"Encosta ali, por favor", diz o policial rodoviário. Depois de uma bela "secada" no carro, ele caminha em direção a janela e pede documento e habilitação. Uma rápida conferida e retorna com perguntas: "Esse carro ainda não está nas lojas, né? Bonito... É bom? É Honda, né, deve ser bom. Anda bem?". Sim, o guarda só queria conhecer o HR-V. Além desta abordagem, foi comum durante o test-drive de lançamento do novo Honda certas "perseguições" para conferir de perto a novidade. O cheiro do sucesso está no ar. Quer saber se o aguardado Honda HR-V é tudo isso mesmo? É o que vamos contar agora.
O que é?
Novo SUV da Honda (na verdade mais crossover), o HR-V chega ao mercado com pompa e circunstância. Pompa porque a Honda já conquistou uma reputação de qualidade por aqui e circunstância porque se trata do segmento mais agitado ultimamente, não só no Brasil, mas no munto inteiro. Tanto que o HR-V é um carro global e chega com o mesmo acabamento que vimos em janeiro no Salão de Detroit e que estava também em na mostra de Genebra, ou seja, de primeira linha para as três versões (LX, EX e EXL). Tirando o painel de dois andares do Civic, o dono do HR-V se sentirá mais privilegiado dentro dele do que no sedã. O painel tem material macio ao toque e é revestido de couro na porção central. A montagem é muito bem feita em todos os pontos, sendo a única exceção um parafuso aparente e a borracha de vedação que se vê ao abrir as portas dianteiras. Por falar em portas, há tecido em toda a área acima do apoio de braço (em couro), de forma que nenhum plástico fica aparente.
O console central "flutuante" dá um aspecto mais sofisticado ao interior, além de trazer porta-objeto com descansa braço, porta-copos e uma interessante área vazada, que agrega espaço adicional e abriga de forma discreta as entradas USB (duas na EXL), HDMI (só na EXL), AUX e 12V.
O recheio é interessante para toda linha. De série, o HR-V vem equipado com direção elétrica de assistência progressiva (EPS), ar-condicionado, vidros elétricos nas quatro portas com função um toque, sistema de som com USB e Bluetooth para telefonia e áudio streaming com comandos no volante, freio de estacionamento elétrico, sistema brake hold (mantém o freio acionado quando o carro para), banco do motorista com regulagem de altura, bancos traseiros com encostos reclináveis, bipartidos (60/40) e sistema de rebatimento ULT, computador de bordo, duplo airbag (quatro na EXL), freios a disco nas quatro rodas com ABS e EBD, HSA (assistente de partidas em aclive), sistema VSA (controles de tração e estabilidade), Isofix no banco traseiro e ESS (Emergency Stop Signal). Por outro lado, a Honda deixou de lado itens como acionamento automático dos faróis e limpadores. Também não há nada de LEDs para iluminação diurna, nem o cobiçado teto-solar.
Outro destaque do HR-V em relação aos concorrentes é a flexibilidade de aproveitamento do espaço interno. Aqui a sacada da Honda foi oferecer o sistema ULT, o mesmo do Fit, no SUV. Este sistema possibilita rebater os bancos traseiros, formando um amplo vão com capacidade para 1.100 litros, rebater parcialmente, ou ainda, levantar os assentos traseiros. Isso se os bons 437 litros do porta-malas já não forem suficientes.
Interior bacana, ampla lista de itens de série, amplo espaço e diversas possibilidades para ampliar a capacidade. E o visual? Mais um ponto para a Honda. Tomando como base uma mistura de cupê com utilitário, a marca japonesa conseguiu criar um carro que deve agradar consumidores de vários segmentos. Todas as linhas do HR-V possuem continuação, como a área envidraçada que segue inclinação do teto, retorna pela coluna C formando o vinco lateral e prossegue até a principal linha do para-choque. As maçanetas das portas traseiras são elevadas e escondidas no tal desenho da coluna C, como no Alfa Romeo 156. É um dos destaques do estilo.
Na traseira as lanternas de formato bumerangue são generosas e trazem LEDs. Elas ficam "dentro" do vinco em U que percorre toda a tampa. O para-choque tem traços que prosseguem pela linha lateral baixa da carroceria e termina na base dos faróis de neblina. Completam o visual as rodas de 17 polegadas de liga-leve com acabamento diamantado e interior com pintura preta. A única exceção é a versão LX, que terá rodas de aço na mesma medida e "inovará" com as maiores calotas do mercado - aro 17"!
