A foto acima é famosa: no dia 18 de novembro de 1959 — há exatos 65 anos — o presidente de república, Juscelino Kubitschek acena do banco de trás de um Fusca conversível preto numa visita oficial à fábrica da Volkswagen na Via Anchieta, em São Bernardo do Campo (SP). A seu lado está Carvalho Pinto, então governador de São Paulo.
Na frente vão Heinrich Nordhoff, presidente mundial da VW, e Schultz-Wenk (ao volante), o presidente e grande idealizador da filial brasileira da marca. Para a Volkswagen, o 18 de novembro de 1959 hoje é considerado o dia de abertura de seu gigantesco complexo industrial brasileiro — tanto que a companhia acaba de divulgar um comunicado oficial sobre o “65º aniversário da Anchieta”. Mas há um detalhe curioso nessa história: quando houve a visita oficial de JK, a fábrica já vinha produzindo carros com grande índice de nacionalização há pelo menos dois anos.
O marco zero no Brasil foi a importação dos primeiros Volkswagen alemães pela Companhia Distribuidora Geral Brasmotor, no final de 1950. Rapidamente, a Brasmotor (que também era representante Chrysler e, mais tarde, fabricaria as geladeiras Brastemp) passou a montar kits CKD do Fusca no país.
Alexander Gromow, maior pesquisador da história do Fusca no Brasil, nos conta que a pioneira linha de montagem da Brasmotor já ficava em São Bernardo do Campo, onde hoje existe o supermercado Atacadão, da Avenida Rotary.
Pare estimular a criação da indústria automobilística brasileira e equilibrar a balança comercial, o presidente Getulio Vargas restringiu a importação de automóveis prontos. O plano era nacionalizar componentes e atrair fabricantes de carros e caminhões. A VW foi uma das primeiras a atender ao apelo: em março de 1953, foi fundada a Volkswagen do Brasil.
Não se tratava mais de uma representante no país, mas sim de uma filial da companhia alemã: a matriz, em Wolfsburg, detinha 80% do negócio e o grupo Monteiro Aranha, do Rio de Janeiro, 20%. A Volkswagen do Brasil, inicialmente, montava os Fuscas e Kombis em um galpão alugado na Rua do Manifesto, bairro do Ipiranga, em São Paulo.
A companhia, contudo, já tinha planos de construir sua primeira fábrica fora da Alemanha, iniciando sua expansão global. E foi assim que, em 1956, começou a ser construído o gigantesco complexo industrial às margens da Via Anchieta. Suas paredes de tijolinhos aparentes são, até hoje, um símbolo de São Bernardo do Campo.
As obras andaram rápido e, no fim de 1956, um primeiro pavilhão ficou pronto o suficiente para receber a linha de montagem dos CKDs, transferida da Rua do Manifesto. Esses primeiros Fuscas montados na Anchieta (a partir de componentes alemães) ainda tinham janelinha oval na traseira e, rapidamente, começaram a ser utilizados como radiopatrulhas pela polícia de São Paulo, bem como no serviço de trânsito paulista.
2-9-1957 - a Kombi foi o primeiro modelo fabricado na Anchieta
Se existe uma data exata para marcar o início de produção para valer da fábrica na Anchieta, deveria ser 2 de setembro de 1957, quando foi feita a primeira Kombi brasileira — a 001 já trazia 54,5% de nacionalização. Motor e câmbio, contudo, ainda eram importados da Alemanha.
Um anúncio dessa época mostrava um desenho da fábrica e das Kombis, anunciando orgulhosamente: “Agora o Volkswagen também é brasileiro!”. Daquele 2 de setembro até o fim de dezembro de 1957 foram fabricadas 371 Kombis em São Bernardo do Campo.
Em 3 de janeiro de 1959 foi a vez de o primeiro Fusca nacional sair da fábrica da Anchieta (na época, o modelo já tinha a janelinha traseira retangular). Uma nota do “Jornal do Brasil” de 16 de janeiro daquele ano registrou o discreto início da produção “sem qualquer solenidade oficial”.
Somente em novembro é que as agendas do presidente da república, Juscelino Kubitschek, e de Heinrich Nordhoff, presidente mundial da VW, coincidiram para celebrar uma “inauguração oficial” da fábrica — que, a essa altura, já estava a pleno vapor.
A marcante fachada de tijolinhos vista da Via Anchieta
Em sua longa história, a unidade da Anchieta já fabricou 14,7 milhões de veículos. Isso representa 57% dos 25,7 milhões de carros e comerciais leves produzidos pela Volkswagen do Brasil em 71 anos. Depois da pioneira, foram inauguradas fábricas da marca em Taubaté (1976), São Carlos (de motores, em 1996), São José dos Pinhais (no Paraná, em 1999) e o centro de peças e acessórios de Vinhedo (2004).
Em seus anos de ouro, a fábrica da Anchieta fazia mais da metade de todos os automóveis vendidos no país. Foi em seu departamento de estilo que, a partir da década de 60, começaram a ser desenhados modelos exclusivos para a produção no Brasil. Entre os carros feitos em São Bernardo do Campo, além do Fusca e Kombi, estão Karmann-Ghia, VW-1600 “Zé do Caixão”, TL, Variant, SP1, SP2, Brasilia, Passat, Gol, Voyage, Saveiro, Parati, Santana e Polo.
Laboratório de Segurança Veicular da Volkswagen do Brasil
O Laboratório de Segurança Veicular foi implantado em 1971, realizando o primeiro crash-test na América Latina. Na unidade Anchieta, também está localizado o Laboratório de Emissões Veiculares, inaugurado em 1977. O centro de Design e Engenharia da Volkswagen conta com dinamômetros, oficinas de protótipos, laboratórios com realidades virtual e aumentada, câmara de intemperismo e equipamento de simulação de radiação solar.
O departamento de Ferramentaria forneceu equipamentos para a produção do Taos na Argentina e no México, além de produzir ferramentas para a Alemanha, usadas nas linhas dos modelos elétricos VW ID.4 e ID.3, e para países como China e Hungria.
Atualmente, são produzidos na Anchieta o Nivus, o Polo GTS, o Virtus e a Saveiro. A unidade da Anchieta tem 8.200 trabalhadores, sendo 5 mil em atividades no “chão de fábrica”. Em fevereiro passado, a Volkswagen anunciou investimentos de R$ 13 bilhões em suas fábricas no estado de São Paulo, além de 16 lançamentos até 2028. Pelo visto, mesmo com toda a crise enfrentada pelo grupo VW na Europa, a enorme fábrica com fachada de tijolinhos ainda tem muito futuro pela frente.
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