O Galvão Bueno não fala abertamente para qual time ele torce (embora todo mundo saiba que é o Flamengo), sob pena de dizerem que ele "puxa o saco" do clube carioca. Por motivo semelhante, um jornalista automotivo não costuma revelar qual carro tem em casa ou a marca com que ele mais se identifica. Bom, o carro lá de casa é da minha mulher, até porque quase nunca o uso. Mas desta vez vou abrir uma exceção e contar qual é o meu atual sonho de consumo sobre quatro rodas: BMW M235i. Ele é confortável, estiloso e chique para os compromissos do dia a dia aliado a um motorzão 6-cilindros turbo com tração traseira para pilotar com a faca nos dentes numa serrinha isolada ou num track day. Só me falta a grana...
A BMW percebeu a empolgação dos entusiastas com o M235i e não demorou para fazer o M2. Sim, enquanto o primeiro recebe itens da MotorSports para ficar mais esportivo, o segundo foi desenvolvido totalmente por ela. Para muitos (e eu me incluo nesta lista), o M2 é o sucessor natural do M3 E30, um cupê compacto e de reações nervosas. Os novos M3 e M4 ficaram mais potentes, é verdade, mas também aumentaram de tamanho e peso - o que faz do M2 o novo M favorito de boa parte dos fãs da BMW ao redor do mundo.
A base é a do M235i, mas esqueça a suspensão confortável com amortecedores ajustáveis. No lugar, entrou a suspensão inteira do M4, com componentes de alumínio e rodas de aro 19" calçadas por pneuzões 235/45 na frente e 265/35 atrás. A direção manteve o sistema elétrico, mas com bem menos assistência. O câmbio automático de oito marchas passou a vez para o DCT de dupla embreagem, com sete velocidades e controle de largada. Já o motor, bem, continua o 3.0 litros com turbo de duplo fluxo e injeção direta, mas com a pressão do turbo ampliada e uma reprogramação eletrônica para entregar 370 cv de potência e 47,4 kgfm de torque - com pico de 51 kgfm no overbooster.
Em números frios, são dados interessantes, mas que não chegam a impressionar. Ainda mais sabendo que está vindo aí o M240i, o sucessor do M235i, com 340 cv e praticamente o mesmo torque do M2. Mas o M2 é um bicho diferente, e você já nota isso pela carroceria bombada. É a versão Superman do Série 2 cupê, considerando ele como o Clark Kent. Não é o máximo em chamar atenção nas ruas (compre um Audi TT para isso), pois a maioria acha que você simplesmente pegou seu BMW e o levou a uma loja de tuning. Só entendidos entenderão.
Usar o M2 na cidade requer um pouco de desapego - dele e de você mesmo, pois a suspensão parece ter cimento no lugar das molas e maltrata os ocupantes. Uma simples tartaruguinha de divisória de pista se torna um "plac" no amortecedor e uma tremida na cabine. E nem adianta apelar para o modo Comfort no botão de ajuste da pilotagem. Ele não mexe uma vírgula na dureza do carro, muda apenas os parâmetros de motor e câmbio. Ou seja, no uso cotidiano, o M2 é seco no trato com o piso e tem direção pesada, mostrando que ele não fica muito à vontade nessa função. Pelo menos passa surpreendentemente bem pelas lombadas.
Fui pouco com o M2 ao escritório. Ele veio para teste num feriadão de quatro dias (oba!), mas, acreditem, choveu em todos eles (uhhh). Não que eu tenha deixado de rodar por causa da água, mas você não vai querer acelerar um carro que tem 370 cv despejados no eixo traseiro num piso escorregadio. Então fiquei só na avaliação urbana, umas aceleradinhas aqui e ali, avaliação de porta-malas no mercado... Definitivamente, não é carro para tarefas cotidianas. Suspensão de pedra, portas pesadas, acesso difícil ao banco traseiro e um consumo que não passa dos 6 km/l em circuito urbano.
Eis que, no fim do feriado, a chuva estiou e o sol apareceu embelezando o fim de tarde. Não tive dúvidas: corri para a garagem e levei o M2 para a estrada. Já saí no modo Sport de condução. Direção e suspensão não mudam, mas o câmbio DCT passa a fazer trocas somente com giro alto e aceita reduções mais fortes (a caixa é tão rápida que chega a ser brusca nas mudanças). Basta uma triscada no acelerador para que as marchas sejam engolidas para baixo e o cupê dispare. O motor "seis bocas" é um canhão em médias e altas rotações, mas é preciso conter o ânimo para não estourar os pontos na CNH. O bom é que, nos 120 km/h legais da rodovia, o conta-giros aponta pouco mais de 2 mil rpm e o ruído é baixo. Mesmo aumentando o ritmo, o propulsor segue silencioso, sem aquela "provocação" de fazer você querer acelerar mais e mais - acho até que eu trocaria o escape por um mais nervoso caso o carro fosse meu. Andando numa boa, o consumo passa dos 11 km/l.
