Lembra daquela história de a Volkswagen vender um monte de carros elétricos nos próximos anos? Hoje ela esclareceu melhor a história e deu nome a seus planos futuros. Tudo que tem nome próprio ganha mais força, como o episódio do Dieselgate mostra bem. Se a Ford chamou seu plano de globalização de "One Ford" e a PSA chamou o seu de "Push to Pass", o da Volkswagen foi batizado de "Transform 2025+". E ele é muito mais estruturado e complexo do que apenas vender elétricos.
A primeira notícia, que pegou um monte de gente de surpresa, foi o anúncio de um corte de pessoal de 30 mil pessoas na semana passada. Desses 30 mil futuros desempregados, 23 mil estão na Alemanha. Isso representa 20% de todos os empregados da empresa em sua sede (120 mil, de um total de 610 mil em 31 países). Ninguém sabia, mas o corte era a primeira parte do plano e, surpresa, contou com a concordância do forte sindicato local. Ele servirá não só para gerar caixa para pagar pelo Dieselgate (US$ 15 bilhões só nos EUA), mas também para investir na estratégia de carros elétricos. Todos eles serão feitos na Alemanha e estes veículos devem gerar 9 mil novos empregos, o que recupera em parte os empregos perdidos. As 7 mil vagas que precisarão ser cortadas virão de outras filiais. E a brasileira só escapa se estiver muito bem na fita.
Serão três etapas para o plano. Até 2020, a primeira etapa exigirá uma reestruturação do negócio-base da marca e o desenvolvimento de novas competências. Isso é meio hermético até você ver o detalhamento deste palavrório.
Primeiro, haverá uma ofensiva de SUVs. Segundo, um movimento em direção ao topo de cada segmento. Em outras palavras, a Volkswagen vai se livrar de modelos de baixa rentabilidade para se focar nos que dão mais lucro. Em 2015, a margem da empresa ficava em cerca de 2 por cento. Em 2020, ela pretende dobrar essa margem para 4 por cento. A meta para 2025 é de uma margem de lucro de 6%. Por fim, a Volkswagen quer mudar sua cultura. Conhecida por ser centralizadora e punitiva, a empresa pretende fazer uma baita reforma organizacional. O objetivo é ter uma estrutura ágil, com estímulo ao espírito empreendedor, uma cultura de discussão mais aberta, modelos de trabalho mais flexíveis e, mais do que tudo, uma organização mais horizontal. Em suma, nenhum chefe que ameace cortar cabeças se o objetivo X não for atingido. Segundo Bob Lutz, em entrevista à revista Car and Driver, essa pode ter sido a principal razão para o Dieselgate.
Cada região em que a Volkswagen atua terá uma estratégia diferente. Nos EUA e na China, o Atlas e o Teramont são o primeiro exemplo da nova estratégia. Nestes mercados, não por acaso os dois maiores do mundo, o plano só é aparentemente igual.
Nos EUA, ela quer deixar de ser um fabricante de nicho para se tornar uma empresa de altos volumes. Para isso, ela vai mirar em SUVs e sedãs grandes em uma primeira etapa. Posteriormente, ela vai levar seus elétricos para Tio Sam. O plano é produzir por lá o primeiro modelo sobre a plataforma MEB (Modulare Elektrobaukasten, ou arquitetura modular elétrica) em 2021. Um exemplo do que pode ser lançado por lá é o I.D. Concept, que ilustra essa reportagem.
Na China, que tem meta de venda de modelos elétricos (8 por cento de todos os carros em 2018, 12 por cento em 2020) e um tremendo problema de poluição nas cidades, o foco será neles. Os SUVs também são importantes, mas a Volkswagen já é a marca mais vendida. E já está no topo de cada um dos segmentos em que atua. Meio caminho andado, portanto.
Para mercados emergentes, como Índia, América do Sul e Rússia, o foco serão produtos acessíveis. Mas com uma boa margem de lucro, ou seja, o topo dos modelos acessíveis (lembre-se da história das margens de lucro...). E modelos específicos, provavelmente desenvolvidos em plataformas simplificadas, como a MQB0, que deve dar origem à nova geração do Gol. Também devem surgir novos SUVs, aproveitando a onda favorável destes modelos, mas temos sérias dúvidas sobre os elétricos. Países com baixa taxa de automóveis por habitantes, como o Brasil, provavelmente ainda têm um longo caminho a percorrer antes da mudança de matriz energética.
A segunda etapa do "Transform 2025+", que começa em 2020 e vai até 2025, é a liderança no segmento de e-mobilidade. Aí entra aquela história de vender 1 milhão de elétricos em 2025. Mas não só. A Volkswagen quer oferecer "serviços de mobilidade" (entenda como car sharing, ou compartilhamento de automóveis) e uma plataforma digital para oferecer serviços. A Volkswagen estima ter 80 milhões de usuários em 2025, com um faturamento de 1 bilhão de euros provenientes apenas disso. É provável que a marca conte também com carros autônomos na oferta destes serviços de mobilidade. A conferir.
Por fim, na terceira fase do plano, o plano é ter um papel de destaque neste novo mundo de mobilidade. Em suma, ser líder deste mercado. Se a Volkswagen conseguir levar a cabo todas as etapas do Transform 2025+, especialmente a mudança de cultura e a descentralização de decisões, é bem possível que ela chegue, senão à sonhada liderança, pelo menos bem perto dela.
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