Justiça seja feita, a Renault Oroch foi a primeira picape dessa categoria, apresentada em outubro de 2015, sendo que a Fiat Toro foi apresentada oficialmente em fevereiro de 2016. Por uma questão de destaque de mercado, sabemos quem chamou mais a atenção e vendeu mais durante todos esses anos. Mas nunca é tarde para mudanças.
A Oroch (agora não mais Duster) teve sua primeira reestilização em todo esse tempo em 2022. A Renault quer recuperar ao menos um pouco do tempo perdido e aproveitar a alta entre as picapes desse porte, com destaque para a Renault Oroch Outsider 2023, com motor 1.3 turbo e câmbio automático CVT, mesmo conjunto que está no Captur e Duster. Boa saída para recalcular a rota do tempo perdido?
Diferente do Duster, que em 2020 chegou em uma nova geração, a Oroch é assumidamente uma reestilização do que foi apresentado em 2015. Enquanto o SUV trocou estamparia completa, melhorou sua plataforma e se refinou bastante, a Oroch troca peças visuais, o interior e melhora alguns pontos técnicas - e até por isso deixa de ser Duster Oroch para ter sua individualidade.
A picape trocou o parachoque dianteiro, recebeu uma grade maior e mais destacada, novas rodas de 16" e, na traseira, novas lanternas com fundo preto. Um enorme adesivo nos lembra que ela é a Oroch na tampa traseira, mas ainda é quase um jogo identificar as diferenças externas da picape. Mesmo assim, a renovação já deu um novo fôlego, mas longe de chamar a atenção nas ruas. No caso da Outsider, apliques na carroceria e faróis de longa distância a diferencia, assim como as rodas em preto e diamantado.
Por dentro, o oposto da parte de fora. Pouco se reconhece da Oroch anterior, apesar de alguns pontos ainda reconhecermos a geração anterior do Duster. A equipe de design da Renault precisou encaixar elementos novos em um carro que não mudou sua arquitetura principal, mas conseguiu. O dashboard é uma peça nova, em plástico rígido, com elementos que vemos no próprio novo Duster, como as saídas de ar, comandos de ar-condicionado e linha de botões de comandos, enquanto o painel de instrumentos veio do Captur, assim como o volante é o mesmo utilizado em larga escala na marca.
O sistema multimídia é um capítulo a parte. Em posição elevada, algo que nenhum Renault oferecia antes, a tela de 8" tem o novo software da marca, porém com um exclusivo sistema de espelhamento sem fios (Apple CarPlay e Android Auto). Não sei se gostei da solução ou se era melhor algo mais integrado ao painel, como vemos no próprio Duster. A luz bate na tela e atrapalha, mas deve ser questão de se acostumar, pois ergonomicamente funciona, assim como o software responde rápido e é fácil de usar.
Apesar de não ter feito uma troca de geração na Oroch, a Renault dedicou um tempo em seus conjuntos de motores e câmbio. A Outsider é a única com o 1.3 turbo de 162/170 cv e 27,5 kgfm de torque, o moderno motor feito em parceria com a Mercedes-Benz, por enquanto importado da Espanha, com injeção direta de combustível. Pareado ao câmbio CVT com simulação de 8 marchas, é um conjunto que já elogiamos no Captur e, principalmente, no Duster.
É um dos melhores conjuntos de motor e câmbio disponíveis em carros nacionais. A Renault tirou o atraso dos anos com o 2.0 aspirado e câmbio automático de 4 marchas com essa dupla que responde bem e estão bem conversados no seu trabalho em dupla. O torque em baixas do 1.3T é aproveitado pelo câmbio, que flutua em 2.000 rpm, só acelerando mais se precisar mesmo de mais força. Funcionamento suave é um ponto forte, apesar de um pouco áspero na fase fria, enquanto se aquece, e o isolamento acústico deixar passar um pouco de ruído para o interior, além do vento nas colunas em velocidades mais altas.
