Motos esportivas são muito legais para acelerar de vez em quando, dar aquelas escapadas de fim-de-semana, mas casar com uma delas significa ter uma série de restrições na "vida real": posição desconfortável, "buraco" em baixas rotações, suspensões de pista... Talvez seja por isso que as superesportivas andam em baixa no mercado mundial, cedendo cada vez mais espaço às chamadas supernakeds. Sim, essas peladas poderosas aproveitam o motorzão das esportivas, mas têm uma pegada mais amigável em termos de entrega de potência, posição de pilotagem e conforto, além do preço ser geralmente mais acessível.
Neste cenário, BMW e Kawasaki são as atuais protagonistas do segmento: a alemã acaba de trazer a inédita S1000 R importada, enquanto a japonesa já produz no Brasil a nova geração da Z1000. Diante de duas novidades assim, nós do CARPLACE MOTO resolvemos juntá-las para um tira-teima: Qual empolga mais? Qual a melhor para seu estilo de pilotagem? Vamos rodar!
Streetfighter de olhos puxados
O primeiro impacto da Kawa é visual. Impossível não se encantar com essa verdadeira lutadora de rua. O perfil esguio e provocante faz lembrar um predador pronto para o bote - veja ela de lado e confira se estou falando besteira - enquanto os olhos, digo, faróis com quatro projetores de LED's parecem vigiar sempre o inimigo com cara de mau. A nova Z1000 é musculosa e caprichada, sem uma solda sequer aparente, além de a rabeta curta e esbelta fechar com muito estilo o visual esportivo.
O painel segue o desenho radical da moto, trazendo uma peça totalmente digital em que se destaca o conta-giros dividido em dois. Na parte inferior, apenas até 3 mil rpm. Na porção superior, das 4 mil até 11 mil rpm, e com LED's brancos bem fortes para chamar a atenção do piloto para o momento certo das trocas de marcha sem deixar o motor cortar. A posição de pilotagem é até confortável para uma monstra de 142 cv e 11,3 kgfm de torque, com a pedaleira não muito recuada nem muito alta, guidão em altura ergonômica e comandos bem posicionados. A desejar, apenas o banco um tanto duro, com uma espuma fininha que não oferece boa sustentação ao seu traseiro depois de algumas horas.
Dada a partida no quatro cilindros de exatas 1.043 cc, temos um ronco grave e rouco, uma melodia que os fãs de Kawasaki reconhecerão de primeira. O manete de embreagem não é pesado, as marchas engatam com precisão e a resposta em baixos giros é sublime, tornando a tocada agradável mesmo na cidade. Aliás, muitos outros fatores fazem da Z1000 uma divertida companheira diária: o motorzão tem torque em baixa de sobra, as relações curtas quase não exigem troca de marcha (a terceira é um coringa para diversas situações), o grau de esterço é bom para uma supernaked e a largura geral é bem estreita, não gerando a menor dificuldade ao se trafegar no corredor - pelo contrário!
Já as suspensões, bem, estamos numa moto que precisa ser firme nas curvas e frenagens fortes. O resultado é que, mesmo no ajuste mais macio, a Z1000 te conta tudo sobre o piso - os buracos, as emendas de asfalto, as pedrinhas do caminho e até se havia algum alfinete jogado na rua. Com um pouco de costume, você já passa a levantar do banco quando vê um obstáculo para minimizar o impacto. Os freios são bem dimensionados e atuam de forma bem progressiva, sem aquela "travada" logo no começo do curso da manete e do pedal. O ABS é um opcional praticamente indispensável numa motos dessas, que fazia parte da unidade avaliada.
Somados todos os aspectos da nova Z1000, temos uma máquina extremamente prazerosa de encher a mão. O motorzão sobe de giro de forma progressiva, o câmbio é gostoso de operar, as manetes têm tato agradável e a dianteira curtinha garante uma agilidade invejável no trânsito, mais do que justificando o apelido de streetfighter. Acelera forte e retoma com muito vigor, mas sem brutalidade nas respostas. Andando no seco, confesso que nem senti falta do controle de tração (não oferecido).
Avaliada sozinha, a Z1000 é um tesão de moto: linda, agressiva, bem construída, bem acabada, com saúde de sobra e muito, mas muito divertida de tocar. Mas ainda é cedo para cantar vitória, e lá vamos nós buscar a S1000 R para o tão esperado encontro.
