O "Cara de Cavalo" acaba de completar 70 anos. Foi em 28 de janeiro de 1953 que a Willys-Overland lançou nos Estados Unidos o CJ-3B, a primeira grande evolução na linha Jeep desde a criação do modelo militar Willys MB (na Segunda Guerra) e de suas versões civis CJ-2A (1945-1949) e CJ-3A (1949-1953). Nascia assim um modelo que teve vida bem curta em seu país de origem mas fez História, com H maiúsculo, em outros rincões do planeta - incluindo o Brasil.
A principal novidade do CJ-3B estava na mecânica. Utilizado nos Jeep desde 1941, o elementar o motorzinho L134 "Go Devil", de quatro cilindros em linha, com válvulas laterais e "cabeça chata", saía de cena para dar lugar ao motor Willys F4-134 Hurricane.
O Jeep Willys CJ-3B foi lançado em 1953
O bloco do novo motor era basicamente o mesmo de seu antecessor e até a cilindrada era igual: 134 polegadas cúbicas, ou 2,2 litros (diâmetro e curso não mudaram). A grande diferença era a adoção de um cabeçote "em F", com as válvulas de admissão sobre as câmaras de combustão, enquanto as válvulas de escape continuavam laterais.
Com esse novo arranjo na parte superior do motor, foi possível usar válvulas maiores, bem como aumentar a taxa de compressão. Assim, a potência saltou de 61 cv (nos motores Go Devil) para 76 cv (nos Hurricane), enquanto o torque subiu de 14,5 kgfm para 15,7 kgfm.
O motor Hurricane, com válvulas de admissão no cabeçote - F-Head
Só havia um problema: o motor Hurricane não se encaixava na silhueta original do Jeep... O jeito então foi fazer um capô mais alto, bem como esticar o topo da grade dianteira. Para tentar disfarçar a testa larga, puseram a marca WILLYS estampada acima da grade. Os americanos passaram a chamar o CJ-3B de "high hood" (capô alto). Com a nova frente encaixada na carroceria antiga, perdeu-se a harmonia de linhas dos antecessores - era o preço a pagar pela melhora no desempenho.
O capô do CJ-3B teve que ficar mais alto que o do CJ-3A
Talvez por sua aparência um tanto tosca e pesadona, o CJ-3B jamais obteve nos EUA o mesmo sucesso de outros modelos da linha CJ (sigla de Civilian Jeep). Seu reinado solitário durou apenas 1 ano e 9 meses e, logo, um sucessor chegou ao mercado americano, em outubro de 1954: era o CJ-5, de estilo bem mais caprichado e contornos arredondados. A essa altura, a Willys-Overland já havia sido vendida à Kaiser Motors.
O CJ-3B logo começou a conviver com o CJ-5 (à direita)
A versão militar Kaiser M606 era exportada para países aliados dos EUA
Apesar da chegada do sucessor, o CJ-3B ainda continuaria a ser produzido na fábrica de Toledo, Ohio, até 1968, como modelo mais barato da linha Jeep. Suas vendas, contudo, caíam ano a ano. Eram os tempos da Guerra Fria e o "high hood" ganhou também uma versão militar, batizada de Kaiser M606 e exportada para forças armadas de países aliados dos Estados Unidos.
A Gastal foi a primeira empresa a trazer Jeep ao Brasil
Os primeiros Jeep para uso civil chegaram ao Brasil em 1947. Eram os CJ-2A trazidos dos EUA pela Gastal, empresa carioca que pertencia à família do eminente político, diplomata e advogado Osvaldo Aranha. O sucesso foi tamanho que essa representante da Willys-Overland logo passou a importar kits em caixotes de madeira, montando os valentes 4x4 num galpão em Nova Iguaçu, Estado do Rio. Essa história já foi esmiuçada aqui no site.
A fábrica da Willys em São Bernardo do Campo - 1954
Em 1952, o presidente Getulio Vargas começou a dificultar a importação de veículos para estimular o nascimento da indústria automobilística brasileira. A Willys-Overland foi uma das primeiras empresas a atender aos apelos de nacionalização e inaugurou sua fábrica no Taboão, em São Bernardo do Campo, em março de 1954.
A frente alta rendeu ao modelo o apelido Cara de Cavalo
A estreia da linha de produção da Willys-Overland do Brasil foi com kits CKD do CJ-3B. Não demorou e o modelo foi apelidado de "Cara de Cavalo", por sua frente bem mais alta que a dos antecessores. O índice de nacionalização rapidamente chegou a 30% e, em janeiro de 1955, nada menos que 6 mil Jeep já haviam sido montados nas novas instalações. A previsão era de chegar a 100% de componentes brasileiros - isso numa época em que muita gente ainda não acreditava na viabilidade da indústria automobilística nacional.
De março a dezembro de 1954 foram montados 6 mil CJ-3B no Brasil
Anúncios do CJ-3B no Brasil em 1954
O CJ-3B, contudo, não durou muito tempo na fábrica de São Bernardo do Campo. Em outubro de 1955, a Willys-Overland já anunciava o início da produção do modelo CJ-5 no Brasil, com 40% de nacionalização. Depois disso, os únicos "Cara de Cavalo" 0km que chegaram ao país foram os militares Kaiser M606, para as Forças Armadas, até meados da década de 60.
