Liderança é uma faca de dois gumes. Após alcançar o objetivo, é normal dar aquela relaxada e acabar se acomodando na posição, achando que seus rivais não irão mais alcançá-lo. Foi assim com a Volkswagen, ponteira de vendas no Brasil por décadas, e depois com a Fiat, que deteve o título por outros 13 anos. De 2015 para cá, a líder tem sido a Chevrolet - e com sobras. Só que a marca da gravatinha está de olhos bem abertos para o futuro e promete sair na frente na nova onda de carros que vêm por aí, os elétricos.
Prova disso é que, desde 2011, a GM trouxe ao Brasil o híbrido Volt para estudos. E agora que a eletrificação virou a palavra de ordem na indústria automotiva global, aqui estamos com o Bolt. Lançado nos EUA no começo de 2017, este hatch 100% elétrico está previsto para chegar às lojas brasileiras em 2019. Mas você não vai precisar comprá-lo para ter acesso à tecnologia. O plano da marca também prevê a oferta do modelo em forma de locação por hora, através do aplicativo de smartphone da sua subsidiária de compartilhamento de veículos Maven - já em teste por funcionários da GM Brasil.
Seguindo as diretrizes da matriz, a GM se prepara para o futuro em três frentes principais: eletricidade, conectividade e compartilhamento. O Bolt não só se encaixa nestes três itens como ainda avança numa questão ainda delicada para os elétricos, a autonomia. Segundo a EPA, agência norte-americana de proteção ao meio ambiente, o Bolt é capaz de rodar 383 km com uma carga completa. Considerando que quem mora na cidade roda, em média, 50 km por dia, dá para usar o carro a semana inteira sem precisar recarregar.
Essa questão ganha ainda mais importância devido ao fato de que o Brasil ainda não possui infra-estrutura decente para elétricos. Há apenas poucos shoppings nas principais cidades com vaga de recarga para carros elétricos, além de alguns condomínios mais modernos. Uma forma de contornar isso é um carregador com conexão para tomada industrial (240 V), que nos EUA acompanha o Bolt. Com ele, uma hora de recarga serve para rodar 40 km, segundo a GM. Como opcional, há um kit de carga rápida que, em 30 minutos, permite uma autonomia de 144 km. As baterias de íon lítio com capacidade de 60 KWh ficam divididas em três conjuntos instalados no assoalho do Bolt, abaixo do piso da cabine.
A GM nos cedeu o Bolt por apenas dois dias. Como já havíamos rodado com o modelo nos EUA, nossa intenção era fazer nossas medições instrumentadas. Por conta da autonomia limitada (que não permitiria ir até a pista de testes no interior do estado), usamos extraordinariamente um trecho de estrada fechada para as acelerações e retomadas (não testamos a frenagem). Mesmo para quem já dirigiu outros elétricos (posso contar Mercedes SLS AMG Eletric Drive, Nissan Leaf de primeira e segunda geração, Renault Twizy e Smart, entre outros), o desempenho do Bolt surpreende.
Com seu jeitão meio hatch, meio minivan, como um Honda Fit, o Bolt guarda sob o capô um motor elétrico de 200 cv (150 KW) de potência e 36,8 kgfm de torque. Quem vê de fora, não imagina que ele anda tanto. Basta pisar no acelerador para o Bolt disparar, lembrando que motores elétricos entregam o torque 100% do tempo, sem depender de rotações elevadas. Foram apenas 7,9 segundos para chegar até os 100 km/h, mas o que impressionou mesmo foram as retomadas. De 80 a 120 km/h, o Bolt gastou somente 5,4 segundos - tempo praticamente igual ao do Equinox com motor 2.0 turbo de 262 cv. É um foguetinho nas ultrapassagens.
A força do motor elétrico deixa o Bolt tão ágil que, ao volante, você nunca dirá que ele pesa 1.616 kg (por conta das baterias). Estávamos com um Range Rover Velar 3.0 Supercharger no dia do teste do Bolt e, confesso, achei o GM muito mais... divertido! Sim, ele é rápido, estável (a suspensão é um tanto firme) e tem um barulhinho de carro dos Jetsons que atiça a acelerar. Isso porque, embora o motor praticamente não faça barulho, há ruídos de transmissão, de rodagem e, claro, do vento contra a carroceria. Só não gostei da resposta dos freios, pois o pedal é do tipo "liga-desliga" e exige costume. Após um trecho de rodovia e um pouco de trânsito na cidade, me senti "em casa" no elétrico da GM. Foi o suficiente para eu não querer mais esperar o compressor do Velar encher o V6 para ele acelerar...