Com força de sobra, até o modo Eco dá um bom desempenho para a picape. Mas seu peso e aerodinâmica não colaboraram na hora do consumo. Os 6,9 km/litro na cidade são melhores que os 6,1 km/litro da 2.0 com AT4, assim como os 8,8 km/litro na estrada (antes 8,7 km/litro), mas com uma boa força e respostas melhores. Como exemplo, o 0 a 100 km/h foi de 12,2 segundos para 10,5 segundos, e a retomada de 40 a 100 km/h, de 10,4 segundos para 7,7 segundos em nossos testes.
A Renault Oroch usa o sistema de suspensão baseado no que era o Duster 4x4, com a multilink na traseira. É um dos seus pontos fortes em estabilidade e conforto da picape, sendo que nem em piores pisos dá final de curso ou uma sensação que está sendo demais para ela. Nas arrancadas mais fortes, puxa a direção (vamos comentar isso logo), mas em movimento passa segurança mesmo em velocidades mais altas. Mas vamos com calma.
Todo esse cuidado da Renault com a Oroch deu um tropeço em algo que já tínhamos comemorado o fim na nova geração do Duster: direção eletrohidráulica. Mais pesada e indireta, é um conjunto antigo que está ali por causa da sua plataforma do SUV anterior. Acaba se destacando negativamente em um pacote tão bem feito de motor, câmbio e suspensão. Repassa muito ao motorista em buracos e emendas na pista, o que cansa em trajetos mais longos, além das puxadas nas arrancadas mais fortes, uma característica também da sua geometria.
Outro reflexo da idade da base da Oroch está na posição de dirigir. É alta como esperamos da picape, mas a falta de regulagem de profundidade da coluna de direção dificulta achar uma boa posição - pernas e braços nunca estarão em posição perfeita, dependendo da sua altura, além de bater o joelho no puxador da porta do motorista. Um carregador por indução, acessório, toma o lugar de dois porta-copos, e ao menos comigo, pouco funcionou.
Apesar de um novo interior, alguns problemas de ergonomia aparecem. A regulagem do ar-condicionado, por exemplo, fica baixo demais, assim como o acionamento do piloto automático no lado esquerdo do painel bem que poderia estar no volante. Detalhes que acabam incomodando no dia a dia de uma picape que, visualmente, se renovou bem. Também faltam mais airbags, já que a Oroch oferece apenas o duplo obrigatório mesmo nessa versão mais cara.
Na caçamba, 650 kg de capacidade, ou 683 litros, já com o protetor e capota marítima de série. Na tampa, faltou um sistema de amortecimento e trava elétrica conjugada ao carro, algo que as picapes de segmentos superiores e suas futuras concorrentes com certeza trarão seguindo as tendências, além de presente em modelos menores, como a Fiat Strada.
Preço? A Renault Oroch Outsider custa R$ 137.100. Não é pouco dinheiro, mas aponta na Fiat Toro em sua versão de entrada, a Endurance (R$ 137.098), e também está de olho em quem pode esticar o orçamento de uma Fiat Strada Ranch CVT (R$ 122.490), oferecendo mais espaço e motor. O mais importante, quer voltar a ser opção no mercado, já que acabou "esquecida" por alguns anos enquanto esperava a renovação.
Mas é boa opção? Flutuando entre as duas picapes da Fiat, oferece um bom conjunto de motor, câmbio e suspensão. Pena que tropeça em pontos como a direção eletrohidráulica e a ergonomia, importante para quem vai usar no dia a dia, além de esquecer algo além de dois airbags mesmo nessa versão mais cara. A renovação caiu bem e vai aproveitar a onda das picapes como deveria ter feito no passado, ao menos até a chegada da Chevrolet Montana. Que a próxima geração seja mais a nova Duster e menos a antiga.
Fotos: Mario Villaescusa (para o Motor1.com)
Renault Oroch Outsider 1.3T
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