Como anda?
Plataforma do Fit/City com motor do Civic tem sabor do quê? A Honda diz que a plataforma do HR-V é praticamente uma nova, pois apesar de ter como base a do Fit/City, é um pouco mais longa e recebeu diversos elementos do Civic. O resultado é que o gosto não ficou parecido nem com os dois modelos menores e nem com o sedã, mas tem alguns dos temperos deles. E isso é bom.
Ao entrar na cabine, a identificação maior é com o City, principalmente por conta do painel de instrumentos com grafismos brancos iluminados por LEDs, o que garante boa leitura em qualquer nível de luminosidade. Por falar nele, o aro central pode ser personalizado com sete cores e traz mudança dinâmica para o verde quando a condução está beneficiando o consumo. Já o volante remete ao Civic, compacto e de boa pegada. Os bancos tem apoios firmes e levemente pronunciados, o que dá um toque mais esportivo. A posição de dirigir é ligeiramente acima de um hatch médio e um pouco mais baixa do que um utilitário "padrão". Isso é reflexo do posicionamento do tanque de combustível abaixo dos bancos dianteiros, acerto que possibilitou o uso do sistema ULT dos bancos.
Começo a avaliação, que teve de cerca de 300 quilômetros entre estradas e via urbanas na região de Brasília, a bordo da versão top de linha EXL. Todas são equipadas com o mesmo motor emprestado do Civic, o 1.8 i-VTEC, mas que devido a ajuste diferente, entrega 139 cv com etanol e 140 cv na gasolina - isso mesmo, ao contrário do que costuma ocorrer a maior potência é atingida com o combustível fóssil. O acabamento interno pouco difere dos demais, a não ser pela central multimídia com tela de 7 polegadas multi-toque, ou seja, dá para ampliar e reduzir com dois dedos. Mesmo na versão topo de gama e que beira os R$ 90 mil, a ignição é na chave, diferente da exposta em Detroit que era por botão.
Em velocidades urbanas, o rodar do HR-V é confortável e o nível de ruído é baixo. O câmbio CVT, como esperado, oferece aceleração linear e deixa o giro baixo na maior parte do tempo. O crossover é suficientemente ágil na cidade, mas todo o conforto do CVT cobra seu preço quando precisamos de mais desempenho. Pisando com mais vontade no acelerador, o giro do motor passa a barreira dos 4.000 rpm e o ronco contínuo passa a incomodar. Claro, dificilmente alguém irá ficar com o pé chumbado e fazendo o motor girar desta forma, mas em ultrapassagens, retomadas ou simplesmente para embalar terá que conviver com isso. Outro detalhe é o ruído de rodagem dos pneus, que passa a incomodar em velocidades mais elevadas. Se tivesse um câmbio automático convencional, talvez formasse um conjunto mais interessante, mas a boa acolhida do CVT na linha Honda deve ter pesado na escolha.
A direção elétrica é direta e bem comunicativa, como no Civic. Em todas as versões, ela traz o MA-EPS, dispositivo que favorece ou enrijece o esterço da direção quando o carro começa a sair da trajetória em uma curva. Nesta versão de topo, diferente das demais, o câmbio CVT possui a opção Sport e sete marchas simuladas que podem ser trocadas pelas borboletas no volante. Em determinado ponto, reduzi ao máximo possível para retomada de velocidade. No entanto, mesmo ao comando manual, a marcha avançou quando o motor chegou a 6.000 rpm. Ou seja, o temperamento esportivo não é forte, ficando o conforto e economia de combustível como prioridades.
Olhando apenas pelo lado técnico, a suspensão é "feijão com arroz", trazendo o tradicional sistema McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira. Mas, surpreendentemente, foi o quesito que mais me impressionou no HR-V. Tanto para contornar uma rotatória de forma mais vigorosa quanto para filtrar as ondulações e buracos típicos do Brasil, mesmo com rodas aro 17" e pneus de perfil baixo (215/55). Numa condução mais arrojada, mesmo entrando forte nas curvas, a sensação é de ter o carro na mão todo o tempo, com pouca inclinação da carroceria e boa aderência. Vale lembrar ainda que se exagerar na dose, há o controle de estabilidade para ajudar.
