A inepta gestão governamental no enfrentamento à pandemia de coronavírus no País, que caminha para muito em breve superar a trágica marca de 400 mil vidas perdidas (e contando), está aprofundando a crise econômica para um ponto de difícil recuperação, ameaçando seriamente as esperanças de crescimento, fazendo até parecer otimistas as projeções (antes consideradas conservadoras) sobre o mercado de veículos este ano.

Até o momento, tanto a Anfavea quanto a Fenabrave, associações que reúnem fabricantes e seus distribuidores franqueados, respectivamente, projetavam um crescimento de 15% sobre 2020, alcançando cerca de 2,37 milhões de unidades vendidas, ao somar automóveis, comerciais leves, ônibus e caminhões.

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Para chegar lá será necessário avançar mais rápido do que no ritmo atual – e neste momento isso parece improvável. O primeiro trimestre fechou com 528 mil emplacamentos, queda de 5,4% nas vendas em comparação com o mesmo período de 2020. Como efeito direto de medidas de restrição de circulação e abertura de estabelecimentos comerciais para conter o avanço da pandemia, a desaceleração continuou na primeira quinzena de abril.

Nos 10 primeiros dias úteis de março a média diária de emplacamentos de veículos leves foi de 8.097 e no mesmo período deste mês o número baixou 7,2%, para 7.515/dia. O total de automóveis e comerciais leves na primeira metade de abril foi de 75.154, contra 80.965 nos mesmo 15 dias de março.

Por enquanto, o resultado está dentro das expectativas conservadoras da Anfavea, mas preocupa porque sugere tendência de arrefecimento da confiança do consumidor diante do cenário crítico, combinado com recuo do poder aquisitivo para comprar carros cada vez mais caros – nos últimos 12 meses a alta média de preços dos automóveis mais vendidos passa dos 18%, segundo levantamento da Kelley Blue Book (KBB). Esses aumentos são potencializados pela elevação dos juros, que jogam para cima o custo dos financiamentos.

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A situação coloca um ponto de interrogação no horizonte da evolução do mercado: até quando o consumidor vai conseguir pagar por esses aumentos? Na verdade, a maioria já não consegue há tempos e o mercado vem sendo sustentado pela elite econômica do País que forma filas de espera para comprar veículos acima de R$ 100 mil e muito além isso. O problema é saber quanto fôlego tem essa pequena camada privilegiada da população brasileira para sustentar a indústria que precisa preencher sua enorme capacidade ociosa – as fábricas brasileiras poderiam produzir mais de 4,5 milhões de veículos/ano e hoje fazem pouco menos da metade.

Para piorar a situação, mesmo se a demanda crescer ou continuar como está, hoje a indústria não pode atendê-la, porque além alta generalizada de preços também há falta de insumos para produzir, como semicondutores eletrônicos, borracha, plásticos e aço, só para citar os principais. Por esse motivo algumas linhas de produção precisaram ser paralisadas ou reduzir o ritmo – o caso mais grave até agora é o da planta da GM em Gravataí (RS) que está parada desde o início de março e ficará assim até junho. O problema, muitos já admitem, tende a se arrastar até o fim do ano, comprometendo sensivelmente a recuperação do setor.

“ESTAGFLAÇÃO” É AMEAÇA

Após o momento de equivocada euforia com o crescimento de vendas no último trimestre de 2020, a leniência (e irresponsabilidade) de governos e pessoas em lidar com a Covid-19 cobra seu preço, para além das mortes, projetando uma vida pior para todos, com alta da inflação e baixa da economia, fenômeno conhecido como “estagflação”, a nefasta combinação de estagnação econômica com elevação de preços.

O Brasil é a única das dez maiores economias do mundo que no primeiro trimestre registra desaceleração econômica, de acordo com monitoramento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgado este mês. A média das expectativas de crescimento do PIB brasileiro este ano já era bem modesta, de 3,5% após o tombo de 4,1% em 2020, mas diante do cenário atual essa projeção já caiu para avanço de 3,04% em 2021 e 2,34% em 2022, conforme o Relatório Focus de 16 de abril, levantamento semanal do Banco Central com a média das expectativas de mercado sobre os principais indicadores econômicos.

Ao mesmo tempo, a inflação disparou. O IGP-M, que na maior parte de sua composição afere a variação de preços no atacado, fechou 2020 acima dos 24% e a expectativa é de 12% este ano. Em boa medida, o índice é alimentado pela desvalorização cambial mais acentuada do mundo, que torna mais caros bens importados ou cotados em dólar – caso do aço, por exemplo.

Por sua vez, a forte depreciação do real é provocada pela fuga de capitais e falta de confiança dos investidores estrangeiros no País e seu governo central, que julga ser possível combater uma doença pandêmica negando sua gravidade e dificultando as soluções para contê-la – no caso, distanciamento social e vacinas.

Não tardou para que a alta generalizada de preços fosse repassada ao consumidor. A inflação dos últimos 12 meses medida pelo IPCA é de 6,5%. Há exatamente um ano, o mesmo índice anualizado estava abaixo de 2%. O resultado direto é que a taxa básica de juro (Selic), único remédio disponível contra a inflação, voltou a subir após sete meses parada em 2% ao ano (o menor nível histórico), saltando para 2,75% este mês, com a média das expectativas do Relatório Focus apontando para 5,25% ao fim de 2021.

Enquanto a estagflação joga a inflação para cima e a economia para baixo, a pobreza aumenta e o índice de desemprego tende a seguir em elevação, fechou 2020 em 13,5%, o equivalente a 14,3 milhões de pessoas desempregadas, e tende a passar dos 15% em 2021. O País está parando de produzir e distribuir riqueza, isso afeta todos os setores econômicos e a indústria automotiva tem muito a perder com esse cenário.

O julgamento internacional, por meio de mais de um estudo, condena o Brasil ao posto de pior país do mundo na gestão da pandemia. Todo o resto tem sido consequência disso. 

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