A Peugeot fez de novo: em vez de trazer o modelo de nova geração que já existe na Europa, reformulou o carro já existente na América Latina. Sim, você conhece essa história dos tempos do 207 nacional, que nada mais era que um face-lift do 206, enquanto do outro lado do Atlântico havia um 207 inédito de para-choque a para-choque. Desta vez a intenção da marca do leão era um pouco melhor: lançar o 308 reestilizado para em seguida trazer o 308 novo de verdade, importado da Europa. Só que a alta do dólar deu uma segurada nos planos e, ao menos por enquanto, vamos ficar apenas com o modelo renovado produzido na Argentina.
Não que o 308 atual ainda não tenha lenha para queimar, o problema é que sua faixa de preço o coloca de frente com as atuais referências do segmento (e atualizados com seus pares europeus), VW Golf e Ford Focus. Como o Volkswagen está para ser nacionalizado e terá mudanças de motor, câmbio e suspensão, ficamos neste momento apenas com o representante da Ford (que foi atualizado neste ano) para recepcionar o renovado Peugeot. Em sua versão topo de linha Griffe, equipada com motor 1.6 THP flex e câmbio automático de seis marchas, o 308 de R$ 82.990 encara o Focus intermediário, SE Plus Powershift, que tem motor 2.0 flex, câmbio de dupla embreagem e seis marchas e preço de R$ 83.500.
A reestilização da dianteira do 308 lhe deu a nova identidade visual da marca, com a grade destacada e o leão ao centro, enquanto os nichos dos faróis de neblina receberam um feixe de LEDs acima das luzes comuns. As rodas ganharam novo desenho e, atrás, as lanternas mantiveram o formato, mas agora com novo arranjo interno e luzes de LED. As formas gerais da carroceria seguem inalteradas, com ênfase na área envidraçada, como no antecessor 307, enquanto o novo 308 europeu já caminhou para o estilo do Golf e do Focus, com a linha de cintura elevada e janelas mais estreitas. Questão de gosto, mas não deixa de ser um indício da idade do projeto.
Entrar no médio da Peugeot também nos remete aos anos 2000, com aquele velho volante da marca (já enjoou), bem como o apêndice na coluna de direção onde estão os comandos do som. Painel, lateral de portas, console central... tudo permanece como antes. Novidade mesmo só a central multimídia, que, por sua posição, parece coisa de loja de acessório. Mas a central é bem legal, agregando GPS, comandos sensíveis ao toque, espelhamento para celular e integração Apple CarPlay e Android Auto (ambos com necessidade do cabo, apesar do Bluetooth). O acabamento segue de bom nível, com superfícies emborrachadas e revestimento de teto macio.
Em movimento, quem conhece o 308 vai notar mudanças - para melhor, na maioria dos casos. A transmissão automática de seis marchas estreia nova geração, mais inteligente e com mais recursos do que antes. Há um novo modo "eco" que substitui o antigo "neve", fazendo as trocas em rotações baixas e deixando o motor trabalhar folgado - o que agrada numa condução urbana, já que o torque máximo do 1.6 THP (24,5 kgfm) é entregue logo a 1.400 rpm. Em modo normal o câmbio já fica um pouco mais nervoso, com reduções às vezes até exageradas para um motor com tanta força em baixa. Já o modo esportivo só deve ser utilizado em caso em condução agressiva, uma vez que as trocas ficam muito mais sensíveis e as reduções deixam o motor "gritando" a maior parte do tempo. Na comparação com o anterior, que parecia estar sempre no modo esportivo, o ganho em conforto é notável. Para completar, só faltaram mesmo as borboletas no volante para trocas de marcha manuais, o que viria a calhar nesta versão turbo.
