Uma voltinha em um shopping de Hangzhou e… olha lá uma loja da Leapmotor! Vamos conferir os carros de perto, já que essa marca chinesa logo se tornará conhecida dos brasileiros, por meio do grupo Stellantis.
Antes de entrar, vale uma apresentação: a Zhejiang Leapmotor Technology tem sede em Hangzhou, linda e acolhedora cidade de 12 milhões de habitantes que é capital da província de Zhejiang (citada no nome da fábrica). Fica a 180 km de Xangai.
Leapmotor T03
As origens remotas da Leapmotor datam de 1993, quando os empreendedores Fu Liquan e Zhu Juangming montaram uma pequena fábrica de walkie-talkies em uma escola desativada. Anos depois, eles aumentaram a área de atuação, passando a fazer interfones e câmeras de segurança. O negócio acelerou junto com o avanço da construção civil da China - nascia aí a Dahua Technology, especializada em equipamentos de vigilância eletrônica.
Atento às políticas do governo para incentivar veículos elétricos, Zhu Juangming decidiu aventurar-se na indústria automobilística. Em 2015, criou a Lingpao Automobile Co. Ltd. (Leapmotor em inglês), que tinha como primeira financiadora a Dahua. A startup montou uma fábrica, mostrou seu primeiro modelo, o cupê Leapmotor S01, mas ainda não tinha autorização para produzir e vender carros.
A solução mais prática para driblar a falta da licença foi unir-se à fábrica de ônibus elétricos Changjiang. Os cupês S01, contudo, nada tinham a ver com o gosto do motorista chinês. Por sorte, em um canto da fábrica da Changjiang, havia o protótipo do subcompacto urbano eCool, que jamais entrara em produção. Era o carro que a Leapmotor precisava.
Leapmotor T03
Com alguns retoques, o Changjiang eCool foi transformado no Leapmotor T03. Estávamos, contudo, em 2020 - ano em que o mundo parou por causa da Covid-19, o que levou a Changjiang à falência. Zhu Juangming partiu então para um plano B: comprou uma velha fábrica de picapes e, com isso, finalmente obteve sua licença para produzir veículos nas instalações de Hangzhou.
Traseira do Leapmotor T03
Superados os percalços iniciais, a Leapmotor pôde concentrar-se nos produtos e na tecnologia Lingxin 01, que controla os sistemas básicos de funcionamento dos carros, bem como os ADAS. Esse dispositivo foi desenvolvido em parceria com a Dahua.
Depois de lançar o modesto T03, a empresa evoluiu para SUVs elétricos maiores e mais luxuosos, bem ao gosto dos consumidores chineses de hoje. É o caso dos modelos C10, C11 e C16. De toda a linha atual, só não vimos na loja o sedã grande C01.
Hoje, 70% do desenvolvimento de um carro elétrico é software - e não demorou para que as marcas ocidentais, patinando em seus projetos eletrificados, buscassem parceiras na China. O grupo Volkswagen bem que tentou um acordo com a Zhejiang Leapmotor Technology (por meio da FAW-VW), mas quem conseguiu fechar negócio foi a Stellantis, que comprou 21% das ações da companhia chinesa.
Com isso, foi criada uma joint venture, a Leapmotor International (em que a Stellantis detém 51% de participação), especificamente para vender os carros elétricos da marca chinesa na Europa e em países como Brasil, Chile, Índia, Turquia, Israel, Tailândia, Malásia, Austrália e Nova Zelândia. Os carros para o mercado europeu serão montados na Polônia (o Leap T03 já está em produção por lá). É uma forma rápida de fazer frente à expansão mundial da BYD.
Há duas semanas, a joint venture nomeou um responsável para a América do Sul e muitos executivos de marcas do grupo Stellantis já estão de mudança para a Leapmotor. Enquanto os elétricos da marca chinesa não chegam, voltemos ao shopping de Hangzhou para vê-los de perto.
A primeira impressão diante do subcompacto da Leapmotor é decepcionante. Visualmente, lembra um Daihatsu Cuore 1995 ligeiramente crescido e submetido a um facelift para encarar o mercado em 2024. A tomada para recarga bem no meio do nariz achatado dão ao carro um ar de porquinho da índia assustado. O contraste visual com os modelos chineses mais recentes é brutal.