Mecatrônica alemã
Se a Kawa prima pela pureza, sem muita eletrônica, a BMW é toda sobre tecnologia. Derivada da S1000 RR HP4, superesportiva mais cobiçada dos últimos tempos, a S1000 R tem acelerador eletrônico, controle de tração, quatro modos de condução e ainda uma suspensão ativa que faz toda a diferença na pilotagem. Curioso é que, analisando apenas o design, a máquina alemã parece até mais simples que a japonesa, com soldas aparentes e uma dianteira de faróis assimétricos que não agrada a todos. Mas, acredite, qualquer restrição que você tenha ao estilo dela vai embora assim que você aperta o botão de partida.
"Uoooooooo"... assim ecoa o maravilhoso ronco da S1000 pelas paredes da concessionária Eurobike, que nos cedeu a moto para alguns dias de diversão. O som do quatro cilindros alemão é um berro típico das motos de pista, que faz a (bela) voz da Z1000 ficar até discreta. Dou aquela aceleradinha enquanto manobro a moto e já sinto a adrenalina jorrar pelas minhas veias. Saio com todo cuidado e seleciono o modo Road, o segundo mais manso desta supernaked. Existe o Rain para dias de chuva ou pista escorregadia, o Road para condução normal, o Dynamic para uma pilotagem mais arrojada e o Dynamic Pro, para acelerar como um retarda..., quer dizer, para usar nos track days.
Por mais que o motorzaço de 160 cv e 11,4 kgfm de torque domine praticamente todas as ações, é a suspensão eletrônica que impressiona mais. Funciona basicamente assim: por meio de sensores, ela detecta o impacto sofrido pela roda dianteira e, quase que imediatamente, prepara a roda traseira para receber a pancada - a rigidez também pode ser ajustadas por um botão, se você preferir. Na comparação com a Z1000, é como se a S1000 estendesse um tapete sobre o piso antes de passar. Resultado: você sente muito menos a buraqueira. Ela é macia o suficiente para ser confortável, mas firme o suficiente para te manter conectado. Perfeita!
A melhor absorção de impactos, porém, não chega a fazer desta BMW uma parceira de dia-a-dia tão boa quanto a Kawasaki. A S1000 R tem o guidão mais avançado e as pedaleiras mais altas e recuadas, deixando o piloto mais inclinado e apoiado sobre os punhos do que na Z1000. Fora isso, o motor BMW é mais agudo e pede mais trocas de marcha, além de "implorar" para subir de giro o tempo todo, mesmo que você só queira passear. Para completar, o grau de esterço do guidão é bem reduzido devido ao amortecedor de direção (fiquei "preso" entre os carros algumas vezes no trânsito) e o motor solta um bafo quente bem na sua perna esquerda.
Não é nada, no entanto, que você não possa relevar caso more numa cidade de trânsito mais suave que a capital paulista. Afinal, além da suspensão deliciosa, os comandos da S1000 R parecem ainda mais suaves que os da Z1000. O câmbio é faca quente na manteiga, os botões dos punhos são mais requintados e a tocada no geral é mais leve, exigindo menos esforço do piloto. Em adição, o painel é animal: conta-giros analógico de fundo branco (com limite de 13 mil rpm), shift-light (luz de troca) em destaque e um visor digital que concentra diversas informações, como velocímetro, modo de condução escolhido, indicador de marcha e ainda o computador de bordo - este também presente na Kawa.
Iiiiiiiiiit's time!
Até aqui as novas supernakeds mostraram que podem ser usadas na cidade sem problemas, com ligeira vantagem para a Z1000, mas agora é a hora da verdade: pegar uma rodovia e encarar uma estradinha secundária bem tortuosa! Nos retões, as duas sofrem da mesma limitação, a falta de proteção aerodinâmica. Ou seja, você tem potência de sobra e empurrão nas costas para além dos 230 km/h (só em pista fechada, pessoal!), mas, mesmo abaixado e encaixado no tanque, você não aguenta muito tempo a pressão do vento contra o peito. Para viajar nas velocidades permitidas nas vias brasileiras (com umas esticadinhas), no entanto, elas vão de boa, com o motor em baixa rotação e muita segurança. O banco da BMW é mais cômodo, mas a Kawa oferece melhor posição ao piloto, que cansa menos depois de algumas horas.
Enquanto a Kawa tem resposta contundente mesmo em baixos giros, a BMW dispara de verdade em altas rotações. É uma entrega explosiva de potência que faz parecer que estamos sentados no rabo de um foguete! Mas não é só velocidade. A Z1000 também é capaz de responder aos anseios mais demoníacos por desempenho, só que a S1000 R faz tudo parecer mais fácil. Além dos comandos mais suaves de câmbio e direção, a máquina alemã dá show na absorção de impactos, como se a moto "flutuasse" sobre os bumps da pista. E os freios Brembo são impecáveis, alicatam demais!