Se eu compraria o Bolt? Com certeza. Na verdade, fiquei um pouco ressabiado com o porta-malas, pois, na prática, ele parece muito longe de ter os 478 litros divulgados pela GM. Já o espaço interno é muito bom para até quatro adultos e uma criança, lembrando de novo o Fit. A posição de dirigir é correta, estilo "cadeirinha" (com as pernas bem flexionadas), enquanto o painel totalmente digital (8 polegadas) faz conjunto com os plásticos brancos no acabamento, formando uma agradável sensação de carro do futuro. Há também itens conhecidos de outros Chevrolet, como o volante e a central multimídia My Link (embora com tela de 10,2 polegadas), além do sistema de concierge e monitoramento OnStar.
O maior problema, ao menos no começo, estará no preço. O Bolt não é barato nem nos EUA, onde custa a partir de US$ 35.478 na versão LT e de US$ 41.780 na Premier, como a testada aqui. Ou seja, com a conversão do dólar e impostos, o elétrico da GM não sairá por menos de R$ 200 mil no Brasil. Mas ainda tem muita corrente antes de o Bolt chegar às tomadas nacionais. Até lá, impostos poderão ser reduzidos e outros incentivos do programa Rota 2030 poderão vingar. Mas o que pode garantir a liderança da Chevrolet entre os elétricos em nosso mercado é mesmo o sistema de compartilhamento via aluguel. Afinal, quem não vai querer sentir o gostinho do amanhã mesmo que por algumas horas? (Daniel Messeder)
Conviver com o Bolt na cidade é uma experiência única. Em outras oportunidades, já fiz o mesmo com o Renault Twizy, mas o Chevrolet é um carro de verdade, com portas, 5 lugares e ar-condicionado, por exemplo. As pessoas olham, tentam entender e, pela minha mente, só passa que aquilo ali que estou dirigindo é o futuro. E um futuro bem próximo.
A grande questão é que o Brasil ainda precisa se adaptar ao Bolt. Não apenas pela suspensão dura, mas pela própria conveniência de poder ter um carro 100% elétrico na garagem. Por exemplo, antes das fotos, procurei um ponto para fazer a recarga da bateria para poder ter uma sobra de segurança. Alguns pontos de São Paulo possuem bases de recarga, assinados pela BMW, para os modelos i3 e i8.
Cheguei a um desses locais, instalado em um restaurante fast food. Carro estacionado, abro a portinhola que protege a tomada do Bolt, pego a do local e...elas não se encaixam! A explicação é que o Bolt ainda não está tropicalizado e seu padrão de tomada ainda não é o mesmo adotado por outros elétricos por aqui, como os BMW i e Porsche Hybrid. Ou seja, rolou uma certa tensão, já que ainda atravessaria a cidade e faria as fotos com o pouco de carga que restava.
Percebi duas características do Bolt. Empolgue-se com o acelerador e a energia vai embora (tanto que a máxima é limitada em 148 km/h). Na estrada, tive que manter 90 km/h para não consumir a bateria rapidamente e, com a ajuda do botão atrás do volante que ativa o freio motor, aproveitei para ganhar um pouco de carga. No fim, deu certo. O Bolt ainda chegou na sede da General Motors com alguma autonomia. Mas, o maior "problema" do Bolt ainda é o Brasil. Que isso mude em breve! (Leornardo Fortunatti)
Fotos: Mario Villaescusa
MOTOR | dianteiro, elétrico, baterias de íons de lítio de 60 kWh |
POTÊNCIA/TORQUE |
200 cv (150 kW); Torque: 36,8 kgfm |
TRANSMISSÃO | câmbio automático, tração dianteira |
SUSPENSÃO | independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira |
RODAS E PNEUS | alumínio aro 17" com pneus 215/50 R17 |
FREIOS | discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira, com ABS |
PESO | 1.616 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 4.166 mm, largura 1.765 mm, altura 1.595 mm, entre-eixos 2.600 mm |
CAPACIDADES | porta-malas 478 litros |
PREÇO | R$ 200 mil (estimado) |
MEDIÇÕES MOTOR1 BR | ||
---|---|---|
Bolt EV | ||
Aceleração | ||
0 a 60 km/h | 3,9 s | |
0 a 80 km/h | 5,6 s | |
0 a 100 km/h | 7,9 s | |
Retomada | ||
40 a 100 km/h em S | 5,5 s | |
80 a 120 km/h em S | 5,4 s | |
Consumo | ||
Médio | 15,9 Kw/h por 100 km (equivalente a 55,0 km/l) |
RECOMENDADO PARA VOCÊ
Teste JAC Hunter HD 4x4 AT: custo-benefício com algo a mais
Marca britânica Jaguar deixa de vender carros no Reino Unido
Teste Mitsubishi Pajero Sport Legend 2025: raíz ou premium?
Brasil quer equipar 33% dos eletrificados com baterias nacionais até 2033
Teste Citroën C3 You! T200: Crise de identidade
Semana Motor1.com: Novo Honda City 2025, Ranger cabine simples e mais
Teste Toyota Corolla Cross XRX Hybrid 2025: sem medo de eletrificação