Leapmotor T03
Com 3,62 m de comprimento e 2,40 m de entre-eixos e 210 litros de capacidade do porta-malas, o T03 é, em quase tudo, menor que um Renault Kwid E-Tech. A vantagem do chinesinho está no teto uns 10 cm mais alto, o que dá aos passageiros uma sensação de cabine maior e mais arejada. Há cintos de segurança para quatro ocupantes.
Já o acabamento interno nos lembrou os primeiros Celta, pela quantidade de plásticos rígidos e rusticidade da forração dos bancos. Não fossem a tela multimídia (de 10,1”), o colorido quadro de instrumentos digital e o seletor da transmissão na coluna de direção, poderíamos estar em um carro popular de 15 anos atrás. Provavelmente, a versão do T03 que chegará ao Brasil será a topo de linha, que traz acabamento um pouco mais caprichado, com material sintético furadinho nos bancos, e até opção de teto solar.
Interior do Leapmotor T03
A parte boa é que o T03, como todo carro chinês, é bem equipado. Na China, os T03 dispõem até de Wi-Fi embarcado. Todas as versões vêm com indicador de pressão dos pneus, câmera e sensor de ré e ar-condicionado com ajuste digital. As configurações intermediária e topo de linha têm freios a disco nas quatro rodas, rodas de liga de alumínio (15”) e cruise control.
Interior do Leapmotor T03
Todos os T03 têm motor e tração dianteiros. A maior diferença está em potência e torque, bem como na bateria. No básico, são 54 cv e 9,8 kgfm, com bateria de 21,6 kWh para autonomia de meros 200 km (isso pelo ciclo chinês CLTC, o mais otimista de todos…). No T03 intermediário, são 75 cv e 11,6 kgfm, com bateria de 31,9 kWh e autonomia de 310 km. No topo de linha, são ótimos 108 cv e 16,1 kgfm, com bateria de 41,3 kWh e autonomia de 403 km (sempre no ciclo CLTC, lembre-se).
O que realmente inviabilizaria a venda desse subcompacto no Brasil - mesmo em sua versão topo de linha - é a velocidade máxima limitada a 100 km/h, nas três versões, segundo a ficha técnica da própria Leapmotor.
Lateral do Leapmotor T03
Na China, os preços do T03 vão de 49.900 a 69.900 yuan (na conversão direta, de R$ 39 mil a R$ 53.600). Como referência, o rival BYD Seagull, modelo vendido no Brasil com o nome de Dolphin Mini, custa de 69.800 a 85.800 yuan na China (ou seja: de R$ 53.500 a R$ 66 mil).
Mesmo sendo mais barato, o T03 está longe de ser um sucesso. Em 2023, teve apenas 38.454 exemplares emplacados na China, ficando em 152º lugar no ranking de vendas do país. Para comparação, o BYD Dolphin Mini vendeu 239.270 unidades, ocupando o 10º lugar no ranking.
Para o Brasil, o melhor mesmo seria apostar nos modelos maiores da marca - que não parecem pertencer ao mesmo século nem ao mesmo fabricante do T03. Na loja da Leapmotor vimos três SUVs: o C10, o C11 e o C16, todos com acabamento de ótimo nível.
Visual dianteiro do Leapmotor C10
Começamos pelo C10, atualmente o modelo mais vendido da marca. É um dos lançamentos mais recentes da Leapmotor (setembro de 2023) e foi escolhido para ser um dos primeiros oferecidos globalmente, junto com o T03.
Esse SUV tem diversas versões, tanto puramente elétricas quanto com um extensor de autonomia (E-REV, com um motor a combustão que funciona apenas como gerador). Os preços na China vão de 128.800 a 168.800 yuan (R$ 100 mil a R$ 130 mil, pelo câmbio atual), competindo diretamente com o BYD Yuan Plus. Como referência, esse modelo da BYD hoje custa entre R$ 230 mil e R$ 236 mil no Brasil.
Inspiração no Porsche Cayenne? Traseira do Leapmotor C10
Com o C10, a briga da Leap com a BYD fica bem mais equilibrada, a começar pelo design. A carroceria do C10 chama a atenção por não ter vincos: é tudo liso. São linhas limpas e suaves como as de um mouse de computador - o problema é que, com isso, perde-se personalidade e identificação. Os grandes cortes bem verticais nas extremidades do para-choque dianteiro, com passagem de ar para os freios, são a melhor forma de diferenciar o C10 de seu irmão mais velho, o C11. As maçanetas são embutidas, uma onda que começou na Jaguar Land Rover e tomou a China. Tanto os faróis quanto as lanternas traseiras são unidos por barras de leds.
