O cara que inventou o termo naked (nua) para as motos sem carenagem era um sábio. Afinal, as "peladas" são realmente uma das coisas mais gostosas de pilotar que já lançaram. E aqui está a Street Triple que não me deixa mentir. OK, você pode alegar que as nakeds não correm tanto quanto as superesportivas, mas, em compensação, elas são muito mais versáteis e topam diversão até mesmo no dia-a-dia. Talvez seja por isso que quando fui buscar a nova Triumph, às 16h de uma quarta-feira, eu não tenha voltado mais para trabalhar naquele dia (espero que o diretor Fábio Trindade não leia isso...). Foi mal aí, galera do CARPLACE, sei que eu tinha matéria pra escrever e texto pra editar, mas essa inglesinha me fisgou de um jeito que não resisti. Acabei desviando do caminho.
A gente já se conhecia de umas aceleradas no autódromo Velo Città, em Mogi-Guaçu (SP), de onde saí com ótima impressão. Mas voltas numa pista de corrida não contam tudo quando se trata de um veículo de rua. Agora eu queria saber como a Street se comportaria em meio ao trânsito urbano, se responderia bem em baixas rotações, como se sairia no nosso asfalto esburacado... Enfim, como ex-proprietário de uma das rivais que ela quer encarar, estava curioso até mesmo como consumidor.
A primeira coisa que gerou falação em torno da Street Triple foi a potência reduzida da versão brasileira, montada em Manaus (AM). Dos 106 cv originais lá da Inglaterra, mais de 20 se perderam pelo meio do Atlântico, restando 85,1 cv. Oficialmente, a Triumph do Brasil diz que foi por conta do nível de ruído, mas algo me diz que o índice de emissões é que pesou mais nesta decisão de "amarrar" o motor. Quer saber? Não vai dar para falar pro dono de Honda Hornet (102 cv) que você tem uma moto mais potente, mas, na real, se tem uma coisa que não senti falta na Street foi de desempenho. E nisso a configuração de três cilindros tem papel fundamental: une a entrega rápida de torque dos bicilíndricos com a explosão e suavidade dos quatro cilindros quando a rotação está lá no alto. A "puxada" até as 12 mil rpm é algo sempre vou me lembrar desta moto.
Logo de cara notei que o acelerador é bem nervoso, fazendo com que a Street dê um pulo para a frente ao menor giro da manete. É bom ter a mão leve no começo, para evitar sustos no trânsito apertado. Outra característica marcante fica por conta do ruído típico das Triumph tricilíndricas, com um "Nhiiii" em giros baixos que se transforma num "Wooooo" grave nas acelerações fortes - parece até outro motor! Aliás, essa foi a virtude que mais me encantou na Triple 675: você pode andar devagar com marcha alta e "chamar" o motor que ele cresce, deixando a pilotagem bastante agradável, com menos necessidade de trocas de marcha. Nesse aspecto ela é melhor que as rivais de quatro cilindros, que demoram mais para subir de giro e levam mais tempo nas retomadas.
A Street responde tão bem em qualquer regime de rotação que o torque de 6,1 kgfm sugere ser até maior, também devido à relação curta da transmissão. Por falar nisso, todo o sistema de câmbio tem funcionamento impecável, com uma embreagem não muito pesada (só cansa depois de muito tempo pilotando) e engates leves, macios e precisos. Andar com essa Triumph sem sair esticando marchas por aí é um eterno exercício de auto-controle, por conta do conjunto todo favorável a acelerar - ela chega aos 100 km/h em pouco mais de 4 segundos. Contribui para isso também o fato de a Street ser bastante compacta e leve: são somente 183 kg (apenas 9 kg a mais que uma Ninjinha 300!), facilitando bastante a pilotagem e as inversões de trajetória nas sequências de curva.
Magra e ágil, a Street vai bem nos trajetos urbanos, mas para usá-la todo dia há algumas restrições. O ângulo de esterço foi aumentado em relação à antiga versão, mas ainda é um tanto limitado para bailar entre os carros. Além disso, é preciso ter atenção com os retrovisores, porque eles excedem a largura do guidão. Por fim, a suspensão dianteira (com bengalas invertidas), que achei até macia no asfalto lisinho do autódromo, mostrou que não tolera muito os pisos ruins e transmite sem dó os impactos para o guidão, pedindo atenção em buracos. A traseira monoamortecida, por sua vez, é mais suave e supera bem obstáculos como lombadas.
