Faz apenas pouco mais de um ano que eles se encontraram por aqui. De lá para cá, porém, muita coisa mudou na vida de Focus e Golf. O modelo da VW, que no começo era importado da Alemanha, passou a vir do México e perdeu alguns mimos. Já o hatch médio da Ford muda de cara após somente 23 meses de mercado desta terceira geração no Brasil. O que nos leva, claro, a reunir novamente os arquirrivais para ver o quanto as modificações do Focus foram capazes de impactar no resultado da briga com o Golf.
Para os fãs do Ford, a boa notícia é que algumas de suas preces foram ouvidas. Sai a dianteira com aquela grade "vampiro" e entra a atual frente estilo "Aston Martin" que estampa os Ford modernos. Ficou parecendo um Fiestão? Sim, mas é sem dúvida mais bonito e harmônico que o anterior - só não sei quanto às lanternas traseiras, que parecem ter sido "cortadas" na base. Agora também as versões 2.0 ganharam (finalmente) as borboletas na direção para trocas manuais do câmbio Powershift, em vez daqueles botõeszinhos quase inúteis na alavanca. A Ford mexeu até onde não parecia precisar, como no isolamento acústico e nos sistemas de direção e suspensão. Para finalizar, aplicou novos equipamentos e um interior mais refinado, onde mudam volante, grafismo do quadro de instrumentos e desenho dos comandos do ar-condicionado digital.
A marca diz também que o Focus ficou mais barato, mas não é bem assim. Basta lembrar que, pouco tempo atrás, a Ford havia aumentado os preços de tabela da linha toda, mas na prática o carro antigo ainda é vendido com bons abatimentos nas lojas. Ou seja, para ter o carro novo o consumidor vai acabar gastando mais. Ao menos os donos dos modelos 2014 e 2015 terão desconto de 15% na troca pelo modelo 2016 no período de pré-venda - o que não deixa de ser um alento para quem ficou chateado ao ver seu Focus ainda novinho sair de linha...
A versão usada neste comparativo é a Titanium Plus, top de linha. Por R$ 95.900, ela vem com itens como bancos de couro (sendo o do motorista com ajustes elétricos), teto-solar, central Multimídia Sync com tela de 8" sensível ao toque (que liga automaticamente para o Samu em caso de acidente), câmera de ré, sensores de estacionamento na frente e atrás, sensores de luz e chuva, faróis de xenônio direcionais, sistema Park Assist 2.0 (que estaciona sozinho em vagas paralelas e perpendiculares) e até um sistema de frenagem automática de emergência. Por meio de um sensor no para-brisa, o Focus identifica se o carro da frente chegou muito perto e, sozinho, aplica os freios para amenizar a batida se a velocidade for de até 50 km/h, ou evitá-la caso a velocidade esteja abaixo de 20 km/h.
Também item de série, a chave presencial destrava as portas e abre os retrovisores apenas ao puxar a maçaneta (com a chave no bolso), enquanto a partida é dada por botão. Para quem conhece o Focus, a maior novidade interna é o volante de três raios, além dos comandos mais refinados da ventilação - vale lembrar que os antigos eram iguais aos do modelo da geração anterior. O painel segue macio ao toque (espuma injetada) e os materiais e a montagem parecem um pouco mais caprichados. Em termos de espaço, o modelo continua um tanto justo no banco traseiro, especialmente se levarmos em conta o tamanho do carro. Do mesmo modo, o porta-malas manteve os apenas razoáveis 316 litros de capacidade, mesmo usando estepe fino, de uso temporário.
Em movimento, é notável a evolução em refinamento. O carro está muito silencioso, a suspensão ficou ainda mais suave no trato com pisos ruins e a direção, que já era esperta, parece ainda mais viva. E o acerto continua um primor para encarar curvas sem juízo, com uma dianteira altamente obediente e uma traseira participativa - sim, o Focus aponta a frente e escapa ligeiramente a traseira em curvas fortes, num comportamento pra lá de interessante para um hatch médio não esportivo. Pena não ter vindo o motor 1.5 Ecoboost da versão europeia...