Mas claro que não fiquei olhando quase quatro dias para o M2 na garagem para enfim sair para a "maldade" e ficar medindo consumo. Peguei logo uma saída da rodovia para uma estradinha tortuosa e sem rumo. M2 é pra isso, curtir o caminho, não exatamente o destino. Como já o tinha acelerado na pista Capuava durante o evento de lançamento, fiquei confiante para passar ao modo Sport+, no qual o controle de estabilidade é parcialmente desativado.
A primeira atitude agora foi desenhar o contorno das curvas o mais corretamente possível, para aproveitar a tocada do M2. Minha brincadeira era tentar fazer o ESP atuar o mínimo possível, ou seja, tocar limpo para não ser corrigido pela eletrônica. Aí a suspensão e a direção firmes fizeram todo o sentido. A carroceria quase não rola (bem menos que o já estável M235i), mesmo com os pneus já desgarrando, e o volante comunica bem o que está se passando no piso. É ótimo para você ter a sensibilidade exata para a entrada de curva, coisa que o M2 faz com maestria. O nariz é ágil e muito preso ao chão, lembrando que o eixo dianteiro só tem a missão de direcionar o carro, e não a de tracioná-lo.
A aderência imensa do trem frontal e os freios fortíssimos (dos melhores que já testamos) fazem com que você queira carregar o máximo de velocidade para dentro das curvas, mas é besteira abusar disso porque fatalmente o M2 vai arrastar a dianteira, mesmo que um pouco, e o ESP vai atuar e fazer você perder velocidade. O ideal é reduzir um pouco mais antes de apontar o volante, e aí sim voltar a reacelerar brincando com o eixo traseiro. Fiz isso, mas o ESP ainda estava atuando nas saídas, mostrando que o M2 estava jogando mais força para o chão do que ele tinha capacidade de tracionar (mesmo com o diferencial traseiro autoblocante, que distribui a força para a roda com melhor tração).
Foi então que desliguei totalmente o ESP. Aí, amigo, a traseira entra em modo "dançarina" e chama você para bailar. É acelerar, frear, reduzir pelas pontiagudas borboletas do câmbio, entrar na curva, voltar a acelerar e, uuoopa, chamar volante no contra-esterço. Ou basta virar o volante e acelerar para fazer presepada e ver fumaça subir. Impressiona como o M2, mesmo nervoso, também é dócil na transição de direção e na correção da rabeada, tornando esse exercício viciante. Muito bem, BMW M!
Nessa toada, nem preciso dizer que perdi a noção do tempo nas incontáveis curvas do caminho, até que a luz foi embora e fiquei só com os faróis bixenônio do M2 - que iluminam muito bem, por sinal. Mas o dia estava ganho, os pneus tinham uma camada a menos de borracha e o tanque estava esvaziando. Voltei para o modo Comfort e resolvi deixar o restante da gasolina para voltar para casa.
Após matar a vontade de acelerar, me liguei um pouco mais no restante do M2. Por dentro, é basicamente um Série 2 com acabamento mais esportivo, com uma manta estilo fibra de carbono no painel e os comandos no mesmo lugar de qualquer BMW. É um pouco desatualizado, se a gente comparar com o que a Audi e a Mercedes estão fazendo na cabine de seus carros, e até um tanto simples para um carro de R$ 380 mil.
Mas o M2 é isso. Tudo nele foi investido no sentido de melhorar a experiência de pilotagem. Está podendo comprar um brinquedão desses para se divertir no fim de semana? Manda bala. Ele custa mais que um Porsche 718 Cayman de entrada, mas justifica a diferença com mais potência e o ronco inconfundível do 6-cilindros (lembre-se de que o Cayman agora só tem 4...). Quer algo menos radical para curtir em todos os momentos? Um M235i usadinho vai muito bem, e ainda custa quase metade!
Fotos: Rafael Munhoz
MOTOR | dianteiro, longitudinal, seis cilindros em linha, 24 válvulas, 2.979 cm3, turbo de duplo fluxo, injeção direta, gasolina |
POTÊNCIA/TORQUE | 370 cv a 6.500 rpm / 47,4 kgfm entre a 1.450 e 5.560 rpm |
TRANSMISSÃO | automatizada de dupla embreagem e 7 marchas; tração traseira com diferencial autoblocante |
SUSPENSÃO | independente Multilink na dianteira e na traseira |
RODAS E PNEUS | alumínio aro 19" com pneus 245/35 R19 na frente e 265/35 R19 atrás |
FREIOS | discos ventilados na dianteira e traseira, com ABS e ESP |
PESO | 1.595 kg em ordem de marcha |
DIMENSÕES | comprimento 4.468 mm, largura 1.854 mm, altura 1.410 mm, entre-eixos 2.693 mm |
PORTA-MALAS | 390 litros |
PREÇO | R$ 379.950 |
Aceleração | ||
0 a 60 km/h | 2,7 s | |
0 a 80 km/h | 3,6 s | |
0 a 100 km/h | 4,8 s | |
Retomada | ||
40 a 100 km/h em S | 3,3 s | |
80 a 120 km/h em S | 2,8 s | |
Frenagem | ||
100 km/h a 0 | 34,8 m | |
80 km/h a 0 | 22,3 m | |
60 km/h a 0 | 12,7 m | |
Consumo | ||
Ciclo cidade | 6,0 km/l | |
Ciclo estrada | 11,2 km/l |
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