Com 4,74 m de comprimento e 2,82 m de entre-eixos, o C10 é bem maior do que um Jeep Compass (4,40 m e 2,63 m), fazendo uma comparação dentro do grupo Stellantis. Também supera com folga as dimensões do BYD Yuan Plus (4,45 m e 2,72 m). Com isso, o espaço interno torna-se um dos grandes atrativos do modelo da Leapmotor.
Interior do Leapmotor C10
Somos recebidos em um ambiente forrado com muito capricho e ótimos materiais, sem plásticos rígidos aparentes. Há iluminação por leds, um console alto e, por todos os lados, incontáveis porta-trecos. O visual é futurista e sem firulas, mas já caiu no lugar comum, com quadro de instrumentos digital (10,2”), uma grande tela multimídia de alta definição (14,6”) e uma faixa central iluminada dominando o ambiente.
Também valem registro os bancos dianteiros muito cômodos, com ajustes elétricos, aquecimento e ventilação. Um detalhe: o sistema de reconhecimento facial personaliza automaticamente a regulagem do ar-condicionado, do banco, dos retrovisores e da coluna de direção para oito motoristas diferentes.
Banco traseiro do Leapmotor C10
São cinco lugares e sobra lugar para as pernas de quem viaja no banco de trás. Mesmo com um teto panorâmico - outro recurso que vem sendo muito adotado pelos chineses - a cabine é alta e sem aperto. O encosto traseiro é reclinável em duas posições. Aliás, todos os encostos são rebatíveis, podendo formar uma cama king size.
A plataforma, chamada de Leap 3.0 Architecture, é a mais moderna da marca, com tecnologia CTC, em que a bateria é parte estrutural do carro, integrada ao chassi. Esse tipo de arranjo - criado pela Tesla - traz ganhos na rigidez torsional e no espaço da cabine, além de redução no número de componentes e de peso. O motor elétrico é refrigerado a óleo.
Um poderoso processador Qualcomm Snapdragon 8295 gerencia a inteligência artificial do carro, com todos os ADAS possíveis, e sua central multimídia. Além de trabalhar com a americana Qualcomm, a Leap tem feito parcerias com empresas como NVIDIA, ZF, Bosch e NXP para desenvolver a tecnologia de seus carros. Essa nova plataforma será usada em cinco lançamentos da marca chinesa nos próximos anos.
Traseira do Banco traseiro do Leapmotor C10 lembra Porsche Cayenne
Nos atuais carros chineses, a eletrônica tem importância muito maior que a mecânica, mas ainda damos valor a essas coisas. Todos os C10 têm motor elétrico e tração traseiros. Levam suspensão McPherson na dianteira e multilink atrás. Saem de série com pneus 235/55 R18 e há 245/45 R20 como opcionais.
Em todas as versões, o motor elétrico rende 213 cv de potência e 32,6 kgfm de torque, o que permite ao C10 acelerar de 0 a 100 km/h em menos de 8 segundos e alcançar a máxima de 170 km/h. O que muda é a autonomia de cada configuração.
Nos C10 equipados com gerador a combustão (1.5 turbo a gasolina, de 95 cv, alimentando uma bateria de 28,4 kWh), a autonomia puramente elétrica é de 210 km, enquanto a autonomia combinada é de 1.190 km, sempre pelo ciclo CLTC. O motor a combustão não tem conexão com as rodas. Nos C10 puramente elétricos, as baterias são de 52,9 kWh ou 69,9 kWh, com alcance de 410 km ou 530 km (CLTC).
O crossover C11 também pode ser puramente elétrico ou, como é comum na China, ter um extensor de autonomia. Por fora, o modelo se parece muitíssimo com o C10, mas suas colunas traseiras são mais inclinadas. Na dianteira da versão com gerador há uma discreta mas estilosa entrada de ar que, em conjunto com o formato dos faróis e o desenho do parachoque, dá ao C11 branco que vimos uma cara de stormtrooper, soldado do Império em Star Wars.
Leapmotor C11
Até no comprimento total (4,78 m) os dois carros são semelhantes. A maior diferença está no entre-eixos de 2,93 m (11 cm mais longo que o do C10). É um dado curioso, já que o C11 foi lançado dois anos antes, em setembro de 2021, e tem plataforma mais antiga.