A soma disso tudo resultava em sorrisos dentro do capacete a cada curva da nossa estradinha-padrão. Impressiona a forma como a S1000 R é parceira, inclina com muita facilidade, sem esforço, é leve nas mudanças rápidas de direção (curvas em "S"), freia muuuito forte e ainda tem um motor praticamente de corrida que faz as saídas de curva parecerem pista de decolagem - a frente levinha quer logo levantar voo! Para completar, os pneus Pirelli Corsa são bastante grudentos (até mais que os Dunlop da rival).
A Z1000 também garante empolgação, mas andando forte os limites dela aparecem antes. A Kawa é mais pesada para deitar e mudar de direção, além de os freios não terem uma resposta tão imediata quanto a da rival. Mas o que diminui a confiança ao andar rápido com a Kawa é a suspensão muito dura, que transmite as pancadas do piso e acaba desequilibrando um pouco a moto nos bumps, fazendo você aliviar o acelerador.
Tudo tem um preço
Ainda com a adrenalina voltando aos níveis normais, a "parada do café" teve como assunto a conclusão do combate. Antes, fechamos as médias de consumo da avaliação: 15 km/l na Z1000 e 14 km/l na S1000 R - dentro do esperado para motos desse naipe. Ao fim do dia, a gente babou pelo design da Kawa, o torque sempre pronto e o incrível poder de iluminação dos faróis de LEDs. Mas é inegável que na BMW temos uma máquina mais sofisticada para acelerar, com performance ainda mais afiada e um incrível poder de transformar meros motociclistas em aspirantes a piloto.
Diante disso, só restava adicionar a parte mais delicada à discussão: o seu bolso. A moto alemã custa salgados R$ 67.900, quase um abismo em relação aos R$ 49.990 da Kawasaki com ABS como a avaliada aqui. E aí chegamos a dois veredictos diferentes. Se você quer uma naked "mil" estilosa para uso diário e com muita saúde sem gastar os tubos, a Z1000 é uma excelente opção. Mas se dinheiro não for problema, amigo, a S1000 R é a supernaked definitiva!
Por Daniel Messeder
Fotos Rafael MunhozAgradecimento: concessionária Eurobike Motorrad SPBMW S1000 R
Gostamos: motor, suspensão, tecnologia
Não gostamos: bafo na perna, preço
Ficha técnicaMotor: quatro cilindros em linha, quatro válvulas por cilindro, comando duplo no cabeçote (DOHC) e refrigeração líquida, injeção eletrônica, 999 cm³; Potência: 160 cv a 11.000 rpm; Torque: 11,4 kgfm a 9.250 rpm; Câmbio: seis marchas; Transmissão final: corrente; Partida: elétrica; Quadro: dupla viga de alumínio; Suspensão dianteira: garfo invertido de 46 mm de diâmetro com ajuste de pré-carga e retorno (120 mm de curso); Suspensão traseira: balança de alumínio, monoamortecida (120 mm de curso), ajustável eletronicamente: Freio dianteiro: disco duplo de 320 mm com pinça de 4 pistões e ABS; Freio traseiro: disco simples de 240 mm com pinça de 2 pistões, com ABS; Pneus: 120/70-17 na frente e 190/55-17 atrás; Medidas: comprimento 2.057 mm, largura 845 mm, altura N/D, entre-eixos 1.439, altura do assento 814 mm; Peso: em ordem de marcha 207 kg; Tanque: 17,5 litros
Kawasaki Z1000
Gostamos: motor, design, uso urbano
Não gostamos: suspensão muito dura
Ficha técnicaMotor: quatro cilindros em linha, quatro válvulas por cilindro, comando duplo no cabeçote (DOHC) e refrigeração líquida, injeção eletrônica, 1.043 cm³; Potência: 142 cv a 10.000 rpm; Torque: 11,3 kgfm a 7.300 rpm; Câmbio: seis marchas; Transmissão final: corrente; Quadro: dupla viga de alumínio; Suspensão dianteira: garfo invertido de 41 mm com retorno e pré-carga da mola ajustáveis (120 mm de curso); Suspensão traseira: monoamortecida com retorno e pré-carga da mola ajustáveis (122 mm de curso): Freio dianteiro: disco duplo de 310 mm em formato margarida, pinça com 4 pistões; Freio traseiro: Disco simples de 250 mm em formato margarida, pinça com pistão simples; Pneus: 120/70-17 na frente e 190/50-17 atrás; Medidas: comprimento 2.045 mm, largura 790 mm, altura 1.055 mm, entre-eixos 1.435 mm, altura do assento 815 mm; Peso: em ordem de marcha 220 kg; Tanque: 17 litros
Galeria de fotos: BMW S1000 R Vs Kawasaki Z1000
Galeria: Avaliação: BMW S1000 R e Kawasaki Z1000, as supernakeds em ação!