Da cidade para uma estradinha sinuosa que costumo levar as motos de teste, aí sim a nova Triumph ficou à vontade. Além da já citada saúde do motor, entrega de torque vigorosa e câmbio gostoso de trabalhar, foi a hora de aproveitar na plenitude a ótima ciclística do modelo. Com um chassi rígido, suspensões firmes e ótimos pneus Pirelli Corsa (bastante aderentes), a Street se revelou deliciosa ao contornar curvas de diferentes raios, inclinando de um lado para o outro com muita facilidade - é uma moto "parceira" do piloto. Tanto que, quando cheguei ao final do trajeto, fiz meia volta e percorri tudo novamente, só para curtir um pouco mais o viciante exercício de acelerar, frear, reduzir marcha, inclinar, acelerar de novo... Nessa brincadeira, vale destacar também os fortes freios da marca Nissin, com flexíveis revestidos por malha de aço e discos duplos flutuantes na dianteira. Se você "alicatar" com vontade, o ABS (de série) entra em ação de forma suave, quase sem vibração na manete e no pedal.
Caso a ideia seja pegar uma estrada aberta, a turbulência gerada pelo vento passa a incomodar em longas viagens acima de 120 km/h - há uma bolha vendida como acessório, mas ela é pequena e deve ter pouco efeito prático. A Street tem apetite para muito mais, como deixam claro o conta-giros com a faixa vermelha se iniciando a 13 mil rpm e a velocidade máxima superior a 200 km/h. A luz de alerta de troca de marcha é programável (com espias azuis que vão acendendo gradativamente), para você aproveitar ao máximo o motorzão. Em resumo, é uma moto para tiros curtos, com o único objetivo de divertir. Ah, e uma dica: a Street foi feita para curtir sozinho! Levar uma garupa nela é pedir pra perder a namorada, tal o desconforto que você fará ela passar.
O visual cheio de personalidade é atração certa nas ruas, mas a dianteira com os faróis esbugalhados não foi unanimidade. Nosso fotógrafo Rafael Munhoz brincou que a Street tem os olhos do personagem Wall-E, da Pixar. Já a traseira curtinha e fina, com uma bela lanterna na ponta, tem mais chances de agradar a todos. Também achei bem bacana o escape curto, praticamente integrado ao chassi, que ajuda a manter o aspecto compacto da moto. O painel é bastante completo, incluindo computador de bordo, mas tem dois problemas de visualização: fica muito distante e baixo, exigindo que se desvie a atenção para consultá-lo, além de o cabo da embreagem passar bem na frente dos mostradores. O banco é confortável e a posição de pilotagem, com os braços não muito esticados, permite horas de passeio sem cansar. As manetes e comandos são simples, mas nada que desabone a nota de acabamento.
Fim da avaliação, confiro o consumo médio (razoáveis 17,8 km/l) e encosto a Street na garagem. Daí você me pergunta: como ela fica diante das rivais? Muito bem, eu diria. Não tem o motorzão da Kawasaki Z800, mas é mais maleável e fácil de pilotar. Em relação à Hornet, tem mais pegada em baixos giros e maior status, sem falar no fato de ser bem menos visada para roubo. Quanto à BMW F800R, a Triumph leva vantagem pela menor vibração e motor mais empolgante em altas rotações. Mas é na hora de assinar o cheque que a Street realmente se distancia da concorrência: por R$ 31.900, ela soa como uma pechincha quando comparada à Hornet (R$ 34.990 com ABS), F800R (R$ 36.900) e Z800 (R$ 38.990 com ABS).
Negócio fechado, então? Bom, não dá para negar que a Street tem preço de combate e, por essa grana, nada é tão divertido quanto ela no mercado de duas rodas. A considerar, somente, a pequena rede autorizada da Triumph e a manutenção que não é das mais baratas. Produto por produto, a nova Triple 675 chega como excelente opção para os fãs das "peladas"!
Por Daniel Messeder
Fotos Rafael MunhozFicha técnica - Triumph Street Triple 675Motor: três cilindros em linha, 12 válvulas, 675 cm3, injeção eletrônica, gasolina, refrigeração líquida; Potência: 85,1 cv a 11.200 rpm; Torque: 6,1 kgfm a 8.300 rpm; Transmissão: câmbio de seis marchas, transmissão por corrente; Quadro: dianteiro com perfil de alumínio e dupla viga, traseiro com duas peças fundidas sob alta pressão; Suspensão: garfos invertidos na dianteira (110 mm de curso) e monoamortecedor ajustável na traseira (124,5 mm de curso); Freios: discos flutuantes duplos na dianteira (310 mm) e disco único na traseira (220 mm), com ABS; Pneus: 120/70 R17 na dianteira e 180/55 R17 na traseira; Peso: 183 kg; Capacidades: tanque 17,4 litros; Dimensões: comprimento 2.055 mm, largura 740 mm, altura 1.060 mm, altura do assento 800 mm, entreeixos 1.410 mm
Galeria: Avaliação: leve e fogosa, Triumph Street Triple é diversão garantida