Com as importações reabertas na década de 1990, os automóveis estrangeiros se tornaram o grande desejo dos brasileiros. Ter um carro importado era sinônimo de status. Atenta à essa demanda, em 1993 a Fiat trouxe o italiano Tipo ao Brasil. Vindo inicialmente num lote mensal de 1.500 unidades, o hatch médio custava 17 mil dólares, um preço tentador para o que era oferecido. No começo importado em versão única, 1.6 i.e de duas portas, o modelo oferecia opcionais que até então só eram disponíveis em categorias acima dele, como como ar-condicionado, controle elétrico dos vidros, travas elétricas e teto solar.
O interior refletia a modernidade do lado de fora, com um painel completo e de fácil leitura que abrigava itens incomuns no mercado até então, como conta-giros, marcador de temperatura e econômetro, além de um discreto relógio para completar os mostradores. O propulsor 1.6 desenvolvia apenas 82 cavalos de potência. Desempenho não era o forte do Tipo - nos testes da época ele levou 15 segundos para ir de 0 a 100 km/h. Em compensação, o consumo agradava, com média de 12,5 km/l de gasolina. Visando a redução de peso foi adotada uma curiosa solução: a tampa do porta-malas era de plástico. Outra novidade bem-vinda eram as duas luzes traseiras de neblina, contra apenas uma na maioria dos carros.
Com espaço interno e porta-malas acima de seus concorrentes, além de seu apelo de importado a preço de combate, o Tipo foi o importado mais vendido do país por vários anos. E também conseguiu um feito histórico: desbancou o Volkswagen Gol como carro mais vendido do Brasil em janeiro de 1995, com 13.298 unidades.
Se o problema era potencia, a Fiat resolvia o problema acrescentando uma nova versão a gama do modelo: em julho de 1994 chegava o Tipo SLX 2.0. O motor de duplo comando com 1.995 cm3 não era o mesmo que equipada o Tempra - trazia soluções mais modernas como injeção multiponto sequêncial e duas árvores de balanceamento, para diminuir as vibrações. Com essas tecnologias, o propulsor rendia 109 cavalos de potencia e oferecia um desempenho mais interessante. A máxima chegava a 188 km/h.
O SLX foi vendido apenas com cinco portas e, além do motor mais potente, trazia novidades como faróis de neblina, banco do motorista com ajustes de altura e de apoio lombar, apoio de braço central dianteiro, retrovisores e para-choques na cor da carroceria. Os freios a disco nas quatro rodas podiam incluir ABS como opcional. O modelo custava 23 mil dólares na época, um investimento baixo para aproveitar um desempenho à altura de seu visual.
Em dezembro do mesmo ano a Fiat trazia para o Brasil a versão apimentada do Tipo, equipada com motor 2.0 16V. Chamada de Sedicivalvole (em alusão às 16 válvulas), vinha com propulsor de 137 cavalos de potência e torque de 18,4 kgfm a 4.500 rpm, levando o hatch à máxima de 204 km/h e transformando-o em um dos automóveis mais velozes do mercado nacional.
O visual diferenciado exalava esportividade, com saias laterais mais largas e um friso vermelho nos para-choques, além de lanternas traseiras escurecidas e rodas exclusivas com pneus 195/60. O interior trazia bancos esportivos (da marca Recaro como opcional), volante revestido em couro e painel completo que incluía manômetro e termômetro de óleo.
As vendas do hatch médio da Fiat iam de vento em poupa até que em fevereiro de 1995 a alíquota para importação foi elevada para 70%, forçando a marca a repensar sua estratégia. Na Europa, o Tipo era fabricado desde 1988 e já estava prestes a ser substituído pela dupla Bravo/Brava. Logo a solução era produzir o Tipo em Betim (MG).
Pois então no início de 1996 chegava o Tipo 1.6 mpi brasileiro. A sigla identificava a adoção de injeção multiponto, o que levava o motor de 82 para 92 cv - um salto satisfatório que deixava o hatch mais esperto e encerrava as queixas do motor fraco. Para demonstrar que o Tipo ainda tinha condições de inovar, a Fiat fez dele o primeiro carro nacional a oferecer airbag (só para o motorista). Infelizmente, nessa mudança para o Brasil as versões SLX, 16V e a carroceria de três portas foram descontinuadas.
Ainda em 1996, porém, começou a derrocada do modelo. A Fiat chamou os proprietários das versões 1.6 importadas para um recall afim de verificar e substituir o "tubo convergedor de ar quente" para o motor, após mais de 100 casos de incêndio ocorridos ao longo do ano. Com esses episódios, as vendas foram caindo e o posto de hatch médio mais vendido foi passado a concorrentes como Volkswagen Golf e Chevrolet Astra.
Meses após o primeiro recall, a fábrica chamava novamente os proprietários para um novo reparo - desta vez no sistema de direção. O problema ocorria quando o volante era todo esterçado, geralmente em uma manobra. Uma das mangueiras do sistema hidráulico não suportava a pressão e deixava vazar fluido sobre o ramo primário do escapamento, o que poderia causar incêndio e se alastrar rapidamente pelo compartimento do motor.
Após esses dois tombos e uma ação lenta do fabricante para solucionar os problemas, as vendas do Tipo despencaram e o modelo acabou se tornando um "mico" nas concessionárias. Assim, a produção foi encerrada em 1997, apenas um ano após a nacionalização do modelo - período em que foram vendidas 12.570 unidades, contra 169.819 importadas.
Hoje em dia, a imagem desses recalls ainda permanece para muita gente quando se fala do Tipo. É mesmo uma pena que o automóvel que revolucionou o segmento dos hatches médios e foi um fenômeno de vendas como importado seja lembrado dessa forma.
Por Júnior Almeida
Galeria: Carros para sempre: Fiat Tipo - Fenômeno importado