Saí do evento de lançamento do novo 408 com câmbio de seis marchas levando dois bem-casados, aqueles bolinhos pão-de-ló com recheio de doce de leite distribuídos na saída dos casórios. Foi uma forma bem humorada de a Peugeot mostrar que a nova transmissão "casa" perfeitamente com o motor 2.0 16V flex – que até então fazia par com uma antiga caixa de quatro velocidades. Os doces estavam uma delícia, mas será que o carro também ficou saboroso? A resposta a gente foi descobrir na estrada, na cidade e na pista de testes.
Antes de partir para a ação, uma breve situada no mercado. O Peugeot 408 recebe a nova transmissão ao mesmo tempo em que seu primo Citroën C4 Lounge chega todo novo – e com o mesmo câmbio. Nenhuma surpresa, pois os dois são fabricados na planta de El Palomar, na Argentina, e dividem diversos componentes. Disponível na versão de acabamento Allure 2.0, o 408 A/T custa R$ 65.990, um acréscimo de R$ 2 mil em relação ao antigo modelo de quatro marchas – mas ainda assim abaixo do Lounge equivalente, o Tendance A/T, de R$ 66.990.
A marca do leão aproveitou que ia mexer na mecânica e aproveitou para alterar também a suspensão do 408, alvo de críticas por ser um tanto firme para sua proposta familiar. O gerente de marketing Sérgio Davico explica que o eixo traseiro recebeu buchas mais macias e a interface que liga as molas à carroceria foi trocada tanto na dianteira quanto na traseira, para transmitir menos interferências do piso aos ocupantes. Fora isso, os pneus agora são "verdes", de menor resistência à rodagem e com composto mais macio.
Câmbio japa
A nova transmissão de seis marchas não é inédita: fabricada pela japonesa Aisin, é a mesma já usada na versão THP de diversos modelos da PSA, embora obviamente com calibração específica para o motor 2.0 16V. Antes, esse propulsor era "bonito" demais para ser casado com a velha caixa de quatro velocidades. Afinal, ainda que não seja tão avançado quanto o 1.6 turbo de injeção direta do 408 THP, esse 2.0 (chamado internamente de EW10A) tem suas qualidades, como bloco de alumínio e duplo comando variável, para render até 151 cv e 22 kgfm de torque. Casamento desfeito, o motor arranjou coisa bem melhor para o segundo matrimônio. Mas, posso falar? Agora é a transmissão que passou a se destacar no casal. Esperta e inteligente, ela tem um pique que às vezes o 2.0 não consegue acompanhar.
Nosso teste revelou melhoras sensíveis, como o tempo de 0 a 100 km/h em 11,2 segundos (era cerca de 12,0 s antes) e a retomada de 80 a 120 km/h em 8,6 s (era na casa dos 9,0 s). Mas a sensação ao volante é até mais positiva do que sugerem os números, bastando uma leve pressão no acelerador para que o câmbio logo reduza uma marcha, graças às relações mais próximas entre si. E isso sem contar que os antigos trancos nas mudanças acabaram de vez com a transmissão Made in Japan. O 408 está mais rápido, mais confortável e acabou com aquela indecisão sobre qual marcha usar em algumas situações (especialmente em aclives). Agora parece sempre haver uma relação correta para cada momento.
Por que então eu disse que o motor não acompanha o ritmo do câmbio? Porque a transmissão está sempre "acordando" o 2.0 com reduções, especialmente quando usamos o modo Sport, com leis de passagem bem mais agressivas que no modo Drive - sem falar nas mudanças manuais, que funcionam bem apesar de as reduções serem feitas para trás. Falta torque em baixas rotações para deslocar o pesadão 408, de quase 1,5 tonelada, fazendo com que o motor seja mais exigido em altas rotações para fazer o sedã deslanchar. Desta forma, o consumo continua elevado principalmente na cidade: registramos média de 5,6 km/l com etanol. Na estrada a coisa melhora, com a sexta marcha garantindo giro baixo (2.700 rpm a 120 km/h), silêncio a bordo e a marca de 10 km/l com o combustível vegetal.