O turbo era o que faltava para o Focus encantar de vez. Não que o motor Duratec com injeção direta e 178 cv deixe a desejar, longe disso, mas depois de andar no Golf você sente falta do empurrão proporcionado pelo "caracol". Levado para nossas medições, o Focus Titanium Plus obteve resultados de desempenho um tiquinho inferiores ao modelo anterior, mas isso porque havíamos testado a versão SE, mais leve. A aceleração de 0 a 100 km/h ficou em 9,5 segundos e a retomada de 40 a 100 km/h levou 7,2 s - contra 9,3 s e 7,0 s da versão anterior. Em compensação, as frenagens foram bem melhores do que antes: apenas 37,2 metros até a parada completa, vindo a 100 km/h.
Embora seja bom de torque em baixa (para um aspirado), o motor Duratec não esconde sua predileção por giros elevados. É gostoso acelerar fundo o Focus e ver o câmbio reduzindo marcha para que o 2.0 seja levado até quase 7 mil rpm antes da troca ascendente. E as borboletas ajudam na brincadeira, permitindo escolher a marcha preferida para cada situação. Não espere, porém, a rapidez das mudanças da caixa DSG do Golf (também de dupla embreagem). Enquanto no VW o conta-giros despenca nas trocas, no Ford ele desce suavemente enquanto a mudança ocorre. O sistema é suave nas passagens, mas compromete um pouco numa tocada esportiva.
Outro ponto a favor do Golf é o peso: são quase 200 kg a menos que o Focus. Some isso aos 25,5 kgfm de torque entregues logo a 1.500 rpm (contra 22,5 kgfm a 4.500 do Ford) e você nota que o Golf ganha velocidade de forma mais natural e fluida, enquanto no Ford percebemos mais o esforço do motor. A aceleração de 0 a 100 km/h do VW foi feita em 0,5 s a menos (9,0 s cravados) e a retomada de 40 a 100 km/h se deu em 6,4 s (contra 7,2 s). Pode soar pouco em números, mas na vida real é evidente o maior pique do Golf, principalmente em situações urbanas.
Na estrada eles se equivalem, com o Focus fazendo valer sua potência extra - 178 cv ante 140 cv. Repare que na retomada de 80 a 120 km/h, quando os carros já estão embalados, os resultados ficam próximos. Os dois viajam em velocidades germânicas sem distúrbios, com baixo ruído e ampla sensação de segurança. A 120 km/h, o Ford vai com 2,5 mil giros em sexta e o VW com 2 mil giros em sétima (vantagem de sua marcha a mais). Ambos são bem grudados ao solo e encaram estradinhas de montanha praticamente como esportivos, embora com algumas diferenças. No Golf o comportamento é mais previsível, com saída de frente no limite e traseira bem presa. O motor responde bem em giros baixos e médios, mas em alta parece não render mais (a potência máxima já pinta em 4,5 mil giros). Já o Focus é mais interativo de jogar de lado, enquanto seu motor cresce mais linear, sem aquele pico de torque do rival logo em baixa. Melhor para o VW nas saídas de curva; melhor para o Ford nas longas retas.
Se a dupla motor-câmbio do Golf ainda é a referência do segmento, o Focus responde com o melhor acerto de suspensão e direção. O VW é bastante estável sem ser duro, no entanto, ele sente mais a buraqueira do nosso piso, repassando-a um pouco mais aos passageiros. A direção também é bem calibrada, mas sem a mesma precisão em baixa velocidade. A do Focus parece mais conectada às rodas, enquanto a do Golf filtra um pouco mais as informações do piso. Outra diferença entre eles é o fato de o Ford ser flex, coisa que o VW deve adotar quando começar a ser produzido no Brasil, a partir de agosto. Mas, mesmo bebendo só gasolina, o Golf é muito econômico, a ponto de anular a vantagem do rival de engolir etanol - quando ela existe, dependendo do preço do combustível vegetal onde você mora. De todo modo, o Focus consegue números razoáveis de consumo com etanol.
Apesar de o Golf usado nas fotos ser do modelo alemão (ainda com o freio de estacionamento eletrônico), já avaliamos o Golf Variant mexicano e vimos que o nível de acabamento praticamente não se alterou. Ou seja, está ainda num nível acima do Focus, com materiais mais nobres e detalhes refinados como as colunas dianteiras forradas com tecido e os porta-mapas com feltro para que pequenos objetos não façam barulho. Também melhor no carro da Volks é o tratamento aos ocupantes do banco traseiro: há mais espaço para pernas e cabeça, além de o ar-condicionado ter uma saída exclusiva para trás - mimo não oferecido no Ford. Já o porta-malas é tão compacto quanto o do rival, mas ao menos traz estepe de tamanho convencional.
