Indústria: Exportar sim, mas o quê? Jabuticabas?
Fabricantes dizem que País precisa aumentar competitividade, mas têm poucos produtos exportáveis para fora da América Latina
Toda vez que o mercado brasileiro sofre retrações – e isso acontece com frequência –, fica exposta a imensa ociosidade dos fabricantes de veículos instalados no País, que juntos têm capacidade para produzir algo como 4,5 milhões de veículos por ano, mas nunca nem chegaram perto disso, em 2020 produziram menos da metade do potencial e o melhor resultado da história da indústria no Brasil, em 2013, foi de 3,74 milhões de unidades fabricadas.
E toda vez que essa ferida fica mais exposta, volta à tona o tema da falta de competitividade para exportar, bem como a urgência de se adotar políticas para consertar essa deficiência e assim preencher ao menos parte do espaço desocupado das fábricas.
Galeria: Nissan Kicks 2022 sendo enviado para lojas
A falta de competitividade para exportar da indústria multinacional de veículos instalada no Brasil tem várias causas, mas a associação dos fabricantes, Anfavea, por óbvio, só reconhece os problemas que estão fora dos portões das fábricas. É verdade que o Brasil tem custos mais altos do que outros países para produzir, também tem um sistema tributário que exporta impostos e inibe exportações. Também é fato que as montadoras mantém no País hoje algumas das mais modernas e eficientes linhas de produção do mundo, portanto esse não seria o problema.
No entanto, não é menos verdadeiro que a maioria dos produtos feitos aqui não são exportáveis para fora da América Latina – que tem mercados muito voláteis, pequenos e de baixa renda, com baixo potencial de volumes e rentabilidade, portanto.
O fato é que se todos os problemas de competitividade do Brasil fossem resolvidos amanhã, com honrosas e poucas exceções, o País não teria produtos a exportar. É a velha conotação com as jabuticabas, uma fruta típica brasileira que nunca se vê no exterior.
Apesar de serem multinacionais, e até por causa disso, as montadoras sempre desenvolveram veículos pensando exclusivamente no mercado nacional – e quando trazem para cá modelos globais, fazem um extenso trabalho de desenvolvimento ao contrário, para depenar o máximo possível as tecnologias mais modernas e caras, com o objetivo de reduzir custos e fixar preços que acomodam lucros e uma excessiva carga tributária, o que se traduz em valores muito elevados em relação a que o produto oferece.
FILIAIS NÃO COMPETEM COM MATRIZES
Provocado com essa questão, o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, concorda e discorda, dizendo que temos algumas das fábricas mais modernas e eficientes do mundo, engenharia avançada, desenvolvimento independente, e se não fazemos produtos exportáveis hoje poderíamos simplesmente começar a fazê-los assim que fosse instalado um ambiente competitivo para isso. “Por que uma montadora na Coreia pode fazer produtos para a Europa?”, perguntou ele citando o país asiático que exporta mais da metade do que produz, o que em 2020 significou quase toda a produção brasileira de veículos de 2 milhões de unidades.
“Nós aqui também conseguiríamos fazer o mesmo. As montadoras aqui têm condições. O desafio é fazer o País ser competitivo para isso”, defende Moraes. Mesmo que esse ambiente mais competitivo fosse milagrosamente instalado, é difícil acreditar que as matrizes dessas empresas iriam aceitar de bom grado a competição internacional com suas filiais no Brasil.
Até o momento, com poucas variações, a política dos maiores fabricantes globais de veículos é a de dominar seus mercados de origem e exportar o máximo, passando a produzir em outros países somente quando não é possível ou não é competitivo abastecer esses mercados externos a partir das matrizes.
Com essa política, normalmente as filiais das montadoras ficam com as “sobras” do mundo, países de baixo poder aquisitivo, rentabilidade limitada e volumes pequenos, com produtos de baixo valor agregado que mercados desenvolvidos não compram mais, seja pelas legislações de emissões e segurança mais evoluídas, ou simplesmente porque os clientes querem mais tecnologia e qualidade. É exatamente este o caso do Brasil, de onde as fábricas de veículos só conseguem exportar – e mal – para países latino-americanos, mesmo assim competindo com as próprias matrizes.
O caso da Coreia citado por Moraes comprova essa tese. Ainda nos anos 1960 o país era um mercado pouco atrativo para atrair qualquer montadora estrangeira. Os coreanos então rumaram na mão inversa, investiram para criar sua própria indústria de veículos e assim ganharam protagonismo internacional.
Hoje os fabricantes coreanos exportam mais da metade do que produzem para o mundo todo, e onde isso não é competitivo, montaram fábricas locais para consumidores locais, sem atrapalhar as exportações da matriz, como acontece inclusive com o Brasil, onde no início da década passada a Hyundai decidiu instalar fábrica, que hoje tem volumes insignificantes de vendas externas, apenas a países vizinhos.
A indústria automotiva instalada no Brasil nunca teve um programa exportador de grande porte, apenas iniciativas incipientes e isoladas que duraram pouco tempo e raramente chegaram a representar mais de 20% da produção nos melhores anos – ainda que existam bons exemplos a celebrar como foi o caso da Fiat com a Palio Weekend e da Volkswagen com o Golf e Fox.
Seria ótimo para o País ter políticas para expandir as exportações do setor, até porque isso geraria investimentos e empregos, além de agregar valor aos produtos fabricados aqui, mas as fabricantes também precisam fazer sua parte. No momento, não aparece no horizonte vontade política capaz de mudar esse cenário, nem no governo para criar um sistema tributário mais justo, nem nas montadoras para produzir veículos exportáveis.
Assim tende a aumentar a insignificância do Brasil no mundo automotivo, que em 2020 representou apenas 0,45% do total de veículos vendidos globalmente. Uma pena, já que essa indústria é um forte indutor de evolução tecnológica, tão necessária ao desenvolvimento de qualquer sociedade.
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Fonte: Automotive Business
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