Se ainda não vai ser desta vez que o 408 vai perder a fama de beberrão, pelo menos as queixas quanto à absorção de impactos devem diminuir bastante. O carro está claramente mais macio e silencioso nos buracos, transmitindo aquela agradável sensação de "carrão" - o que de fato o 408 é, com seus quase 4,70 m de comprimento. E o mais interessante é que a Peugeot conseguiu esse conforto sem sacrificar a elogiada estabilidade do modelo, uma vez que a firmeza das molas foi mantida. Forcei o sedã num trecho de curvinhas traiçoeiras e encontrei ótimo equilíbrio de massas, sem falar na boa aderência proporcionada pelos largos pneus 225/45 vestidos em rodas aro 17". Também gera confiança a direção bem calibrada (firme em velocidade) e os freios fortes: o 408 percorreu curtos 39,2 metros até parar completamente quando vindo a 100 km/h.
307, é você?
No mais, é o conhecido 408 de sempre. Aplausos para o excelente espaço interno (o entre-eixos de 2,71 m é dos maiores da categoria), a ampla visibilidade gerada pelo imenso para-brisas e para a atenção aos detalhes, como nas saídas de ar exclusivas para o banco traseiro e os braços pantográficos da tampa traseira, que não interferem em nada nos 481 litros do porta-malas. O acabamento também é digno de nota, feito com esmero e boa qualidade de materiais, como podemos sentir ao tocar o painel emborrachado ou o forro de teto espumado - faltou apenas colocar couro nos bancos e tirar o cromado do entorno do câmbio, que reflete o sol nos olhos do motorista.
Uma coisa que incomoda, porém, é entrar no 408 e me sentir no velho 307. Sim, esse interior era legal no começo dos anos 2000, mas em um carro 2014 (e que custa R$ 66 mil) eu não quero encontrar o mesmo volante de sempre, o mesmo aparelho de som de sempre, os mesmos botões dos vidros elétricos, os mesmos comandos do ar-condicionado e até a mesma velha telinha do computador de bordo com a iluminação laranja... Já deu, né, Peugeot? Que venha logo o novíssimo 308 europeu com painel arrojado semelhante ao do 208 para deixar a lembrança do 307 descansar em paz. Ah, e ainda não foi desta vez que a marca francesa resolveu o problema do bico avançado, que raspa com facilidade - outra herança do 307, embora menos acentuada.
Exceto pelo desenho interno (tirando o bonito quadro de instrumentos), o 408 é uma opção interessante no segmento - ainda mais se você é daqueles que aprecia um sedã médio com tamanho e jeitão de andar de carro grande. O casamento entre o motor 2.0 e a competente transmissão de seis marchas ficou bom e recoloca a Peugeot na briga pelo segundo pelotão da categoria - Civic, Corolla e Cruze estão bem à frente nas vendas. Mas saiba que o casamento perfeito para esse carro sai um pouco mais caro, a exatos R$ 73.990. É quanto custa o 408 THP, que além do motor 1.6 turbo mais forte e econômico, tem bancos de couro, seis airbags, ESP...
Por Daniel Messeder
Fotos DivulgaçãoFicha técnica - Peugeot 408 Allure AT Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros em linha, 16 válvulas, comando duplo variável, 1998 cm³, flex; Potência: 143/151 cv a 5.250 rpm; Torque: 20,0/22,0 kgfm a 4.000 rpm; Transmissão: câmbio automático de seis velocidades, tração dianteira; Direção: eletro-hidráulica; Suspensão: independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira; Freios: discos nas quatro rodas, com ABS; Rodas: aro 17 com pneus 225/45 R17; Peso: 1.494 kg; Capacidades: porta-malas 481 litros; tanque 60 litros; Dimensões: comprimento 4.690 mm, largura 1.815 mm, altura 1.519 mm, entreeixos 2.710 mm;
Medições CARPLACEAceleração
0 a 60 km/h: 4,9 s
0 a 80 km/h: 7,8 s
0 a 100 km/h: 11,2 s
Retomada
40 a 100 km/h em Drive: 8,4 s
80 a 120 km/h em Drive: 8,6 s
Frenagem
100 km/h a 0: 39,2 m
80 km/h a 0: 24,8 m
60 km/h a 0: 14,1 m
Consumo
Ciclo cidade: 5,6 km/l
Ciclo estrada: 10,0 km/l
Números do fabricante
Aceleração 0 a 100 km/h: 10,5 s
Consumo cidade: N/D
Consumo estrada: N/D
Velocidade máxima: 209 km/h
Galeria: Teste CARPLACE: 408 ganha câmbio de seis marchas em busca do casamento perfeito