No mesmo mês em que a linha de montagem do CJ-3B foi inaugurada em São Bernardo do Campo, três jovens chefes escoteiros ficaram sabendo que o VIII Jamboree Mundial (encontro internacional de escoteiros) aconteceria no Canadá, em agosto de 1955.
Os três escoteiros tiram o Jeep CJ-3B da linha de produção
- E se a gente for por terra? - perguntaram-se Hugo Vidal, Charles Downey e Jan Stelky.
Parecia um devaneio daqueles garotos com idades entre 19 e 21 anos. Nenhum dos três tinha automóvel e, para complicar, as estradas latino-americanas da década de 1950 não eram, propriamente estradas...
Para a Operação Abacaxi, o Jeep foi equipado com 50% de componentes nacionais
Eles, contudo, levaram a ideia adiante e batizaram a viagem de "Operação Abacaxi". Tinham, realmente, um abacaxi a descascar: seriam apenas 18 meses para levantar os meios necessários, cuidar da burocracia e chegar rodando a Niagara-on-the-Lake, no Canadá, a tempo da abertura do Jamboree.
Vidal, de 21 anos, trabalhava há pouco tempo na Agromotor, uma distribuidora e acionista da Willys-Overland do Brasil. Foi ele quem conseguiu o CJ-3B emprestado, além da licença de um ano para viajar pelas Américas.
Para bancar a aventura, os rapazes apresentaram o projeto a empresários da nascente indústria de autopeças brasileira. Apareceram 25 fabricantes de componentes de motor, transmissão, suspensão etc, interessados em provar a qualidade e a resistência de seus produtos. No fim, os jovens tiraram um CJ-3B zero-quilômetro da linha de montagem e, trocando componentes, elevaram seu índice de nacionalização para 50%.
Os escoteiros da Operação Abacaxi
O Jeep ganhou ainda tanques auxiliares de combustível, teto de aço, um armário externo na traseira e, como não podia deixar de ser, foi pintado de verde e amarelo para ressaltar sua origem. Era a primeira vez que um veículo brasileiro (ou quase isso) sairia para uma aventura internacional.
A partida se deu no dia 2 de abril de 1955, e lá foi o Jeep pela estrada afora, a 70km/h com seu motor Hurricane e o câmbio manual de apenas três marchas. A Operação Abacaxi (ou Operation Pineapple) percorreu as três Américas e foi acompanhada por muitos jornais e revistas, tanto no exterior quanto no Brasil.
O CJ-3B da Operação Abacaxi chegou ao Alasca
Após quatro meses de muitas aventuras, os escoteiros conseguiram chegar ao Jamboree bem a tempo da abertura do evento. Depois, foram convidados a participar de um programa de perguntas na TV CBS, em Nova York. Acertaram tudo, ganharam uma bolada e resolveram esticar a viagem até o Alasca, já no inverno e com temperaturas de -40ºC.
De volta ao Brasil, o heroico CJ-3B, placa 8-57-22 de São Paulo, foi devolvido à Agromotor - e seu destino é desconhecido. Dos três escoteiros viajantes, o único sobrevivente é Hugo Vidal, que ainda guarda muitas relíquias da viagem e participa de eventos da Jeep. Ele já voltou ao Alasca (num Wrangler, em 2017) e restaurou um CJ-3B - que, obviamente, foi pintado de verde e amarelo.
Os fabricantes de autopeças aproveitaram a viagem para divulgar seus produtos
A réplica do CJ-3B da Operação Abacaxi
Passados 68 anos da grande aventura, Vidal leva na carteira os números do chassi e do motor do CJ-3B da Operação Abacaxi. Vai que um dia ele encontra seu companheiro de juventude?
Mitsubishi Jeep J-37 - um dos japoneses derivados do CJ-3B
Tratado com certo desdém nos EUA, o modelo CJ-3B teve vida longa em outros países, onde foi fabricado sob licença por outras empresas.
A Mitsubishi produziu suas versões do CJ-3B até 1998
No Japão, esse Jeep foi produzido pela Mitsubishi entre 1953 e 1998. Inicialmente, competia com o Nissan Patrol e o Toyota Land Cruiser. Uma de suas versões era um utilitário com carroceria fechada bem semelhante à da nossa Rural, porém com 4 portas. Portanto, o "Cara de Cavalo" pode ser considerado o bisavô do Mitsubishi Pajero! Já as versões militares do CJ-3B feitas no Japão foram amplamente usadas pelas tropas sul-vietnamitas durante a Guerra do Vietnã.
Os últimos CJ-3B feitos na índia tinham motor a diesel - na foto, o Mahindra Major (1980)
Tuzla Jeep, a versão fabricada na Turquia
Na França o CJ-3B era feito pela Hotchkiss
A versão fabricada pela Ebro, na Espanha, até os anos 80
Na Índia, o CJ-3B foi o primeiro veículo fabricado pela Mahindra. A produção sob licença começou em 1954 e durou até 2010, em pleno século XXI... Os últimos CJ-3B feitos naquele país tinham motores a diesel e recebiam o nome de Mahindra Major.
O modelo da Jeep também foi fabricado na França (pela Hotchkiss), na Espanha (pela Viasa e pela Ebro) e na Turquia (pela própria Willys, com o nome de Tuzla Jeep). Ninguém tira do "Cara de Cavalo" o mérito de ter sido um pioneiro carro mundial.
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