A Peugeot também mexeu na suspensão, mas a mudança não é tão perceptível quanto a do câmbio. Apesar de a marca dizer que deixou o carro mais macio, o 308 ainda não gosta de trafegar em pisos ruins e, nesta versão com rodas aro 17" e pneus 225/45 R17, ele não se importa muito de repassar os impactos aos ocupantes - continua duro. Nas curvas percebemos um tiquinho a mais de "rolling" da carroceria, mas nada que afete seu bom comportamento global, ainda mais contando com "sapatos" bem largos. Apesar disso, valetas e rampas de garagem não são problema. Uma pena que a direção, ainda com assistência hidráulica, seja pesada na cidade.
O motor segue como destaque do carro. Agora na versão flex, o THP de 1.6 litro chegou a 173 cv de potência e faz o 308 andar na frente dos rivais - tanto do Focus 2.0 aspirado quanto do Golf 1.4 turbo importado. Na comparação com a versão somente a gasolina (o primeiro carro testado com aparelho de medição aqui no CARPLACE), o novo Peugeot manteve os 8,7 segundos de aceleração de 0 a 100 km/h, mas foi mais rápido tanto na retomada de 40 a 100 km/h quanto na de 80 a 120 km/h - veja tabela de resultados ao final da reportagem.
Ao descer da novidade, a impressão que fica é de que, avaliado de forma solitária, o novo 308 convence. Ele está mais bonito, eficiente, um pouco mais confortável, mais equipado e continua com desempenho vigoroso. Por que então não emplaca? Bom, eis que chega o Focus para nosso comparativo. E de cara o Ford já lhe impõe uma derrota no estilo mais invocado, mais coerentes com esses tempos em que hatches e sedãs médios estão mais esportivos - o 308 ainda bebe muito na fonte do 307, criado numa época em que as minivans estavam em alta.
Espaço vertical é melhor no Peugeot, com maior área para passageiros altos, mas para acomodar as pernas ambos são um pouco apertados no banco de trás. No porta-malas, vitória fácil com mais de 100 litros da vantagem para o 308 (430 x 316 litros). Já posição de dirigir é melhor no Ford, podendo ser mais baixa e com um volante de pegada mais precisa e tato mais agradável. O interior do Focus também dá um banho em modernidade de linhas, seja no painel, laterais de porta ou no cluster - só falta mesmo a central multimídia Sony das fotos, item só oferecido como acessório para a versão SE Plus avaliada, que vem de série com o sistema Sync com tela colorida de 4,2" e comandos por voz. Exceto pelo teto com forração áspera, o Ford revela materiais de acabamento mais esmerados que o do rival, com plásticos de toque mais suave também nas partes inferiores do painel, além de comandos e alavancas de maior qualidade percebida.
É na dirigibilidade, no entanto, que o Focus encanta mais - e bate o Peugeot mesmo não o acompanhando no desempenho. A suspensão é coisa fina, independente nos dois eixos, e ficou ainda mais suave nesta última reestilização, tornando nossas ruas aparentemente menos acidentadas do que elas realmente são. Admirável também o acerto da direção elétrica, leve e afiada na medida certa. O Ford tem ainda o controle de estabilidade que o Peugeot também emprega, mas adiciona ainda o sistema de vetorização de torque para trabalhar a distribuição de força nas rodas dianteiras da melhor forma possível. Em poucas palavras, faz curva pra C%$@#O!
O refinamento do Focus também pode ser percebido no baixíssimo nível de ruído, tanto do motor quanto da suspensão. O câmbio de dupla embreagem e seis marchas ajuda com trocas mais ágeis e menos perceptíveis que o automático tradicional do 308, sem as perdas de força para o conversor de torque - agora também com a possibilidade de poder fazer as mudanças pelas borboletas na direção. Em resumo, o Focus é o carro que você dirige sem querer voltar para casa. Só falta mesmo o 1.6 EcoBoost (turbo) para a festa ficar completa, mas o 2.0 aspro com injeção direta não fez feio com seus 178 cv e 22,5 kgfm - chegou a 100 km/h em 9,5 segundos e retomou de 80 a 120 km/h em 6,5 s. A diferença é que, ao contrário do Peugeot, no Ford é preciso pisar mais fundo para ele andar forte, uma vez que o torque máximo só surge a 4.500 rpm.
