Na semana passada, escrevemos aqui sobre o rali Pequim-Paris, uma prova de regularidade e resistência para carros antigos que cruza meio mundo, literalmente: são 14.250 km ao longo de 37 dias. A edição de 2024, que largou da Grande Muralha da China no dia 18 de maio, teve nada menos do que 80 carros inscritos por competidores de 26 países.
Na etapa disputada em 10 de junho, no Azerbaijão, o carro mais antigo do rali - um American LaFrance ano 1914, fabricado originalmente como caminhão de bombeiros e transformado em speedster esportivo - sofreu um grave incêndio que praticamente o destruiu. São as tristes ironias do destino. O carro corria com a dupla britânica Tomas de Vargas Machuca e Ben Cussons. Nenhum dos dois sofreu qualquer ferimento.
A largada, na Grande Muralha - plano era chegar a Paris em 37 dias
Pequim-Paris 2024 - Devagar
O American LaFrance acelera numa pista de areia na China
Os carros rodam, em média, 385km por dia
Foram muitas estradas de terra da China ao Azerbaijão
Ben, presidente do Royal Automobile Club no Reino Unido, e Tomas, presidente do Hero-Era, grupo que organiza o Pequim-Paris, dirigiam por uma estrada asfaltada nos arredores de Baku (capital do Azerbaijão), em um trecho de deslocamento sem tomada de tempo. Foi quando outro motorista alertou que havia algum problema na parte traseira do “caminhão speedster”, justamente onde ficava o enorme tanque de combustível.
Ao ser parado no acostamento, o American LaFrance foi rapidamente engolido pelas chamas, que não puderam ser apagadas com os extintores disponíveis. Os bombeiros chegaram quinze minutos depois para, finalmente, debelar o fogo - mas o carro de 110 anos, único competidor na classe Pioneer, já estava seriamente danificado.
American LaFrance 1914
O incêndio começou na parte traseira do carro, onde está o grande tanque de combustível
O American LaFrance de 1914 era o carro mais antigo o rali e levava o numeral 1
Todos os pertences pessoais da tripulação foram perdidos no incêndio, com exceção de uma pasta lacrada com o passaporte de Tomas de Vargas. A dupla agora está envolvida com as operações de salvamento e logística para repatriar o que sobrou do centenário automóvel. Mesmo sem seu carro, piloto e navegador não se deram por vencidos: bem no espírito do Pequim-Paris original, de 1907, eles declararam que darão algum jeito de receber a bandeirada final da prova, na capital francesa, no dia 23 de junho.
Um American LaFrance dos anos 80, modelo bem conhecido pelos filmes de Hollywood
Antes de ser transformado em speedster, o American LaFrance do rali era parecido com este caminhão
O exemplar já havia participado de outras edições do Pequim-Paris
Quem curte carros de bombeiros seguramente já ouviu falar da American LaFrance, marca tão antiga que já existia antes de o automóvel ser inventado. Suas origens estão na LaFrance Fire Engine Company, empresa fundada nos Estados Unidos em 1873, por Truxton Slocum LaFrance, para fabricar equipamentos contra incêndios: escadas, mangueiras, bombas d’água manuais ou a vapor e, claro, carros de tração animal.
O nome definitivo, American LaFrance, veio em 1903, depois de uma fusão com a American Fire Engine Company. O primeiro caminhão motorizado da ALF foi produzido em 1907. A partir daí, a marca praticamente monopolizou o mercado de viaturas de bombeiros nos EUA.
Já bem estabelecida no setor de combate a incêndios, a American LaFrance teve uma breve aventura pelo mundo dos carros de passeio. Simplesmente aproveitava a parte mecânica de seus caminhões de bombeiros, com entre-eixos de 3,60 metros, transmissão por correntes e motores de quatro cilindros e 9.500 cm³, para construir enormes automóveis de passeio. Isso incluiu até alguns speedsters com um leve arremedo de carroceria “esportiva”, inspirados nos Stutz Bearcat da época. A produção foi baixíssima, não chegando a 30 exemplares, entre 1910 e 1920. Muitas décadas depois, contudo, antigomobilistas começaram a comprar chassis completos de caminhões ALF aposentados para fazer réplicas fiéis dos velhos speedsters. Era o caso do exemplar queimado no Azerbaijão, que já havia feito o Pequim-Paris em 2019, além de ralis pelo Saara e Escócia.
Depois de passar por muitos donos em sua existência, a companhia American LaFrance faliu e foi definitivamente fechada em 2014. Seus caminhões de bombeiros, porém, continuam em uso ao redor do planeta.
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