Para quem gosta de cambiar, haverá a opção do manual de seis marchas na versão de entrada, mas os interessados terão que se esforçar para encontrá-la, pois responderá por apenas 1% do volume de produção.
Quanto custa?
O Honda HR-V terá quatro configurações, mas a de entrada manual será bem rara. A gama começa com a versão LX, a que vem com calotão e câmbio manual de seis marchas por R$ 69.900 (foto acima). Com o mesmo acabamento e câmbio CVT, o preço salta para R$ 75.400. Nesta versão, o sistema de áudio é mais simples, tipo 2DIN, sem tela LCD.
A opção intermediária, EX, tem mais recheio e apelo visual mais interessante. Por R$ 80.400, adiciona rodas de liga leve com aro de 17 polegadas, câmera de ré, faróis auxiliares de neblina, setas integradas nos retrovisores, rack de teto, volante com acabamento de couro, áudio com visor LCD de 5 polegadas, limpador de para-brisa com intermitente variável, piloto automático (cruise control), duas tomadas 12 V e volante com ajustes do som.
A Honda espera que quase a metade dos compradores opte pela versão topo de gama. Assim, destinará 46% de sua produção para o HR-V EXL, que custa R$ 88.700. A única diferença externa são as maçanetas cromadas. Por dentro, os bancos são de couro e o ar-condicionado digital é full touchscreen, ou seja, não há botões, apenas uma tela sensível ao toque que possibilita os ajustes da climatização. Também traz a nova central multimídia de 7 polegadas multi-toque. Esta central tem GPS que traz informações de trânsito (inicialmente, das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e ) e entrada HDMI para espelhamento do smartphone. Este espelhamento permite visualizar integralmente o que está no celular na tela da central, reproduzindo imagens, vídeos, músicas e até mesmo aplicativos. O som também recebe o incremento de dois tweeters. No quesito segurança, o número de airbags sobe para quatro com a adição dos laterais para motorista e passageiro.
O Honda HR-V veio para causar mesmo. Você pode questionar a falta de um mimo aqui, um LED ali ou preço mais camarada - embora esteja bem inserido no segmento. O fato é que a Honda conseguiu construir uma reputação tão sólida nos outros segmentos que certamente dará muita dor de cabeça para os concorrentes entre os crossovers compactos. A expectativa é de vender até o fim deste ano nada menos do que 50 mil unidades. Isso significa passar à frente do atual líder do mercado, o Ecosport, além não se preocupar com os futuros concorrentes Jeep Renegade e Peugeot 2008. A aposta é tão ousada que para conseguir entregar tudo isso precisará aliviar o ritmo de produção do Civic, Fit e City e ainda por cima contar com uma forcinha de sua fábrica na Argentina até que a nova planta de Itirapina comece a operar.
Será que vai reinar? A aposta é de que provavelmente sim. O seu posicionamento, desenho e proposta abrangem um leque muito amplo de consumidores. Desta vez não há um esteriótipo definido, como é um carro masculino ou feminino, ou algo como um aventureiro urbano. Há soluções de minivan, estilo inspirado num cupê e a boa dirigibilidade. Junte isso ao nome Honda. O lado bom, como em toda a concorrência, é que fará os demais competidores a oferecerem um algo mais ou preços mais atrativos para conseguir desviar os olhares do novo rival japonês.
Por Fábio Trindade, de Brasília (DF)
Viagem a convite da Honda
Ficha Técnica: Honda HR-V 2015
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, 1.799 cm3, flex; Potência: 140 cv a 6.500 rpm com gasolina e 139 cv a 6.500 com etanol; Torque: 17,3 kgfm a 4.800 rpm (G) / 17,4 kgfm a 5.000 (E)rpm; Transmissão: manual de seis marchas ou automática CVT com conversor de torque, tração dianteira; Suspensão: McPherson na dianteira e eixo com barra de torção na traseira; Freios: discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira com ABS e EBD, Rodas: aço aro 17″ na LX MT / liga leve aro 17" nas demais; Peso em ordem de marcha: 1.265 kg (MT)/ 1.270 kg (CVT); Capacidades: porta-malas 437 litros, tanque 51 litros; Dimensões: comprimento 4.294 mm, largura 1.772 mm, altura 1.586 mm, entre-eixos 2.610 mm
Fotos: Honda HR-V 2015
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