Detentora do título de maior mercado de carros do mundo há anos, a China saiu de mero coadjuvante asiático para se transformar no principal player global da corrida automobilística em apenas 20 anos. Hoje, conta com mais de 150 marcas em atividade e consome impressionantes 25 milhões de unidades por ano, além de exportar outras 6 milhões para os mais diversos países e regiões.
O rápido e vertiginoso crescimento forçou montadoras tradicionais da Europa, dos Estados Unidos e da própria Ásia a tratarem o mercado chinês como prioridade, direcionando para lá ao longo dos anos fortes investimentos em pesquisa, desenvolvimento e produção. Mas por qual razão a China está se tornando um grande problema para esses fabricantes?
No ano passado, as vendas de veículos leves na China representaram 28% do total global e têm sido uma importante fonte de receita para a maioria das montadoras globais. Por exemplo, mais de um terço das vendas totais de veículos do grupo Volkswagen são oriundas do mercado chinês. No caso das alemãs BMW e Mercedes-Benz, a dependência chinesa é de mais de 33%, na Tesla de 34%, na Honda de 30%, na Toyota de 18% e na Nissan de 21%.
% das vendas da China em relação às vendas globais em 2023 | |
Toyota | 18,1% |
Volkswagen | 43,4% |
Hyundai | 6,1% |
Honda | 31,5% |
Ford | 5,1% |
Chevrolet | 5,3% |
Nissan | 21,6% |
Suzuki | 0,1% |
Kia | 2,6% |
Mercedes-Benz | 32,4% |
BMW | 36,1% |
Audi | 38,1% |
Tesla | 33,9% |
Renault | 0% |
Fiat | 0% |
Mazda | 6,9% |
Peugeot | 2,6% |
Jeep | 0,5% |
Subaru | 0,9% |
Skoda | 2,5% |
Lexus | 21,5% |
Daihatsu | 0% |
Mitsubishi | 2,3% |
Tata | 0% |
Citroën | 4,9% |
Buick | 73,9% |
GMC | 0% |
Mahindra | 0% |
RAM | 0% |
A China é também um importante centro de produção e exportação, não apenas de marcas nacionais, mas também de muitas fabricantes estrangeiras. A Tesla, por exemplo, exporta boa parte de seus modelos a partir da fábrica que mantém em Xangai. Por sua vez, a BMW utiliza suas fábricas chinesas para produzir os elétricos iX3 e Mini Cooper E para mercados globais. Outros, como a Volvo, estão ganhando terreno nos mercados de veículos elétricos graças ao EX30 de fabricação chinesa. Polestar, Dacia, Honda, smart, Citroën, Lotus, Lincoln e Cupra também exportam seus carros a partir da China.
Ao mesmo tempo, o país tornou-se um salva-vidas para muitas marcas. Em um cenário onde os mercados automotivos da Europa e da América do Norte já não crescem, a China passou a ser a única grande fonte de crescimento. Entre 2013 e 2023, o volume de registos na Europa aumentou somente 4%. Nos EUA e no Canadá, o montante manteve-se inalterado com 17,3 milhões de unidades. Enquanto isso, a China sozinha cresceu 25% no mesmo período.
2013 | 2023 | 2013 vs 2023 | |
China | 17.93 | 22.45 | +25% |
EUA e Canadá | 17.35 | 17.32 | 0% |
Europa | 12.31 | 12.79 | +4% |
* Volume em milhões de unidades
Dentro do cenário atual, a maré está virando para fabricantes estrangeiros na China. Imediatamente após a pandemia, houve uma mudança nos gostos e na procura dos consumidores que não está ajudando em nada a vida das marcas não-chinesas. Em 2019, as marcas locais registaram uma quota de mercado de 37% nas vendas totais. No ano pandêmico de 2020, a porcentagem oscilou para 36% e começou a subir rapidamente em 2021, quando atingiu 43%.
A mudança continuou em 2022 a um ritmo ainda mais rápido, acompanhando um cenário mais dinâmico da indústria local. Marcas como Geely, BYD, NIO, Xpeng, Li Auto, Chery e Changan aceleraram seus planos de produção como resultado da nova guerra de preços iniciada pela Tesla. Cada vez mais carros novos chegam aos showrooms a preços mais baixos. Nesse pegada, a concorrência mais acirrada forçou a maioria das marcas a investirem na otimização das especificações de deus veículos, apostando principalmente em tecnologias de baterias e software.
Tudo isso aconteceu em menos de três anos e pegou de surpresa as montadoras estrangeiras. Foi então que a mudança da compra de carros não-chineses para a compra de carros chineses se acelerou. Em 2022, os fabricantes locais capturaram 46% das vendas de automóveis de passageiros por lá. Um ano depois, no final de 2023, a BYD destronou a Volkswagen como marca mais vendida e as empresas chinesas alcançaram 50% de participação. Neste ano, a mudança está tomando um rumo ainda mais dramático: em agosto de 2024, a quota de mercado das marcas chinesas atingiu um novo recorde: 62%.
Esta mudança na percepção dos consumidores assusta os fabricantes de automóveis estrangeiros e deve-se, em parte, à falta de contato com os clientes e à capacidade dos fabricantes chineses de oferecer automóveis competitivos que atraiam os consumidores (incluindo os chineses, graças ao software que fala a sua língua).
O autor do artigo, Felipe Munoz, é especialista em indústria automotiva na JATO Dynamics.
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