Na China, os C11 custam entre 148.800 e 205.800 yuan (de R$ 115 mil a R$ 159 mil, na conversão direta). Ou seja: em preços, os C11 estão um degrau acima dos C10. Isso pode ser percebido ao entrar no carro e encontrar materiais ainda mais nobres e vistosos.
Interior com 3 telas do Leapmotor C11
O que realmente chama a atenção, contudo, são as três telas no painel: uma de 10,2” no quadro de instrumentos, uma central grandona, de 14,6” como multimídia e outra de 10,2” na frente do carona, formando um conjunto elegante e simétrico (a tela do carona, contudo, seria proibida no Brasil). Nota-se que os projetistas de carros elétricos estão mais preocupados com conectividade online do que, propriamente, com a interação com o carro em si.
Recentemente, o C11 ganhou o chip Qualcomm Snapdragon 8295 (usado no C10) para o gerenciamento da multimídia. As versões mais caras trazem ainda um chip NVDIA Orin-X, radares com mais definição e um Lidar para ampliar os recursos de condução semiautônoma.
Leapmotor C11
As versões mais simples têm um motor elétrico traseiro de 272 cv, com ou sem extensor de autonomia, mas o C11 sai também em uma configuração com dois motores elétricos (um em cada eixo), tração integral e potência combinada de 544cv.
Nos carros com gerador, a autonomia varia de 200 a 300 km, no modo puramente elétrico, a 1.005 km, no modo combinado. Já nos carros sem extensor de autonomia, o alcance anunciado é de 580 km (no otimista ciclo CLTC, lembre-se…).
O maior dos carros no showroom era um Leapmotor C16 cinza grafite. Lançado em junho, o modelo tem lugar para seis ocupantes, em três fileiras de bancos. Nas duas primeiras filas, os assentos (poltronas de classe executiva, melhor dizendo) são individuais e com ajustes elétricos; na última, banco é inteiriço. Nas versões intermediárias e topo de linha, todos a bordo têm direito a saídas individuais de ar-condicionado. E, mesmo na básica, há dois tetos solares.
Traseira do Leapmotor C16
Com 4,91 m de comprimento e 2,82 de entre-eixos, o C16 é um carro visivelmente maior que o C10 e o C11. Além disso, sua traseira tem um corte mais reto. O luxo a bordo inclui uma grande tela escamoteável (15,6”) que desce do teto, para entretenimento de quem vai nos bancos do meio e de trás. O som traz o envolvente sistema Dolby Atmos, com alto-falantes no teto.
Interior do Leapmotor C16
Diferentemente do que se vê no C11, no painel do C16 só há duas telas. Na versão topo de gama, temos câmeras, radares e 30 sensores, além de um Lidar de 128 linhas, para “enxergar” o mundo ao redor. Com tudo isso e mais um chip Nvidia Orin X, o carro torna-se, teoricamente, um semiautônomo nivel 3, em que o motorista pode largar o volante na maior parte do tempo.
Interior do Leapmotor C16 tem até tela no teto
Nas versões com extensor de autonomia, o gerador é aquele 1.5 turbo dos outros modelos da Leap. O que traciona o C16 é um motor elétrico traseiro, de 231 cv, alimentado por uma bateria de 28,4 kWh. Em modo elétrico, o carro faz 200 km e a autonomia combinada é de 1.095 km.
Segunda e terceira fileira do Leapmotor C16
Já as versões puramente elétricas têm um motor de 292 cv, e bateria maior, de 67,7 kWh - suficiente para teóricos 520 km pelo ciclo CLTC. O sistema de 800V permite uma recarga de 30 a 80% em 15 minutos, desde que haja um carregador à altura.
Leapmotor C16
O melhor é que o C16 está na mesma faixa de preços do C11: seus preços começam em 155.800 e vão a 185.800 yuan. Sim, os chineses pagam de R$ 120 mil a R$ 143 mil por isso tudo.
Esqueça o T03… Com o trio C10, C11 e C16, a Stellantis poderá entrar para valer na guerra dos carros elétricos, usando munição bem mais pesada que seus Peugeot e-208 GT e Fiat 500e. Agora é ver se o grupo saberá vender os modelos da Leapmotor em nosso mercado.
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