entregar sua força. A diversão está sempre disponível.
O que também chama a atenção é a dirigibilidade geral do carro. Você consegue fazer curvas rápidas, pois a direção elétrica vai ganhando peso adequado com a velocidade e a carroceria tem inclinação aceitável. Inclina, mas aos poucos. Os freios dão conta de segurar os mais de 1.600 kg. Por falar em freios, é possível dirigir o Bolt usando apenas o pedal acelerador. Ao aliviar a pressão no pedal, o carro vai automaticamente reduzindo a velocidade. Para potencializar a frenagem sem pedal, basta usar uma haste atrás do volante. No entanto, ao vir de uma velocidade mais elevada, não tem jeito, é preciso pisar no pedal do freio. E para enviar uma forcinha extra para as baterias, também conta com freios regenerativos.
Outro item bacana é a possibilidade de usar o retrovisor interno com imagens geradas pela câmera traseira. Com visão grande-angular, tem ainda a ajuda de sensores para visão panorâmica de 180º para auxiliar nas manobras de estacionamento.
Foram mais de 200 quilômetros percorridos tranquilamente. A todo momento, você tem a informação de autonomia disponível. Em termos gerais, você não percebe diferença para um carro convencional, a não ser a força imediata. No entanto, o que você tem de mudar é a sua forma de usar o carro planejando o percurso. Para uso no dia a dia, que é principal foco, dificilmente a carga da bateria será esgotada completamente. Qual a quilometragem que você percorre diariamente? Desconte isso da capacidade total e você terá uma carga residual que precisa apenas ser complementada.
Para a recarga, a Chevrolet oferece três opções. A mais interessante é com o uso de um carregador especial ligado a uma tomada de 240 volts que completa tudo em 9,5 horas. A segunda é usar uma tomada residencial de 120 volts, para uma recarga mais lenta, que dá carga equivalente a 6,4 km de autonomia a cada hora, ou entre 50 e 60 horas. A terceira é um recarregador disponível em locais públicos, que completa as baterias em sua totalidade em apenas 3 horas.
Vem mesmo?
Tudo depende uma coisa: uma legislação que possibilite a chegada de uma tecnologia mais cara com incentivos ou tributação diferenciada. O governo vem sinalizando nos últimos meses que seguirá esta linha. Da parte da Chevrolet, a CEO global da General Motors, Mary Barra, já tinha falado desde 2015 que o Bolt era o início de uma era de carros elétricos globais. No ano passado, a GM anunciou um ambicioso projeto de lançar mais de 20 novos modelos de emissões zero até 2023. E mais: estabeleceu a meta de ser líder em veículos eletrificados na América Latina.
Quando fiz este test-drive, a direção da GM afirmava que a venda do Bolt no Brasil seria inviável. Depois do anúncio da nova estratégia, as coisas mudaram. Falei pessoalmente com o Presidente da GM América do Sul, Carlos Zarlenga, que confirmou que o Bolt será vendido no Brasil. "Eu tenho a missão de tornar a GM líder de veículos elétricos na América Latina, então, precisamos começar", disse Zarlenga. Além da chegada dos elétricos, Zarlenga também aposta na produção regional de modelos elétricos por um montadora de grande volume. "Vai acontecer antes do que vocês imaginam", concluiu, sem dar mais detalhes.
Fato é que o carro elétrico está apenas no aguardo da legislação e tributação. Nos Estados Unidos, seu preço parte de US$ 37.495, mas cai para US$ 29.995 com incentivos federais. Se lá custa isso, não adianta esperar por um carro barato. É difícil prever quanto custará aqui, mas analisando o valor com isenções (R$ 96 mil), podemos pensar em valores otimistas entre R$ 130.000 e R$ 150.000. Outra opção é colocá-lo no sistema de compartilhamento Maven, da própria GM, onde será possível alugar o Bolt para trajetos urbanos.
Mais cedo ou mais tarde, o Bolt vai chegar e tem tudo para ser um dos personagens importantes desta nova história.
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