Curiosamente, a menor capacidade cúbica do motor do Peugeot não deu a ele a vitória no consumo: abastecido com etanol e usando o modo "eco", o 308 fez médias de 6,7 km/l na cidade e 9,8 km/l na estrada. O Focus, também com etanol, registrou 7,0 km/l e 10,6 km/l nas mesmas provas. Passando às últimas medições de nosso teste, as de frenagem, novo triunfo do Ford mesmo calçando pneus não tão largos (215/50 R17). O Focus precorreu apenas 37,2 metros até parar quando vindo a 100 km/h, enquanto o 308 levou 1 metro a mais - ainda assim uma boa marca.
Mais equipado por quase o mesmo preço do rival, 0 308 poderia complicar (e bem) a vida do Focus caso fosse o modelo europeu. O atual pode atrair pelo motor turbo e pelos equipamentos, como a central multimídia e o teto panorâmico de vidro, além dos dois airbags extras (seis contra quatro). Mas, após o test-drive, fica difícil não optar pelo Ford.
Texto e fotos: Daniel Messeder
Ficha técnica – Peugeot 308 Griffe THP
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, comando variável, turbo, injeção direta, flex; Potência: 165 cv/173 cv a 6.000 rpm; Torque: 24,5 kgfm a 1.400 rpm; Transmissão: câmbio automático de seis marchas, tração dianteira; Direção: eletro-hidráulica; Suspensão: independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira; Freios: discos nas quatro rodas, com ABS; Rodas: aro 17″ com pneus 225/45 R17; Peso: 1.392 kg; Capacidades: porta-malas 430 litros, tanque 60 litros; Dimensões: comprimento 4.276 mm, largura 1.815 mm, altura 1.498 mm, entreeixos 2.608 mm
Medições CARPLACEAceleração
0 a 60 km/h: 4,0 s
0 a 80 km/h: 6,0 s
0 a 100 km/h: 8,6 s
Retomada
40 a 100 km/h em D: 6,4 s
80 a 120 km/h em D: 5,9 s
Frenagem
100 km/h a 0: 38,2 m
80 km/h a 0: 23,5 m
60 km/h a 0: 13,1 m
Consumo
Ciclo cidade: 6,7 km/l
Ciclo estrada: 9,8 km/l
Ficha técnica – Ford Focus SE Plus 2.0
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, 1.999 cm3, comando duplo variável, injeção direta, flex; Potência: 175/178 cv a 6.500 rpm; Torque: 21,5/22,5 kgfm a 4.500 rpm; Transmissão: câmbio automatizado de seis marchas, dupla embreagem, tração dianteira; Direção: elétrica; Suspensão: independente McPherson na dianteira e multilink na traseira; Freios: discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira, com ABS; Rodas: aro 17″ com pneus 215/50 R17; Peso: 1.375 kg; Capacidades: porta-malas 316 litros, tanque 55 litros; Dimensões:comprimento 4.360 mm, largura 1.823 mm, altura 1.469 mm, entreeixos 2.648 mm
Medições CARPLACEAceleração
0 a 60 km/h: 4,6 s
0 a 80 km/h: 6,4 s
0 a 100 km/h: 9,5 s
Retomada
40 a 100 km/h em S: 7,2 s
80 a 120 km/h em S: 6,5 s
Frenagem
100 km/h a 0: 37,2 m
80 km/h a 0: 23,1 m
60 km/h a 0: 12,8 m
Consumo
Ciclo cidade: 7,0 km/l
Ciclo estrada: 10,6 km/l
Fotos: comparativo Peugeot 308 THP x Ford Focus 2.0 SE 2016
Galeria: Teste CARPLACE: renovado, Peugeot 308 1.6 turbo mede forças com o Focus 2.0