Além de renovar seu modelo, a aposta final da Ford é no preço: o Golf Highline DSG como o testado parte de R$ 89.900, mas para ter conteúdo semelhante ao do Focus Titanium Plus é preciso incluir o pacote de opcionais Exclusive, que custa mais de R$ 16 mil. Com ele, o VW recebe partida por botão e chave presencial, bancos de couro (dianteiros aquecidos), faróis de xenônio direcionais, rodas de liga aro 17", sistema multimídia com navegação e também o seletor de perfil de condução (Normal, Sport, Eco e Individual) - coisa que o Focus não tem. Mas aí o cheque já passa dos R$ 106 mil e deixa a dúvida: vale gastar cerca de R$ 10 mil extras pelo turbo, câmbio esperto e acabamento mais caprichado?
Neste contexto, o cenário nos parece mais favorável ao Focus, que deve conseguir manter a liderança do segmento pelo menos até setembro, quando começam as vendas do Golf brasileiro. Só que aí a VW poderá mudar o jogo financeiro ao seu favor, com a inédita versão 1.6 16V de entrada que deve estrear por cerca de R$ 65 mil. Na mudança do Focus, a Ford matou a versão S e reposicionou a gama começando pelo SE 1.6 a R$ 69.900 - uma diferença que pode beneficiar o rival. Mas isso já é assunto para um próximo comparativo...
Por Daniel MessederFotos Rafael Munhoz
Ficha técnica – Ford Focus Titanium Plus Powershift
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, 1.999 cm3, comando duplo variável, injeção direta, flex; Potência: 175/178 cv a 6.500 rpm; Torque: 21,5/22,5 kgfm a 4.500 rpm; Transmissão: câmbio automatizado de seis marchas, dupla embreagem, tração dianteira; Direção: elétrica; Suspensão: independente McPherson na dianteira e multilink na traseira; Freios: discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira, com ABS; Rodas: aro 17″ com pneus 215/50 R17; Peso: 1.399 kg; Capacidades: porta-malas 316 litros, tanque 55 litros; Dimensões:comprimento 4.360 mm, largura 1.823 mm, altura 1.469 mm, entreeixos 2.648 mm
Medições CARPLACEAceleração
0 a 60 km/h: 4,6 s
0 a 80 km/h: 6,4 s
0 a 100 km/h: 9,5 s
Retomada
40 a 100 km/h em S: 7,2 s
80 a 120 km/h em S: 6,5 s
Frenagem
100 km/h a 0: 37,2 m
80 km/h a 0: 23,1 m
60 km/h a 0: 12,8 m
Consumo
Ciclo cidade: 7,2 km/l
Ciclo estrada: 10,6 km/l
Ficha Técnica – VW Golf 1.4 TSI DSG
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 16 válvulas, comando duplo variável, 1.395 cm³, turbo e intercooler, injeção direta, gasolina; Potência: 140 cv de 4.500 rpm a 6.000 rpm; Torque: 25,5 kgfm entre 1.500 e 3.500 rpm; Transmissão: câmbio automatizado de dupla embreagem (DSG) e sete marchas, tração dianteira; Direção: elétrica; Suspensão:independente McPherson na dianteira e independente multibraço na traseira; Freios: discos ventilados na dianteira e sólidos na traseira, com ABS; Rodas: aro 17 com pneus 225/45 R17;Peso: 1.218 kg; Capacidades: porta-malas 313 litros, tanque 50 litros; Dimensões:comprimento 4.255 mm, largura 1.799 mm, altura 1.468 mm, entre-eixos 2.637 mm
Aceleração
0 a 60 km/h: 4,3 s
0 a 80 km/h: 6,5 s
0 a 100 km/h: 9,0 s
Retomada
40 a 100 km/h em S: 6,4 s
80 a 120 km/h em S: 6,3 s
Frenagem
100 km/h a 0: 37,0 m
80 km/h a 0: 23,0 m
60 km/h a 0: 12,9 m
Consumo
Ciclo cidade: 12,1 km/l
Ciclo estrada: 17,0 km/l
Galeria de fotos:
Galeria: Teste CARPLACE: novo Focus reaquece duelo com o Golf